É notório o mal-estar reinante entre professores de todos os níveis e nas mais diferentes instituições de ensino. Consultórios de psicólogos, psiquiatras, homeopatas, acupunturistas e benzedeiras estão repletos de professores desejando curar a tristeza. Palidamente, no âmbito restrito das universidades, alguns teóricos da pedagogia crítica começam a encarar esse problema de frente através do desenvolvimento de pesquisas que visam compreender a fragmentação da identidade do professor. Sem dúvida, trata-se de uma questão vital. Ou compreendemos quem somos como profissionais e redimensionamos nossos posicionamentos ou estaremos fadados à depressão. E esta não é uma questão individual, mas de categoria.

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Dias atrás, um professor universitário me contava, cheio de constrangimento, que vinha freqüentando um consultório psiquiátrico. Confessava ele não agüentar mais entrar em uma sala de aula. Há meses não conseguia dormir, irritava-se com facilidade, havia perdido o apetite e a libido, não se interessava mais por livros e só não abandonava o magistério porque não sabia fazer outra coisa. A causa do abatimento, segundo ele, era o medo de não dar boas aulas, de não agradar aos alunos, de não ser reconhecido pelos colegas e, conseqüentemente, de perder o emprego. Para infelicidade de todos, o drama vivido por esse professor não é caso isolado.

Em conversa recente com uma amiga, fiquei sabendo que praticamente todos os professores de uma grande rede de ensino particular de nosso estado faziam uso de antidepressivos e ansiolíticos. É óbvio que ficar deprimido e procurar tratamento não é demérito. O que não pode ser silenciado é a causa de sofrimento apontada pelos professores. Em uníssono, afirmam que o problema são as desumanas condições de trabalho. Ora, condições de trabalho desfavoráveis não são problemas clínicos e muito menos podem ser resolvidas individualmente. Além disso, elas implicam um grave problema social que transcende, e muito, os limites das salas de aula. Trata-se da falência de nosso sistema educacional, amplamente alardeada pelos meios de comunicação e atestada pelas diferentes pesquisas de desempenho de aprendizagem. De fato, não se pode atingir a excelência educativa quando os principais agentes dessa esfera de atividade estão doentes. Nesse sentido, a promessa de que a educação pode alavancar o desenvolvimento social torna-se um grande engodo.

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É extremamente grave o silêncio que se faz em torno desse tema, principalmente entre os próprios professores. Ocorre que o professor, profissional que deve se demonstrar competente, sente receio de se revelar fraco frente aos colegas e donos de escolas. Contaminados pelos discursos da auto-ajuda e da motivação profissional, todos os professores devem parecer bem dispostos, saudáveis e animados em todos os momentos do coletivo escolar. Apenas no isolamento dos consultórios ou na descontração de uma conversa com um amigo, resguardados pela certeza da inviolabilidade do segredo, é que ousam derramar as lágrimas da frustração profissional.

Se a educação é efetivamente prioridade política e social, essa é uma das questões mais urgentes. Trata-se de uma questão de saúde pública, de sanidade social, a qual, repito, não pode ser resolvida através do ativismo individual e nem tão pouco pela medicação clínica. Mais do que lamentar seus medos e dificuldades individuais e procurar profissionais da saúde, os professores deveriam se mobilizar em seus coletivos, trazer esse tema para o debate sindical, se articular politicamente e, através de pesquisas e reflexões profundas, rever seus lugares de sujeitos históricos, suas identidades, suas imagens quebradas. Mais do que aumentar ganhos salariais, trata-se do desenvolvimento de estratégias capazes de restaurar a saúde nas escolas.

Sebastião Donizete Santarosa, mestre em Lingüística, é professor do ensino básico.