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Saber cozinhar não é o mesmo que gostar de cozinhar. Saber fazer contas não é o mesmo que gostar de fazer contas. E saber ler não é o mesmo que gostar de ler. Entre saberes e gostos existem linhas tênues que disfarçam grandes abismos. Assim o é, também, no universo da literatura infantil. Especialmente no território dos livros para os pequenos, ou no campo da alfabetização e letramento.

Você já notou que crianças costumam ter uma grande curiosidade pelo mundo das letras quando em fase de alfabetização? “O que é que está escrito na capa do gibi? O que é que está escrito aqui? O que é que está escrito bem alto lá no céu? Como é que se escreve ‘carrossel’?” Mas, se este fascínio existe tão fortemente na infância, o que explica, além das questões sociais, que 44% da população brasileira não lê e 30% nunca comprou um livro? Estas são informações da pesquisa Retratos da Leitura, mas existem outros dados que também chamam a atenção. De acordo com o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, 49% dos estudantes brasileiros na faixa dos 15 anos apresentam baixo desempenho em leitura. E, segundo a Prova ABC, apenas 44,5% das crianças que concluíram o 3.º ano do ensino fundamental apresentam uma aprendizagem adequada em leitura.

Como estimular que as crianças possam criar, mais que um gosto pelas histórias, um gosto pelos livros?

Por isso, é preciso mais que pensar em livros que sejam atrativos somente por serem brinquedos para formar um público leitor infantil. É preciso produzir literatura numa linguagem que alcance o pequeno leitor em seu momento de aprendizagem e se conecte com ele. Uma literatura que o comova. Um livro que ele leia. Num primeiro momento, isso pode acontecer pelas imagens, mas, na medida em que a criança inicia o processo de letramento, é importante que ela encontre as condições para realizar a leitura. O que envolve recursos como quantidade de texto, tipo de letra e palavras utilizadas. E uma história que respeite a maturidade da idade, com assuntos que sejam de seu interesse.

Tudo isso porque a educação e sua qualidade estão ligadas diretamente à leitura. Muito do não entendimento de História, Matemática e tantas outras disciplinas é decorrente de problemas de interpretação de texto. Outro benefício da leitura é a aquisição de vocabulário. Conhecer palavras é fundamental para dar nome às coisas, inclusive às emoções. Não se chama o olho de nariz e nem alegria de tristeza. Nomear faz parte do saber.

E como estimular, então, que as crianças possam criar, mais que um gosto pelas histórias, um gosto pelos livros? E, mais que um gosto pelos livros, um gosto pela leitura? Os incentivos passam desde a escolha de um livro adequado até a disposição dos livros em casa. É fundamental escolher livros considerando a faixa etária, a etapa de aprendizagem da leitura e um tema que seja do gosto da criança. Criar locais mais atrativos, como baús de tesouro, para guardar os livros. Uma estante muito ordeira pode transmitir a ideia de que ali não se deve mexer, por exemplo. Deixar os livros numa altura em que a criança possa pegá-los sozinha, além de proporcionar e permitir uma interação mais livre e criativa com o livro e com a história. É possível brincar de teatro, desenhar e escrever diferentes finais ou trechos que não aparecem na história, criar músicas e o que mais quiserem inventar. Afinal, parafraseando Eno Teodoro Wanke, “um livro até pode ser nosso sem nos pertencer, mas somente um livro lido nos pertence realmente”.

Cristiane Souza é jornalista, palestrante e autora de livros infantis.
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