Nelson Mandela foi um dos políticos mais importantes do último século. Sua trajetória de vida fez dele um marco da luta pela igualdade de direitos. Muitas das autoridades mundiais que agora se juntam ao povo sul-africano em homenagens e reverências até ontem se opunham aos valores que o líder negro proclamava. Foram vencidos pelo óbvio: os ventos sociais das últimas décadas do século passado e que sopram ainda mais fortes no século 21 não só apagam os rancores da história, como exprimem os desejos de uma humanidade igualitária, livre e pacífica. Isso inclui uma recusa dos regimes ditatoriais e segregacionistas, que devem ser banidos da história humana. Eis o que Mandela simboliza. Ele é o símbolo moderno da luta pelos direitos humanos aqueles mesmos que, proclamados em 1948, ainda não foram vividos com intensidade suficiente.
Mandela se tornou, aos poucos, um símbolo do mundo que todos queremos. Sua grandeza está na capacidade de comprovar que, na prática, a ética e a política não podem e não devem estar separadas. Na sua luta contra o Apartheid, ele encarnou os valores mais significativos de nossos tempos e promoveu a ética na política como poucos foram capazes. Mas não o fez apenas pela via de discursos, manifestos ou tratados oficiais. Mandela preferiu a proximidade com sua gente, o trabalho constante, a prática cotidiana. Falou com os poderes e caminhou com o povo. Sua luta, por isso, simboliza e resume os grandes ideais da humanidade: a igualdade, a liberdade e a justiça.
Contornando os ressentimentos de um povo ferido, ele simbolizou o perdão sem o qual nenhuma nação moderna pode existir em paz. Denunciando os horrores das reservas territoriais e dos redutos marginais para os negros, ele testemunhou a urgência de uma cultura da alteridade, que inclui não apenas a pobre ideia de tolerância, mas a exuberante noção da fraternidade, que exige a abertura para o diferente e a anulação do racismo e de todas as formas de discriminação.
Sua luta incansável pela libertação do povo negro ecoou nos quatro cantos do mundo porque a sua causa era, é e será sempre universal; porque está amparada na certeza de que cada ser humano merece ser tratado com dignidade e respeito. Se a ética pretende orientar as ações humanas em vista do bem comum, Mandela encarnou esse ideal como ninguém. Os 27 anos que permaneceu preso comprovam a radicalidade dessa convicção.
Como poucos homens, Mandela deixa um legado para toda a humanidade. Sua morte é o momento do reencontro, de renovação de alianças e de novas inspirações. Oxalá os políticos que visitam a África do Sul para o funeral do herói negro implementem medidas concretas pela garantia, proteção e promoção dos direitos humanos em suas nações. Ou isso, ou tudo não passará de uma vazia e perigosa cena midiática. Ou isso, ou Mandela estará de fato morto para sempre. E, com ele, também o seu testemunho.
Jelson Oliveira é professor do programa de pós-graduação em Filosofia da PUCPR.
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