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O Projeto de Lei 6.826 de 2010, que tramita na Câmara dos Deputados, é uma iniciativa que criará mecanismos para combater a corrupção das pessoas jurídicas, penali­­zan­­do-as com sanções civis e administrativas

As recentes manifestações e atos contra a corrupção em várias capitais brasileiras fazem lembrar o quão atuais são as palavras de Sérgio Buarque de Holanda no seu clássico Raízes do Brasil. Explica-nos o historiador que dentre as chaves para a compreensão do Brasil estão o patrimonialismo (a confusão entre público e privado que norteia a atuação de nossos representantes) e a nossa famosa cordialidade (uma ética emotiva que exige que sejamos íntimos no trato social, nos negócios ou no trabalho para termos sucesso, ao invés de apresentarmos o melhor trabalho, preço ou produto). Em suma, são as duas matrizes que definem aquilo que chamamos de jeitinho brasileiro.

Muito maior que o famoso "custo Brasil", referente aos altos encargos sociais e trabalhistas arcados pelas nossas empresas, quer parecer que o preço desse traço da nossa sociedade faz com que investimentos sejam dificultados, o desenvolvimento retardado e a livre iniciativa distorcida para favorecer grupos atrelados de maneira direta ou indireta ao Estado.

Evidentemente que as conquistas legislativas para combater tal estado de coisas sempre sofreram com as dificuldades inerentes ao fato de que as leis, normalmente, são elaboradas pelos mesmos grupos que se beneficiam da sua inexistência. Não obstante, tem-se constatado avanços tanto em nossa legislação quanto em nossa postura política internacional sobre o tema. É o que se vê com a Lei de Licitações, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a própria responsabilização criminal das pessoas físicas envolvidas em atos de corrupção. E ainda, pela ratificação pelo Brasil da Convenção Anticorrupção da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em 1997, e da Convenção da ONU contra a corrupção em 2003.

Nessa linha, seja por uma efetiva vontade de combater a corrupção, seja pela pressão dos organismos internacionais para que o Brasil efetive os tratados que ratificou, desponta em nossa pauta legislativa o Projeto de Lei 6.826 de 2010 que tramita na Câmara dos Deputados. Trata-se de iniciativa que criará mecanismos para combater a corrupção das pessoas jurídicas, penalizando-as com sanções civis e administrativas que recairão não mais somente sobre as pessoas, mas sobre as empresas e corporações flagradas praticando tais tipos de atos.

Entre as práticas que serão combatidas pela futura lei, verifica-se no artigo 6.º do projeto a promessa direta ou indireta a agente público ou pessoa a ele relacionada (inciso I), o ajuste a e combinação que frustre o caráter competitivo da licitação (inciso II), o afastamento de licitante através de oferecimento de vantagem (inciso IV), entre outras condutas ativas ou omissivas relacionadas à corrupção.

Dentre as penas, como se depreende do artigo 7.º do projeto, tem-se multa no valor de até 30% do faturamento bruto da pessoa jurídica (inciso I), reparação integral do dano causado (inciso III), proibição de contratar, receber incentivos e subsídios (inciso V), revogação de delegação, autorização ou permissão da administração pública, dentre outras sanções.

Poderia alguém criticar que tal tipo de iniciativa legislativa estaria longe de se constituir no elixir mágico que mudaria todo o cenário denunciado há quase oito décadas por Sergio Buarque de Holanda. Inclusive, poderia citar o fato de que as leis similares de outros países, como o Foreign Corrupt Practices Act norte-americano e o recentíssimo Anti-bribery Act do Reino Unido, não extirparam por lá esse mal.

Não obstante, é de se convir que a consolidação do Brasil como uma potência emergente não pode se atrelar única e exclusivamente à luta contra a pobreza; deve também abrir espaço para que a riqueza possa ser construída e usufruída por todos e por qualquer um. E esse usufruto clama por armas para derrotar o "jeitinho".

Francisco do Rêgo Monteiro Rocha Júnior, mestre e doutorando em Direito pela UFPR, é coordenador da pós-graduação em Direito e Processo Penal da ABDConst, professor da Unibrasil e advogado criminalista.

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