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Lições do plágio no Enem

 | Jonathan Campos/Gazeta do Povo
(Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo)

O recente episódio de plágio no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) evidencia pelo menos dois grandes problemas da educação básica brasileira. O primeiro é que não preparamos nossos jovens para a escrita original, criativa, que compile ideias inéditas. O segundo é que não temos tecnologia suficiente para mapear a falta de originalidade da escrita na principal avaliação do ensino médio brasileiro da atualidade.

O caso de plágio no Enem aconteceu em Salvador (BA). Como amplamente divulgado pela imprensa, um aluno teria copiado a sinopse inteira de um livro na redação, que aparece no segundo dia de provas. O tema sobre o qual os alunos tinham de dissertar era educação para surdos – assunto difícil, como de costume no Enem, e que exige soluções criativas e muita reflexão para inclusão na educação daqueles que, hoje, ainda ficam de fora.

O plágio no exame nacional é a ponta de um iceberg maior e mais profundo do que sequer imaginamos. Nossos alunos não são treinados para a escrita original, para desenvolver ideias criativas, para pensar em soluções e para concatenar as propostas em frases e parágrafos que façam sentido e que convençam o leitor. Sem essa habilidade, considerada essencial para o século 21 pela maioria dos especialistas, muitos acabam se valendo da cópia de trechos ou de textos inteiros – como aconteceu, ilicitamente, em Salvador.

Nossos alunos não são treinados para a escrita original, para desenvolver ideias criativas, para concatenar as propostas em frases e parágrafos que façam sentido

Por sorte, um dos corretores da prova plagiada tinha lido recentemente a obra copiada e provavelmente se recordava de trechos. Deve ter consultado a internet e chegou ao veredito: era uma cópia. É assim que a maioria dos professores no país ainda identifica trechos de plágio nos trabalhos dos alunos. Esforçam-se, muitas vezes inutilmente, para tentar trazer da memória trechos que possam ter sido copiados; buscam na internet partes do texto que estão exageradamente bem escritas, que destoam do restante do material ou que parecem ter sido traduzidas. Nesse esforço exaustivo, algumas vezes encontram a cópia, outras não.

Se o corretor não tivesse conhecimento da obra em questão, e sem tecnologia que ajude a identificar o plágio na correção do Enem, o aluno de Salvador teria passado com boa nota? O governo já usa tecnologia na correção das questões da prova – é a chamada TRI, que identifica o padrão do aluno e dá menos pontos para questões que foram “chutadas”, por exemplo. Assim, a nota no Enem nunca é proporcional ao número de acertos – e pode passar de mil pontos.

O fato é que já existem tecnologias suficientemente consolidadas que poderiam auxiliar os professores e melhorar a chamada escrita original dos alunos ao longo do processo educativo. São os chamados softwares antiplágio, utilizados pelas principais universidades e escolas de ensino médio, no Brasil e do mundo. Os mais completos permitem que os alunos, de escola ou de universidade, submetam seus trabalhos na plataforma e recebam um relatório de similaridade, antes mesmo de entregá-los ao professor. Assim, o aluno treina a escrita, o encadeamento de ideias, além de refletir sobre problemas e soluções. Trata-se de um estudante que, ao chegar a um exame como do Enem, não precisa ilicitamente copiar um trecho de um livro, pois ele próprio poderá ser um futuro autor de um livro que traga uma ideia original.

O Enem acerta ao exigir que alunos escrevam na prova (o restante do exame é composto por questões que se distribuem em quatro áreas do conhecimento, como linguagens e ciências da natureza). Universidades e programas como o Fies, de financiamento estudantil, também vão na direção correta ao exigirem uma nota mínima na redação. Agora, as escolas precisam se mobilizar mais intensamente para trabalhar a escrita original dos alunos – e, de outro lado, o governo também precisa garantir que os alunos com escrita original de verdade recebam as maiores notas na redação.

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