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O modelo japonês de Inteligência Artificial: inovação, ética e cultura
| Foto: Andy Kelly/Unsplash

Em um encontro recente ocorrido no Centro de Políticas Cibernéticas da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, uma visão surpreendente sobre a inteligência artificial, o modelo japonês, chamou a atenção dos participantes. Dois professores da Universidade de Kyoto, Hiroki Habuki e Tatsuhiro Inatani, revelaram como o Japão, ao contrário de muitas nações ocidentais, vê a IA como uma aliada para enfrentar os desafios sociais.

Em vez de temer a tecnologia ou enxergá-la como uma ameaça à autonomia humana, o modelo japonês incorpora a IA em sua filosofia de harmonia e interdependência. Essa abordagem se revela como um modelo de equilíbrio entre tradição e inovação, trazendo lições valiosas para o Brasil e o mundo.

O Japão está criando um modelo de regulamentação de IA que equilibra inovação com respeito cultural e responsabilidade social. Em um mundo onde o avanço digital é cada vez mais rápido, o Japão propõe um futuro em que a tecnologia e a humanidade coexistem em harmonia

Para os japoneses, o conceito de interdependência vai muito além do senso comum. Ao contrário da forte ênfase ocidental na individualidade, o Japão segue uma visão de mundo em que o bem-estar individual está profundamente ligado ao bem-estar do grupo e do ambiente ao redor. Essa filosofia – influenciada por tradições como o zen-budismo e o animismo – trata todas as coisas, sejam pessoas, animais, natureza ou até mesmo objetos, como partes de um sistema interconectado.

Por isso, a inteligência artificial e os robôs são vistos de forma distinta no modelo japonês. Em vez de máquinas frias e distantes, são considerados companheiros que podem interagir com os humanos de maneira que realmente enriqueça a vida. Esse princípio está por trás dos chamados “robôs fracos”, que precisam de interação humana para funcionar. Isso permite que esses robôs não apenas complementem as tarefas do dia a dia, mas também promovam laços emocionais, fortalecendo o vínculo entre pessoas e tecnologia.

Ao contrário dos Estados Unidos e da União Europeia, que tentam implementar regulamentações amplas e rígidas para IA, o Japão adota uma abordagem diferente. No modelo japonês, a IA é regulada de acordo com o setor e as necessidades específicas de cada área. Esse modelo de regulação setorial é colaborativo e flexível, permitindo que as regras evoluam conforme a tecnologia avança, sem limitar o potencial de inovação.

Um dos pontos mais debatidos na palestra foi o desenvolvimento dos “robôs sociais” e as questões éticas que surgem com essa tecnologia. Projetados para interagir de forma emocional com humanos, esses robôs têm um papel essencial na sociedade japonesa, especialmente no cuidado a idosos e no desenvolvimento infantil. No entanto, esses laços emocionais geram preocupações, principalmente quanto à privacidade e à possível manipulação de sentimentos.

O Japão, em vez de proibir esses robôs ou controlá-los excessivamente, busca entender a fundo o impacto psicológico e comportamental dessa interação para criar diretrizes éticas específicas. Esse cuidado reflete a visão cultural do Japão de que a tecnologia deve servir para fortalecer os laços humanos, não para rompê-los ou controlá-los. Enquanto algumas legislações ocidentais podem ser mais restritivas, o modelo japonês considera esses robôs uma oportunidade para melhorar a vida das pessoas, sem abrir mão de um debate ético contínuo.

Outro aspecto interessante discutido em Stanford foi a aplicação da IA em setores específicos do cotidiano japonês. Em áreas como transporte e saúde, o Japão já possui regulamentações que permitem automação avançada. Na condução, por exemplo, veículos de nível 4 já operam sem necessidade de intervenção humana, e no setor de saúde, a IA apoia diagnósticos precoces e monitoramento preventivo. Para o Japão, a IA não é uma substituta para o humano, mas uma aliada que ajuda a superar desafios reais, como o envelhecimento populacional e a escassez de mão de obra.

O modelo japonês mostra que a inteligência artificial pode ser uma força positiva, se orientada por valores culturais e éticos sólidos. No Brasil, onde diversos setores estão em rápida evolução tecnológica, há muito a aprender com a abordagem japonesa. A implementação de uma regulamentação adaptável e colaborativa, que respeite a dignidade e a autonomia dos usuários, pode abrir caminho para uma inovação mais ética e acessível.

O Japão está criando um modelo de regulamentação de IA que equilibra inovação com respeito cultural e responsabilidade social. Em um mundo onde o avanço digital é cada vez mais rápido, o Japão propõe um futuro em que a tecnologia e a humanidade coexistem em harmonia. Para o Brasil e outras nações, a experiência japonesa oferece um exemplo claro de como a IA pode não só atender às necessidades sociais, mas também reforçar valores fundamentais, promovendo uma verdadeira transformação para o bem comum.

Thiago Chiavegatto Iaderoza, advogado e executivo especialista em direito empresarial, compliance e governança, é membro da Comissão Especial de Combate ao Mercado Ilegal do Conselho Federal da OAB. 

Conteúdo editado por:Jocelaine Santos
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