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O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, no último dia 12 de maio, que servidores públicos que sejam pais solos, sem a presença da mãe, têm direito a licença-paternidade de 180 dias. O plenário da Corte Superior seguiu o entendimento do relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, para quem a licença é um direito da criança de ter a presença de um dos pais na primeira etapa de vida. A decisão tem repercussão geral, ou seja, servirá para embasar as demais instâncias do Judiciário em casos semelhantes.
O caso analisado foi o de um perito médico, pai de crianças gêmeas geradas por meio de fertilização in vitro e barriga de aluguel, que obteve na Justiça o direito à licença de 180 dias por ser pai sozinho. O juiz da primeira instância afirmou que, apesar de não haver previsão legal nesse sentido, o caso é semelhante ao de uma situação em que houve a morte da mãe, uma vez que as crianças serão cuidadas exclusivamente pelo pai. Por isso, concedeu a licença estendida. A decisão foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), mas o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) recorreu ao STF, argumentando que a concessão do benefício é destinada à mulher gestante e que o pagamento sem a correspondente fonte de custeio viola a Constituição e traz prejuízo ao erário.
A decisão do STF evidencia o sentido das licenças relacionadas à paternidade ou maternidade. Quando existe, dentro do sistema previdenciário a proteção social relacionada à paternidade ou à maternidade, esse tipo de licenciamento não deve ser voltado nem para o pai e nem para a mãe, mas sim para a criança. É necessário que haja a previsão de um licenciamento por paternidade ou maternidade porque a criança é um sujeito de direito tutelado de maneira especial dentro da Constituição Federal, ancorada no princípio da proteção integral das crianças e dos adolescentes, prevista no artigo 227. No texto, está a garantia de que o Estado, a sociedade e a família são responsáveis pela proteção integral desses sujeitos, crianças e adolescentes.
Então, quando o Supremo reconhece esse direito para o pai – nesse caso especifico para um pai que utilizou da fertilização in vitro e barriga de aluguel para ter um filho – está atendendo a um pai que tem necessidade de afastamento de suas atividades laborais para cuidar do filho em seus primeiros momentos de vida, e ao mesmo tempo precisa manter sua remuneração, justamente para poder prover as necessidades da criança.
Importante destacar que nesse caso o Supremo agiu de uma maneira protetiva e necessária. Na decisão, o STF utilizou o tempo aplicável às mulheres no caso de licença-maternidade de uma forma análoga para a concessão de uma licença-paternidade. Assim, em vez de ter duração de uma licença-paternidade comum, o STF concedeu uma licença de 180 dias, que é o prazo reconhecido as mulheres no caso de licença-maternidade. E esse não é a primeira vez em que o STF também fez uma análise desse tipo de licenciamento, de forma extensiva, ainda que não prevista na legislação, como é o caso de concessão de licença-maternidade para casais formados por pessoas do mesmo gênero.
Acredito que nesses casos o Supremo tem atuado em consonância com o texto da Constituição Federal. Mas ainda é necessário que a legislação já traga essa previsão de uma forma simplificada justamente para evitar que esse tipo de ajuizamento seja necessário, que seja preciso aguardar o pronunciamento do Supremo sobre um assunto que é de interesse maior da sociedade, de interesse maior desses sujeitos de direito que gozam de proteção especial, que são as crianças e os adolescentes.
Leandro Madureira é advogado, especialista em Direito Previdenciário e especialista em Políticas Públicas, Infância, Juventude e Diversidade pela UNB. É sócio do escritório Mauro Menezes & Advogados.