A Câmara dos Deputados aprovou recentemente o Projeto de Lei 5.829/19, conhecido como o Marco Legal da Geração Distribuída Solar, que segue agora para votação no Senado. O texto traz mudanças legislativas que visam regulamentar o setor para além das resoluções administrativas promulgadas até agora pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
É uma importante movimentação do Legislativo brasileiro, entendendo que, desde 2012, os consumidores que desejam se beneficiar de geração própria de energia vinham se apoiando na Resolução Normativa Aneel 482/2012, que trouxe importantes definições e procedimentos a serem adotados pelas distribuidoras de energia a fim de viabilizar a chamada geração distribuída. Mas essa “regulamentação” ainda carregava inseguranças jurídicas e lacunas em alguns pontos, que justificavam e justificam ainda o pleito do setor por um Marco Legal.
Como alguém que atua no segmento, entendo que o ponto mais importante desse PL é que, como Marco Legal, garantirá maior segurança jurídica para o setor. Embora até o momento se opere no Brasil com base em uma resolução normativa da Aneel, que estabeleceu importantes parâmetros a serem seguidos, a mesma não tem poder de uma lei e, portanto, está suscetível a alterações a qualquer momento sem obrigatoriedade de se seguir o processo legislativo.
Entendo que o ponto mais importante desse PL é que, como Marco Legal, garantirá maior segurança jurídica para o setor.
Apesar da pressão das distribuidoras de energia elétrica sobre o tema e o fato de o debate estar extremamente polarizado (especialmente no que diz respeito ao sistema de compensações e taxação), o texto aprovado sugere uma transição positiva, que não trará grandes rupturas ao setor. Na prática, os consumidores que já têm um sistema fotovoltaico homologado não serão prejudicados e terão os benefícios atuais garantidos até 2045, incluindo novos sistemas que forem aprovados e implementados nos próximos 12 meses, com graduais mudanças nos benefícios após isso. No que tange às bandeiras tarifárias, o PL estabelece que as mesmas incidem somente no consumo ativo faturado e não mais sobre o excedente de energia compensado pela unidade consumidora. É um critério mais justo para o consumidor.
De uma forma geral, o Marco Legal da Geração Distribuída atende vários pedidos das distribuidoras, das empresas atuantes no setor e dos próprios usuários, de forma que tende a ser positivo, tirando grandes entraves do setor. O projeto de lei também inclui a geração distribuída como projeto para fins de infraestrutura – no enquadramento de regras tributárias – e, com isso, é possível emitir debêntures incentivadas como forma de financiar projetos de geração solar, facilitando o funding dos projetos.
A Aneel também assumiu o compromisso de estudar e divulgar os benefícios sistêmicos, um ponto importante do debate com as distribuidoras – entendendo que os benefícios líquidos são maiores para a população geral e não só para os indivíduos com sistemas de geração própria instalados. Segundo a nova regra, isso será abatido dos custos a serem pagos pelos microgeradores, e pode ser uma porta de entrada para um critério justo – basta saber se isto será de fato cumprido e apresentado pela Aneel.
Apesar das mudanças positivas, acredito que perdemos algumas oportunidades em emendas, como a que tratava sobre a destinação de recursos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) para financiamento de famílias de baixa renda ou dava regras diferentes para famílias cuja conta de energia comprometer porcentual acima de 10% do orçamento familiar. Essa possibilidade trataria das pessoas com dor social em um ponto de equidade, oferecendo um tratamento diferenciado para quem precisa. Deveria ter prosperado, mas foi rejeitado.
No geral, entendo (e ressalto) que a geração solar é boa tanto para o bolso da população como para o meio ambiente, o que por si só é motivo para que a mesma seja incentivada, e não freada – ainda mais em um momento sensível da energia elétrica tradicional como o que vivemos agora, com o custo da energia atingindo patamares nunca antes alcançados.
No todo, o balanço é positivo frente à expectativa de uma ruptura grande para o setor, que não veio com a lei. A partir de agora, é construir e solidificar esse “meio termo” benéfico para os dois lados, e ver como o setor vai se adaptar e se ajustar.
O movimento para um equilíbrio foi e está sendo feito. Cabe aos consumidores, distribuidoras e atores do setor aproveitar o momento e entender que a energia solar é um investimento relevante, mas que traz consigo diversos benefícios para o meio ambiente e a tão sonhada independência energética acessível a todos os setores e consumidores.
Rodrigo Freire é cofundador e CEO da energytech Holu.