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O medo não pode destruir o que as escolas representam para nossa sociedade
| Foto: Jonathan Campos / Gazeta do Povo / Arquivo

Haverá novos ataques a escolas. Não se trata de uma profecia sombria, mas de uma análise sobre diversos fatores envolvidos nas causas que levam à ocorrência de ataques contra estabelecimentos de ensino, no Brasil e no mundo. Desde 2002 registram-se ataques a escolas no formato denominado de “atirador ativo”, contra escolas no Brasil. Podemos considerar, tendo como base um estudo realizado pela Unicamp, que desde 2002 foram realizados 25 ataques desse tipo no Brasil, além dos que foram evitados, daqueles onde não houve vítimas e tantos outros que sequer chegaram a ser percebidos pela estrutura encarregada de seu enfrentamento.

Recentemente, observamos um aumento na frequência dos ataques, bem como sua ampla distribuição pelo território nacional. Ataques a escolas existem no mundo todo, há muitos anos. Não é um fenômeno novo ou que deveria nos surpreender por suas características. Ocorrem em países com as mais diversas culturas e não se restringem nem à classe social do agressor ou das vítimas. Ocorrem em locais onde as forças policiais são referência em qualidade de trabalho, equipamentos e recursos tecnológicos, mas também em sociedades absolutamente carentes por apoio, atendimento e proteção por parte do Estado. São realizados contra alvos de quase todas as faixas etárias, nível socioeconômico, etnias, gênero e com as mais variadas crenças religiosas.

Não podemos deixar que o medo tome o espaço de nossos sonhos e de tudo que uma escola representa para o desenvolvimento de uma sociedade melhor.

Para que possamos enfrentar esse fenômeno é necessário compreender, sobretudo, quais os fatores comuns aos autores e sua motivação, e à escolha dos alvos e características das vítimas. Em sua grande maioria, autores de ataques a escolas apresentam alguma forma de relacionamento (passado ou presente) com o local atingido. Geralmente são alunos, ex-alunos ou frequentadores daquele ambiente e trazem, portanto, vínculos emocionais com o local e as pessoas que ali se encontram.

E análises sobre esses vínculos mostram uma quantidade substancial de situações envolvendo sentimentos de que a agressão cometida viria como resposta a comportamentos de bullying, de opressão, humilhação, da sensação de perseguição ou de uma reprimida busca por vingança. Em relação aos fatores de congruência envolvendo as vítimas, podemos observar dois principais grupos distintos, presentes na maioria dos ataques: vítimas escolhidas previamente como alvo e um segundo grupo que, por motivos diversos, cruzou o caminho do agressor, tornando-se alvos de oportunidade.

Uma ampla análise acerca das características dos locais escolhidos para o ataque, percebe-se claramente fatores que fazem do ambiente escolar um alvo atraente ao olhar do agressor. Escolas oferecem, por característica básica de sua operação, uma enorme previsibilidade para o planejamento de um ataque. Funcionando quase que o ano todo, com calendário definido com grande antecedência, com horários de entrada e saída absolutamente repetitivos e de conhecimento público, escolas oferecem muito pouca possibilidade de surpresas a alguém que precise programar suas ações.

Além disso, aquele ambiente representa para o agressor uma enorme conexão com suas angústias e memórias que, muitas vezes, são a motivação para seus atos. E finalmente, escolas são locais onde se espera pouca ou nenhuma capacidade de reação por parte de seus frequentadores. Observando-se as ações adotadas nos países onde ataques contra estabelecimentos de ensino ocorreram, fica evidente que medidas emergenciais para conter uma curva ascendente de quantidade de ocorrências geralmente não são sustentáveis e tendem a serem afrouxadas na medida que o impacto na sociedade é amenizado pelo passar do tempo. É um processo natural de adaptação e que tem ocorrido em todos os cenários.

A questão é que estas medidas, embora às vezes necessárias nos momentos de crise, como aumento da presença ostensiva policial, reforço de serviços de vigilância, adoção de mudanças na rotina dos estabelecimentos ou mesmo a suspensão de atividades por períodos determinados, combatem somente os “sintomas”, sem efeito na “doença”.

Embora gerando uma imediata percepção por parte da sociedade, se não forem combatidas as causas que levaram estes agressores a este ponto, em breve teremos sua recorrência ou mesmo aumento. Não podemos deixar que o medo tome o espaço de nossos sonhos e de tudo que uma escola representa para o desenvolvimento de uma sociedade melhor. Precisamos neste momento onde a banalização da violência, a falta de empatia, o preconceito e discursos de ódio nos confrontam, sermos firmes em medidas de proteção que garantam a tranquilidade de crianças, jovens e seus pais, mas que respeitem a essência do que queremos com o conceito de escola, garantindo um ambiente acolhedor, de confiança, respeito e de desenvolvimento.

A verdadeira solução está em utilizar toda esta energia gerada pela sociedade, sobretudo após o abominável ataque em Blumenau, para agir em duas grandes frentes: combater as causas do problema e adotar estratégias de proteção caseadas em conhecimento técnico, análise de riscos, planejamento de segurança, com medidas que sejam efetivas, perenes e sustentáveis à operação das escolas, evitando soluções mágicas, “marqueteiras”, que não resolverão a questão e acabarão por amplificar os problemas de saúde mental e o estresse no ambiente escolar e nas famílias. Existem soluções. Segurança precisa se adaptar à escola. E não o inverso.

Fernando Brafmann é diretor do Grupo MAGAV.

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