Nesta coluna, semanalmente cedida pela Gazeta do Povo , preferi, até agora, deixar-me inspirar por temas de raiz bíblica, ligados ao evangelho proclamado a cada domingo. Não se tratava de uma homilia abreviada. Nem de uma análise ou explicação. Pretendia simplesmente oferecer uma reflexão. Todavia, o Dia das Mães move-me hoje por outros caminhos. Aliás, parece que esta comemoração encontra, no Brasil, muito mais força e incidência do que em outros países. Dias atrás foi até notícia de que é a data que mais “ativa” o comércio, “perdendo apenas para o Natal” (?!?!?).
Nada sinaliza tanta gratuidade quanto a mulher que amamenta o seu pequeno
Uma vez que não me proponho a análises, nem a poesias (talento que me falta), mas a uma modesta reflexão, começo por uma frase que ouvi de uma mãe de primeira vez: “Estou descobrindo o que significa amar incondicionalmente”. Dizia ela que tudo em sua vida passara a uma nova significação. Parecia-lhe que os horizontes se transfiguraram. Sentimentos, sonhos, relações, experiências e esperanças receberam um novo centro unificador: a sua criança. Esta se tornara uma causa em favor da qual se subordinavam todos os outros objetivos. As opções e as renúncias, todas gravitariam em torno da nova realidade.
Nada de novo em tudo isso. Ou melhor, é uma “novidade antiga” que nunca perdeu o seu vigor. Porém, gostaria de destacar um traço desta realidade que talvez mereça o adjetivo de profético. Tudo poderia ser simplificado argumentando que é algo da natureza, que é um dado ínsito na estrutura humana feminina, que é uma expressão instintiva... Mas o “amor incondicional” convoca-nos a indagações sobre o sentido da vida.
Com justeza maravilhamo-nos face aos enormes avanços ensejados pela inteligência humana. E quantas descobertas com que a ciência nos enche os olhos. A cada novo desafio da história, novas conquistas se alcançam. E tudo isso poderia nos sugerir que deveríamos ser cada vez mais felizes, mais fraternos, mais próximos. Afinal, não parece que para a felicidade e a fraternidade precisemos de raciocínios muito complicados. Infelizmente as contradições grassam tanto quanto os êxitos e realizações.
Voltemos ao caráter “profético” do amor incondicional da maternidade. “Profético” e profeta, como indica a origem filológica do termo, não é o adivinho do futuro. Muito mais, é aquele que interpreta e fala em nome de Deus. Na profecia as palavras e os gestos apontam para a presença do sagrado, do divino, da santidade de Deus. Ele é gratuidade, tudo entrega, tudo oferece, sem qualquer outro interesse que não seja o de construir e partilhar a existência com quem ama. É este o seu modo de ser revelado em Jesus Cristo.
Pois bem, nada há de humano que seja tão gratuito quanto a maternidade. Quando é acolhida como vocação e como missão, a inteireza da feminilidade se transfigura. Ninguém é tão capaz de plena totalidade de dom de si quanto a mãe que sorri com sua criança nos braços. Nada sinaliza tanta gratuidade quanto a mulher que amamenta o seu pequeno. Tudo é gratuidade naqueles instantes. O eterno parece inserir-se nos limites do tempo. Isso me faz lembrar uma belíssima frase do padre Zezinho em uma de suas composições à Mãe de Jesus: “Em cada mulher que a terra criou um traço de Deus Maria deixou”. Parabéns, queridas mães!