Paulo Guedes, ministro da Economia, participa de entrevista coletiva.| Foto: Carolina Antunes/PR
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Em regra, o adolescente, desde que minimamente informado sobre alguns temas, comporta-se como um especialista sobre os poucos temas a respeito dos quais se considera conhecedor e como um ser dotado de bom senso acima da média sobre todos os outros temas.

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A atual conjuntura sinaliza que o governo federal cultiva um “liberalismo adolescente”: recentemente adotado por alguns, incompreendido e, ao mesmo tempo, percebido como solução decisiva para o país por muitos. Mesmo diante de uma nova conjuntura em que se mostre temporariamente limitante, ele se impregnou com tanto vigor no governo federal que inviabiliza a formação de uma agenda econômica anticíclica no curto prazo. É como se o adolescente não aceitasse críticas ao único e preferido livro lido e relido nos últimos anos, mas que agora talvez tenha de ser deixado de lado por alguns meses.

O governo federal, em respeito aos votos recebidos nas últimas eleições, desenvolveu uma agenda de consenso nos últimos mais de 12 meses: sustentabilidade fiscal, desestatizações, previdência, aprimoramento ao ambiente de negócios, segurança jurídica (formal, mas não comportamental), desburocratização e apoio às PPPs e concessões subnacionais. Com exceção do último item, a agenda não é nova, arrasta-se com idas e vindas desde os anos 90; a diferença é que as eleições a consagraram.

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Entretanto, o cenário mudou e parece que tamanha é a convicção com a agenda no longo prazo que não se observa o curto prazo com atenção. A agenda econômica emergencial não está formada e não é pública. Quando se torna pública, sustenta-se por 24 horas, como ocorreu com alguns aspectos da recente Medida Provisória 927, sobre medidas trabalhistas temporárias.

Esse desequilíbrio na agenda de curto prazo do governo federal, tecnicamente forte na saúde e inexistente na economia, produz desarmonia e insegurança social, econômica e política, pois o papel que cabe ao Ministério da Economia não é aparente, no mínimo, e, ademais, titubeante. Tal cenário sobrecarrega a agenda sanitária, como se, sozinha, fosse responsável por resolver todos os desafios e conflitos dos próximos anos.

O nó em que nos encontramos demanda que a agenda econômica de curto prazo amadureça já, com radical coerência, coesão, transparência e racionalidade. É preciso apresentar ao país uma rota que possa ser compreendida para os que têm alguma condição ou necessidade de já refletir, mesmo diante de tanta insegurança, sobre como serão os próximos três semestres. O silêncio e a ausência de liderança pública do Ministério da Economia tendem a gerar mais danos do que um eventual debate público de baixa qualidade, que nem mesmo está instaurado, ao menos no campo econômico.

O governo federal deve tornar-se adulto no curto prazo. Para facilitar a compressão, o adolescente deve sensibilizar-se sobre uma prova muito difícil agendada para daqui a poucas semanas, deve dedicar-se como nunca a ler mais alguns livros, não o mesmo de sempre, para que, talvez, passe na prova.

O falso debate público, unidimensional, sobre medidas sanitárias é apenas o espelho mais óbvio do nosso liberalismo adolescente, que ainda não aceitou que precisa transcender os conhecimentos superficiais e recentemente adotados.

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Bruno Ramos Pereira é sócio da Radar PPP.