O mundo dos games tem prestado atenção nas movimentações recentes do Senado Federal. Isso porque o Projeto de Lei 2796/21, conhecido popularmente como Marco Legal dos Games, está sendo debatido na Casa nas últimas semanas – mas o que você precisa saber sobre isso?
O PL 2796 foi proposto em agosto de 2021 pelo deputado federal Kim Kataguiri (União - SP), que é fã declarado dos games. Aprovado por unanimidade na Câmara dos Deputados, o texto busca definir claramente o que são os jogos eletrônicos e de fantasia, além de traçar diretrizes importantes para o desenvolvimento da indústria de jogos nacionalmente.
Jogos eletrônicos voltados à temática de esportes, bem como jogos de fantasia em nada se assemelham a jogos de azar.
E já não era sem tempo. Com 101 milhões de gamers, o Brasil figura como o 5º maior mercado do mundo nessa indústria, que carece de regulamentação e incentivos para que seja aproveitado todo o seu potencial – é esse o objetivo do projeto de lei.
A aprovação do Marco Legal dos Games transforma o cenário brasileiro, trazendo segurança jurídica não somente às empresas do mercado, mas também aos investidores, que se sentem mais seguros em aportar capital em um ambiente regulado. É inegável a importância dessa mudança, tendo em vista que a indústria dos jogos eletrônicos é marcada por startups que dependem do capital privado para manter as portas abertas.
Além disso, o PL visa estimular o aumento de empregos ao dispor sobre o incentivo à criação de cursos técnicos e superiores de programação e desenvolvimento de jogos eletrônicos. Esse é um aceno notável à juventude, que encontra cada vez mais dificuldade em adentrar ao mercado de trabalho, além de ser o público que mais tem afinidade com os jogos eletrônicos e de fantasia.
De acordo com a Pesquisa da Indústria Brasileira de Games, o aumento do número de estúdios desenvolvedores de games entre 2014 e 2022 gerou um crescimento de 873% nas vagas de emprego desse setor. Imagine o que podemos esperar dessa indústria com a regulamentação e investimentos?
Infelizmente, existem grupos que se colocam contrários à aprovação do PL, alegando que o texto não representa os interesses das empresas, sob o argumento que a definição de jogos eletrônicos não é precisa e necessitaria de ajustes, dentre eles, a inclusão dos termos “obras audiovisuais”.
Por trás desta alegação está um propósito não muito nobre, o de tentar fazer com que estúdios de desenvolvimento de jogos possam ter acesso a recursos do fundo criado pela Lei Paulo Gustavo para o incentivo a setores da cultura duramente prejudicados pela pandemia. Direcionar verba do cinema, do teatro e da música – que passaram meses fechados durante a época de maior contágio do Covid-19 – para o setor de games não parece nada correto. Os jogos online vivenciaram, justamente durante a reclusão das pessoas, um desenvolvimento vertiginoso, jamais visto antes. O setor de games foi altamente lucrativo durante a pandemia, ao contrário do que aconteceu com o cinema, o teatro e a música. Seria correto, então, desviar verba assistencial da cultura para o desenvolvimento de jogos? Claro que não.
Vale ressaltar que o PL foi amplamente debatido com a iniciativa privada e com associações que representam dezenas de desenvolvedoras de jogos. Fica evidente o apoio da categoria ao Marco Legal quando se verifica a consulta pública no site do Senado, que mostra uma diferença de mais de mil votos favoráveis à aprovação do PL.
Esses grupos contrários ao texto do PL 2796/21 ainda incorrem na falácia de alegar que o PL seria uma forma alternativa de legalização de apostas esportivas. Essa fala desconsidera o próprio texto do Marco Legal, que é categórico ao dispor, no artigo 2º, que jogos eletrônicos não são jogos de azar, visando estabelecer um conceito claro para evitar quaisquer confusões indesejadas. Evidente que jogos eletrônicos voltados à temática de esportes, bem como jogos de fantasia em nada se assemelham a jogos de azar, uma vez que esses dependem exclusivamente da sorte, enquanto aqueles são jogos de habilidade.
É importante esclarecer que a aprovação do PL 2796/21 de maneira alguma engessa as discussões sobre a indústria dos jogos eletrônicos e de fantasia no Brasil. Trata-se de um texto que prima pela liberdade em sintonia com o princípio da livre iniciativa. O processo legislativo permite a complementação do Marco Legal dos Games para atender novas necessidades da categoria que não estejam refletidas nos dispositivos atuais por meio de regulamentação. O que não pode ocorrer é o impedimento da aprovação do projeto, o que atrasa a regulamentação e, consequentemente, os investimentos e desenvolvimento em um mercado que clama por valorização e acena com infinitas oportunidades para o público jovem, que sonha com um futuro melhor.
Júlia Albuquerque é bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo, pós-graduanda em Direito Digital pela Fundação Getúlio Vargas e advogada no Rei do Pitaco.
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