Em 28 de agosto de 1979, o general-presidente João Batista Figueiredo assinou a Lei da Anistia. Uma frase famosa de Figueiredo ("prendo e arrebento quem for contra a abertura") define com precisão o caráter da lei.
O resultado imediato da Lei de Anistia o retorno ao Brasil de uma centena de exilados foi saudado como um fato extremamente positivo. É necessário, porém, desfazer alguns mitos sobre a Lei da Anistia, as circunstâncias que cercaram sua promulgação e suas consequências. Mitos alimentados até hoje e nem sempre com as melhores intenções.
O primeiro ponto é que a anistia de 1979 não foi "ampla, geral e irrestrita". Longe disso. Ficaram de fora do benefício os militantes envolvidos em crimes de morte e "atentados terroristas", entre outros. Além disso, muitos obtiveram sua liberdade apenas depois de cumprir as penas impostas pelos generais. No total, a lei atingiu pouco mais de 100 militantes.
Em segundo lugar, é lamentável que ainda hoje exista a tese de que a Lei da Anistia foi fruto de um "amplo consenso entre o regime e a oposição". Como amplo consenso? Vivíamos sob uma ditadura, não havia direito de manifestação, expressão e organização, e os instrumentos repressivos vigoravam plenamente. A Lei da Anistia foi uma imposição do regime militar. No entanto, ela não teria existido se o movimento popular pela anistia não tivesse ocupado as ruas, juntamente com o movimento estudantil e as greves operárias. Não havia "consenso", havia enfrentamento. A anistia ampla, geral e irrestrita era incompatível com o regime militar.
A Lei da Anistia atravessou incólume esses 35 anos. Sobreviveu à ditadura militar e à Constituinte de 1988, e foi declarada imutável, há alguns anos, em lamentável decisão do Supremo Tribunal Federal. Permanece como sobrevivência nefasta da ditadura, na companhia de regras intocadas do "pacote de abril" de 1977, da militarização das polícias e outros institutos. A resistência a qualquer alteração na Lei da Anistia expressa a recusa ao alargamento dos limites tão estreitos da nossa democracia.
A vigência da Lei da Anistia de 1979 significou, na prática, relegar ao olvido todas as violações dos direitos humanos ocorridas desde 1964. Porém, o tratamento é completamente diferente para militantes de esquerda e para os agentes da repressão estatal. Os militantes que se opuseram ao regime militar (e não apenas os que se envolveram na luta armada) pagaram caro por suas convicções. Foram presos, afastados de seus empregos, torturados, exilados, mortos. Ou simplesmente desapareceram. A anistia, para a maioria, chegou tarde.
Para os agentes da repressão estatal que torturaram, mataram ou fizeram desaparecer esses militantes, nunca houve julgamento. Seus crimes ficaram até hoje impunes, embora, de acordo com todas as leis internacionais, sejam considerados hediondos e imprescritíveis. Isso traz ao Brasil descrédito internacional, evidenciado pela sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos condenando nosso país pela não punição desses crimes. O Estado e seus agentes autoanistiaram-se, o que é inconcebível.
Trinta e cinco anos e muitos avanços depois, não dá mais para conviver com essa herança da ditadura militar. Seus crimes devem ser julgados, e os responsáveis, condenados.
Roberto Elias Salomão é coordenador do Fórum Paranaense de Resgate da Verdade, Memória e Justiça.
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