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Bolsonaro e outras autoridades durante a execução do hino brasileiro na cerimônia de lançamento do programa Médicos pelo Brasil.
Bolsonaro e outras autoridades durante a execução do hino brasileiro na cerimônia de lançamento do programa Médicos pelo Brasil.| Foto: Marcos Correa/PR

O anúncio do novo programa federal “Médicos pelo Brasil” corrige as deficiências graves do programa Mais Médicos – que, a despeito da missão de estimular a interiorização de médicos pelo país, foi concebido com forte aparato ideológico. Os critérios de admissão de médicos cubanos, os termos de contrato, as divergências com as entidades médicas brasileiras e a falsa tese ventilada pelo então governo e seus militantes de que a culpa do caos da saúde brasileira era dos médicos locais são alguns pontos da grave fragilidade do programa anterior.

As entidades médicas abraçaram o programa Médicos pelo Brasil como vitória da categoria, sugerindo, no entanto, que a influência dessas instituições tenha definido os ritos do programa. Eis o erro. A vitória de um programa sólido que atende ao preceito constitucional de saúde gratuita e universal é do povo brasileiro, e transcende o favorecimento a uma categoria profissional em particular: acima dos médicos, definitivamente, está o povo brasileiro. Por outro lado, ao assumir o papel de saúde gratuita e universal, o Estado é o único responsável pela atração desses profissionais, em um país livre em suas relações de trabalho.

Prover saúde de qualidade ao nosso povo, definitivamente, não era o principal objetivo no passado

O programa atual é despido do falso caráter emergencial às vésperas de eleição presidencial. Além disso, a prioridade para distribuição dos médicos é técnica e baseada em classificação de áreas remotas já estabelecidas, inovando ao requerer especialização em Medicina de Família e Comunidade com elaboração de projeto de intervenção para qualificar os indicadores de saúde locais – esses indicadores, inclusive, servem em parte para definir o desempenho do médico e, então, recompensá-lo com adicional de salário. Salário, inclusive, é o termo que passa a valer para os médicos aprovados no período de bolsa depois de dois anos de atuação no programa. Agora, o governo que supostamente “trairia os trabalhadores” oferece garantias trabalhistas e liberdade para seus trabalhadores.

O desafio de um programa quase irretocável ainda é agregar qualidade às condições de trabalho. O médico sozinho não é capaz de mudar o sistema de saúde. Assim, políticas públicas focadas em prevenção e promoção de saúde devem andar ao lado da estruturação da rede de assistência. Ainda, educação médica continuada, mobilidade e a inclusão de outros profissionais de saúde ao programa devem ser incorporadas para tornar o programa mais atrativo.

O Médicos pelo Brasil demanda seleção, com prova objetiva, especialização e trabalho de conclusão de curso – tais requisitos respeitam o mérito, o esforço e a qualidade dos médicos que vão prover assistência ao povo brasileiro. Um médico mal formado é um agente habilitado a causar dano ao paciente e a onerar o sistema. Às pessoas que mais precisam de assistência, enfim, bons médicos.

Por muitos anos, o óbvio para se construir um programa verdadeiramente sólido foi encoberto. Oferecer qualidade aos pacientes e garantias trabalhistas que favoreçam a mão de obra local não pareciam ser de interesse dos gestores do passado. Agora, com a demonstração de que é possível criar um programa baseado em fixação de médicos em áreas mais pobres, qualificação, estabilidade profissional, monitorização de desempenho e plano de ascensão profissional, além de bonificação baseada em indicadores de qualidade, sem favorecimento político, fica claro que faltou competência para tentar sanar um dos mais graves problemas de saúde do país. Prover saúde de qualidade ao nosso povo definitivamente não era o principal objetivo no passado.

João Brainer Clares de Andrade é médico, doutorando pela Universidade Columbia, EUA.

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