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Está para ser julgado pela Suprema Corte dos Estados Unidos o caso de um confeiteiro processado por um casal gay por se recusar a confeccionar o bolo de casamento dos mesmos, com base em convicções religiosas contrárias ao casamento entre pessoas do mesmo sexo. No Colorado, estado onde aconteceu o fato, é proibida por lei a discriminação por orientação sexual. Desta forma, venceu nas instâncias inferiores da Justiça a alegação de discriminação impetrada pelo casal.

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O caso pode parecer trivial, mas ganhou importância porque levanta o debate sobre o desencontro entre os princípios constitucionais da liberdade de crença e de expressão, por um lado, e da não discriminação, por outro lado. O caso é um de vários parecidos ocorridos em diversos estados norte-americanos – de empresas sendo processadas por se recusarem a prestar serviços a casais do mesmo sexo por motivos religiosos – e a decisão da Suprema Corte poderá ser decisiva em determinar até onde vai o direito de liberdade de expressão e crença sem que se incorra em discriminação por orientação sexual.

As pessoas LGBTI e de outras minorias não querem e nem devem viver marginalizadas

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Um dos argumentos apresentados pela defesa do confeiteiro é o de que o casal poderia ter encomendado a confecção do bolo em outra confeitaria. Os advogados do casal veem neste argumento um paralelo com a segregação racial que existia nos Estados Unidos até os anos 1960/1970, antes de se tornar ilegal, na qual as pessoas negras tiveram de utilizar serviços específicos para elas, separadas das pessoas que não eram negras. Surge neste contra-argumento a visão de que a liberdade irrestrita de crença e expressão pode criar desigualdades e divisões discriminatórias e nocivas entre diferentes setores da sociedade, a partir da não aceitação por alguns de determinados aspectos da diversidade inerente nela.

No Brasil, já há decisões do Supremo Tribunal Federal de que o direito individual de liberdade de expressão não pode ser utilizado como salvaguarda para conduta ilícita que fira a dignidade humana alheia. No caso em tela, do bolo de casamento, pelo princípio constitucional da não discriminação, a prestação de serviços não pode envolver a criação de distinções entre seus usuários ou clientes em potencial, com a recusa de atender aqueles/as que estejam em desacordo com as convicções pessoais de quem presta o serviço.

O outro lado: A luta de um confeiteiro pela liberdade interessa a todos (artigo de Andreas Thonhauser) 

Mas a lição subjacente a este debate vai além do mero comércio. É hora de fazer valer o justo meio entre a não discriminação e a liberdade de expressão e crença. Majoritariamente, as pessoas LGBTI e de outras minorias não querem e nem devem viver marginalizadas no gueto que a intolerância de setores fundamentalistas e ultraconservadores propõe. Devem exercer o direito de viver de forma integrada na sociedade, compartilhando em igualdade os bens nela existentes, com base no respeito mútuo.

Toni Reis, doutor em Educação, é presidente da Aliança Nacional LGBTI e diretor-executivo do Grupo Dignidade.