Neste mês de outubro, nossa Constituição Federal completou 35 anos de vigência, data que foi merecidamente comemorada no Congresso Nacional, com a presença das mais elevadas autoridades dos três Poderes da República.
Comparada com as de outros países, a Constituição Brasileira ainda é jovem e, dentre as que já tivemos, se destaca como aquela que possui a mais ampla gama de direitos individuais e sociais, o que torna merecido o apelido de “Constituição Cidadã”.
Nela, estão lançadas as bases do Estado, sobre um tripé de Poderes, o que é típico do modelo adotado pelas democracias ocidentais.
Como o Estado deve refletir a dinâmica da vida nacional, é natural que suas instituições não sejam entes estáticos e inflexíveis às transformações pelas quais passa a sociedade. É preciso levar em consideração os legítimos e relevantes anseios por transformações que, necessariamente, devem ser moldados nas estruturas já existentes.
Assim, aprimorar o Estado e adequá-lo à realidade nacional são tarefas necessárias.
Aqui, falo da modernização do Judiciário.
É certo, claro, que o Legislativo e o Executivo também devam ser aperfeiçoados, e isso tramita com muita naturalidade em diversas Propostas de Emenda à Constituição ora sob análise no Parlamento.
Aprimorar o Estado e adequá-lo à realidade nacional são tarefas necessárias
Tendo em vista essa necessidade por modernização de nosso aparato institucional, apresentei a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 51/2023, justamente para contribuir com o debate acerca da formação, competência e atuação do Supremo Tribunal Federal (STF), cuja atividade independente deve ser preservada, sempre em primeiro plano.
Com ênfase, a discussão sobre a escolha dos membros do STF tem ganhado relevância no debate político dos últimos tempos, embora seja um assunto que já se prolonga por mais de dez anos no cenário político, compreendendo parlamentares, juristas, especialistas da área, além da própria sociedade.
Assim, para contribuir com esse amplo debate, propus, na PEC, três mudanças significativas.
A primeira delas retira o caráter vitalício do exercício do cargo de ministro do STF, conferindo a seu ocupante mandato de quinze anos, não renovável.
O modelo atual carece de agilidade quanto à atualização dos membros da Corte. Isso dificulta que os posicionamentos sobre as grandes teses jurídicas feitas pela cúpula do Judiciário acompanhem as mudanças nos princípios e valores que regem a vida em sociedade e que são afetadas pela globalização, inovação tecnológica e diversificação cultural.
Essa limitação de tempo de exercício no cargo permitirá ao STF uma conexão mais natural com as mudanças nos valores da sociedade, mediante a renovação mais frequente de sua composição e também terá a boa consequência de restringir a influência do governante que faz a indicação, para não muito além da duração de seu mandato, no que diga respeito às decisões que serão tomadas por seu indicado. Esse será um efeito republicano.
A segunda mudança eleva a idade mínima dos ministros do STF, passando dos atuais 35 para 50 anos. É uma mudança que vai ao encontro das máximas responsabilidades assumidas por um ministro da Suprema Corte, uma vez que se trate de pessoa que não deva ser dotada apenas de conhecimentos técnicos e notável saber jurídico.
Também terá a boa consequência de restringir a influência do governante que faz a indicação, para não muito além da duração de seu mandato
Dele se espera, também, experiência de vida e maturidade superiores, o que compreende predicados relativos à sabedoria e à ponderação, que são atributos associados à idade e à vivência.
A terceira mudança proposta estabelece uma quarentena para que se possa ser indicado a Ministro do STF, e também dos Tribunais Superiores, em caso de a pessoa ter ocupado cargos de Ministro de Estado, AGU, PGR ou presidente de estatal.
Politicamente, essa medida visa blindar a independência do exercício desses cargos de maior envergadura da eventual e inoportuna interferência de governos, quando o Presidente da República indica seus subordinados diretos para compor o STF.
A Corte possui competência para apreciar matérias de grande interesse do Poder Executivo e para julgar o próprio Chefe desse Poder nos crimes comuns. Há que se estabelecer necessário distanciamento, o que contribuirá com o fortalecimento da República, por meio das altas decisões que nela sejam tomadas.
Com a aprovação dessa medida, somente depois de três anos após deixar o cargo, Ministro de Estado, Procurador-Geral da República, Defensor Público-Geral Federal e presidente de estatal poderão vir a ser indicados à cúpula do Judiciário.
Aqui, enfrentamos um assunto que tem permanecido intocado desde a Constituição de 1891, a da República, que é o critério de seleção dos ministros do STF e a duração de seus mandatos, sendo mais que oportuno que o tema entre na agenda política do Congresso Nacional.
Há que se estabelecer necessário distanciamento, o que contribuirá com o fortalecimento da República
O país necessita de um novo modelo de jurisdição constitucional, de modo que a importante tarefa de dar o entendimento final aos ditames de nossa Lei Maior se ajuste melhor à essência política da atualidade brasileira.
Falo de um debate necessário neste momento e para o qual apresentei estas sugestões de melhoria, com a intenção de que componham um entendimento mais amplo e do qual, esperamos, resulte mais segurança jurídica, independência e qualidade para as decisões proferidas por nossa Corte Maior.
Flávio Arns foi professor da UFPR. Formado em Direito (UFPR) e em Letras (PUCPR), possui Ph.D. em Linguística pela Northwestern University (EUA). Com sua tia, Zilda Arns, participou da fundação da Pastoral da Criança, em 1983. Iniciou sua caminhada política em 1991, quando assumiu o primeiro de três mandatos como deputado federal. Em 2002, elegeu-se senador. De 2011 a 2014, foi vice-governador do Paraná e secretário de Educação. Em 2019, começou novo mandato como senador e hoje é presidente da Comissão de Educação e Cultura do Senado.