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Foi com o título acima que a conservadora revista Paris Match cobriu a eleição do último presidente socialista da França. Era maio de 1982 e um país desesperado por mudanças radicais ansiava por virar a página e seguir em frente. Passados 31 anos do episódio em que Mitterrand enterrou o fantasma de Charles de Gaulle, acabamos de assistir nova eleição, na qual as questões essenciais parecem ter sido as mesmas: a Europa tem solução? É inelutável que a política seja refém da economia? Governos podem sacrificar conquistas sociais?

Foram essas as inquietações recorrentes da França profunda que ecoou das urnas. E o eleitorado preferiu as propostas imprecisas de François Hollande, um candidato inexperiente e desacreditado em seu próprio partido, mas ousado na mensagem de que "a austeridade não pode ser mais uma fatalidade na história europeia". Vítima do medo e da desesperança, a população francesa se vê abalada por incertezas, presa às regras de economia ortodoxa ditadas pela Alemanha, com cortes em direitos sociais, em nome da governança comunitária de salvação do euro. Se essa foi a pedra atada ao pescoço eleitoral de Sarkozy, caberá ao novo presidente indicar o outro caminho, rompendo com o eixo franco-alemão e com o modelo Merkel de enfrentar a crise. Não será fácil. Primeiro, pela falta de opções críveis de salvação econômica sem cortes drásticos em orçamento público, tudo que Hollande prometeu não fazer e nem exigir que vizinhos façam. Depois, pelo ambiente degradado das economias dos demais países da zona do euro, também esperançosos de soluções da nova França.

No plano interno, as eleições legislativas de junho já serão grande desafio para o projeto socialista, na perspectiva de não conseguir maioria na Assembleia Nacional. Se isso ocorrer, não é improvável que haja um primeiro-ministro de oposição a Hollande. Outra fórmula confusa de tomada de decisões, em que nem se governa e nem se deixa governar.

Para a União Europeia que aguarda a França definir-se, serão semanas de mais aflição e incerteza, a gerar paralisia dos governos nacionais e das autoridades comunitárias, com o calendário a indicar para 2013 eleições majoritárias na Alemanha. Será então Angela Merkel e seu governo conservador que estarão em cheque.

No que concerne ao Brasil há perspectivas promissoras de que a identidade ideológica com o governo Hollande fortaleça o relacionamento bilateral. No entanto, é urgente avisar ao Quai d’Orsay que Lula não é mais presidente e que o negócio dos aviões Mirage foi para o espaço. Quanto ao acordo de livre comércio entre União Europeia e Mercosul, que se arrasta na incompreensão mútua e na falta de vontade política dos atores envolvidos, não é de se esperar grandes mudanças. A França continuará guardiã intransigente da política agrícola comunitária, que é ilegal e imoral, mas que impede que commodities da América do Sul inundem o mercado europeu.

Remanesce a mais grave das consequências do quadro, no crescimento acentuado dos partidos de extrema direita, sempre inimigos da integração europeia, em seus nacionalismos fanáticos e sectarismo racial. A ironia da história é que foi a africana pobre e imigrante Nafissatou Diallo que, sem nunca ter pisado em território francês, acabou peça chave da vitória de François Hollande, com o escândalo do Hotel Sofittel. O que estaria acontecendo se o presidente da França fosse hoje Dominique Strauss Khan, mix de socialista com ex-patrão do Fundo Monetário Internacional? Coisas de nosso confuso tempo.

Jorge Fontoura, doutor em Direito Internacio­nal, é professor titular do Instituto Rio Branco e membro do Tribunal Permanente do Mercosul.

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