O conceito do pensamento associado ao hemisfério direito e ao esquerdo do cérebro deve-se ao psicobiologista americano Roger Wolcott Sperry. Segundo Sperry, é no hemisfério esquerdo do cérebro humano que ocorre o processamento da análise do raciocínio. Ele é ativado quando é solicitado a resolver problemas complexos de Matemática, Física, Química, Biologia ou línguas. Para a maioria das pessoas, o hemisfério esquerdo do cérebro controla as funções verbais, incluindo a linguagem, o pensamento e a memória de palavras (em português e línguas estrangeiras). Por quê? Porque resolver essas questões demanda que sejam trazidos conceitos relevantes e específicos à frente da consciência. De acordo com Sperry, esse hemisfério é lógico, sequencial, analítico, objetivo, racional e olha para as partes.
Sperry também cita que o hemisfério direito do cérebro humano procura realizar associações entre conceitos aparentemente diferentes, mas que têm alguns pontos em comum. O processo é subconsciente, o que significa que a pessoa não tem conhecimento quando o hemisfério direito está procurando tais conexões. É esse hemisfério que controla as emoções, a criatividade, as artes. O hemisfério direito trabalha processando a informação do geral ao particular, do volume ao detalhe. Ele é arbitrário, intuitivo, holístico, sintetizador, subjetivo e olha para o todo.
Hoje, é muito questionada a tese de que os hemisférios cerebrais tenham uma divisão de tarefas tão rígida. Algumas funções específicas realmente são privilégio do hemisfério esquerdo ou do direito, mas tudo indica que muitas tarefas funcionem em um esquema conjunto, em que o papel de cada área varia dependendo da necessidade. Por exemplo, as capacidades artísticas tendem a estar relacionadas à metade direita do cérebro, mas isso não é tão simples: se uma pessoa for raciocinar sobre seu desenho, já estará apelando para uma função do lado esquerdo.
O cérebro humano processa problemas nos dois hemisférios, ao mesmo tempo. A diferença é que o processamento do hemisfério direito geralmente ocorre abaixo do nível de consciência. Nem sequer se percebe que esses lados do cérebro estão trabalhando – e é por isso que toda essa atividade invisível leva ao que se caracteriza como “momentos Eureka!” (quando se tem um insight criativo). Há três origens para esses momentos.
A primeira origem dos “momentos Eureka!” é caracterizada como “momentos dochuveiro”. Quando a pessoa acorda, sai para uma corrida ou toma um banho de chuveiro, geralmente sente como se fossem “ondas de genialidade”. Geralmente, essas são ocasiões em que o cérebro não está sobrecarregado de pensamentos, experimentando o que parece ser uma inspiração repentina. Mas é apenas o resultado de os cérebros estarem vazios do caos lotado do pensamento do hemisfério esquerdo, o que, por sua vez, permite que surjam ideias na metade direita do cérebro, que poderiam estar lá há muito tempo.
A segunda origem dos “momentos Eureka!” ocorre por meio da conexão. Aqui, o hemisfério direito do cérebro, sabendo que um único conceito é incapaz de dar uma resposta satisfatória, está subconscientemente trabalhando para conectar vários conceitos. Se o hemisfério direito conseguir desvendar o que parece ser uma solução viável, ela será ativada. É essa súbita explosão de atividade cerebral que cria a sensação de genialidade.
A terceira origem dos “momentos Eureka!” envolve um gatilho. Nesse caso, um fator ambiental ativa inconscientemente uma associação com algo já armazenado no hemisfério direito do cérebro. Por exemplo, se uma pessoa ficar por algum tempo trabalhando em palavras cruzadas e uma hora depois passar pela palavra que procurava em um outdoor, poderá muito bem experimentar um “lampejo de gênio”, sem ao menos perceber que o processo ocorreu.
Todos esses três métodos acontecem ‒ mais ou menos ‒ abaixo do nível de consciência do ser humano médio. Na realidade, esse processo não é mágico ou místico, mas puramente biológico. Os “momentos Eureka!” são simplesmente um processo cognitivo normal, mas eles em geral apresentam um resultado surpreendente.
Considerando-se como sendo atual a teoria de Roger Sperry (muitos cientistas suportam essa teoria), para que haja “momentos Eureka!” é preciso que ambos os hemisférios sejam igualmente desenvolvidos.
E o que isso tem a ver com o Brasil de hoje? O país teve a quarta maior queda no mundo em pedidos de patente. Também chama a atenção que a enorme maioria dos pedidos em nome do Brasil tenha sido feita por brasileiros que não residiam no país. Segundo a ONU, isso é reflexo da chamada “fuga de cérebros”. As informações são do relatório Indicadores de Propriedade Intelectual Mundial, divulgado pela Organização Mundial de Propriedade Intelectual (Ompi), entidade sediada em Genebra, na Suíça, e integrante do sistema da ONU.
Em 1911, criou-se no Brasil o exame vestibular, para ingresso nos cursos de ensino superior. Ele foi transformado, ao longo das décadas, por dezenas de leis, decretos, portarias e resoluções. Todo o ensino anterior ao vestibular está voltado às disciplinas que esse exame contempla.
Atualmente, verifica-se que o exame foca essencialmente as atividades relacionadas ao hemisfério cerebral esquerdo: Matemática, Física, Química, Biologia, línguas etc. E essas matérias são, em geral, ministradas de forma independente, sem que os professores façam conexões entre elas.
Já o desenvolvimento do hemisfério direito passou a ser de responsabilidade das famílias dos alunos ou de atividades extracurriculares desenvolvidas nas escolas e que, em geral, nem aparecem nos boletins. Assim, pergunta-se: como o brasileiro pode ter “momentos Eureka!” no mesmo nível, bastante elevado, em que eles ocorrem em países da América do Norte, asiáticos e europeus, que focam seu ensino tanto no desenvolvimento do hemisfério cerebral esquerdo como no direito?
Marcos de Lacerda Pessoa, engenheiro, Ph.D. pela Universidade de Birmingham (Inglaterra) e pós-doutor em Engenharia pelo MIT, é autor de Sementeira de Inovação, organizador e editor de Pinceladas de Inovação e proprietário do centro de apoio à inovação futuri9.com.
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