O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, participa de audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O Brasil de hoje experimenta uma guerra de narrativas. Essa ação bélica subentende dois lados, cada um com conteúdos fechados sobre um mesmo fato, mas na disputa pela verdade. As pessoas são obrigadas a se posicionar e escolher um  lado, em lealdade aos ideais que defendem. Como no seriado Lost, há “nós” e “os outros”, uma divisão que polariza as opiniões até o extremo. Esse fenômeno é terreno fértil para as fake news, intrigas, disputas políticas, doutrinas, manipulação e polarização. Quando um fato importante é divulgado, não se pode perder de vista tal perspectiva. A recente publicação de troca de conversa entre o então juiz federal Sergio Moro, hoje ministro da Justiça, e membros do Ministério Público deve ser analisada sob a ótica da possível adulteração de discurso por parte de quem não comungue de seus valores. Quando um dos lados já não convence como antes, passa a usar táticas mais radicais, como o uso de hackers para obter informações privadas.

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Moro e Deltan Dallagnol merecem gratidão e respeito do povo brasileiro pela coragem, dedicação e persistência na condução da Lava Jato

Tentam manipular a opinião pública para transformar quem prendeu corruptos em vilões. O jornalista Glenn Greenwald é conhecidamente um militante da esquerda. Ou seja, vai ficar do lado dos que conspiram contra a Lava Jato, não a favor. Ninguém mais no Brasil duvida que uma onda de abusos e desmandos assolou o país nos últimos anos. Não é fácil deter um tsunami de pagamento de propinas, evasão de divisas, caixa 2, lavagem de dinheiro, formação de organização criminosa, crimes financeiros, todos de forma sistêmica, enraizada na estrutura do Estado. Corrupção em todos os escalões. A sociedade brasileira quer mesmo ver livres Lula, Temer, Dirceu, Cunha, Cabral, Geddel, Delúbio? Moro e Deltan Dallagnol merecem a gratidão e respeito do povo brasileiro pela coragem, dedicação e persistência na condução da Lava Jato.

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A narrativa resultante da invasão criminosa de celulares acirrou ainda mais os ânimos entre a esquerda e a direita. Com intenção política, o sensacionalismo gerado teria a pretensão de favorecimento dos réus e investigados da Lava Jato. Uma operação da Polícia Federal, a Satiagraha, já foi anulada. Agora ocorreu um crime grave contra o Ministério Público e o ministro Moro. Existem os que apostam na reversão da condenação de Lula, e que o precedente criado na Satiagraha pode se repetir. Mas não há o que temer. Há uma diferença enorme entre essa operação e a Lava Jato. A primeira teve sua ilegalidade na origem e, por isso, as consequências legais, como a punição de diversos atores da operação, acabaram anuladas. A Lava Jato seguiu todo o trâmite legal e constitucional, com as devidas condenações em vários graus e colegiados. O que foi vazado pelos hackers sobre Moro e os integrantes da força-tarefa em nada desabona a sua conduta. Pelo contrário: as mensagens reforçam a legalidade e eficácia das ações dos agentes públicos. Nenhuma prova foi criada e nem obtida de forma ilegal. O único crime revelado é o próprio vazamento.

Opinião da Gazeta: Moro, Dallagnol e o vazamento de conversas (editorial de 11 de junho de 2019)

Leia também: Sergio Moro e Deltan Dallagnol são vítimas (artigo de Modesto Carvalhosa e Gauthama Fornaciari de Paula, publicado em 11 de junho de 2019)

A Polícia Federal já vinha investigando havia quase um mês o hacker Tal Prihar, preso em Paris em uma operação conjunta entre a PF, o FBI e a Europol, sob acusação de diversos crimes, apesar de ainda não existir nenhuma conexão comprovada com esse vazamento. A grande pergunta, como muitas que ficarão sem resposta (incluindo a tentativa de homicídio do atual presidente), é: quem mandou cometer o crime contra os procuradores da Lava Jato e o juiz do caso? Com certeza, pessoas interessadas em tirar o mérito da Lava Jato e deixar Lula livre. O próprio Moro explicou que o vazamento foi arquitetado por uma organização criminosa profissional, mas que não há qualquer risco de anulação do processo do tríplex do Guarujá, que levou à prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Chega a ser desalentador saber que muitos celebraram a reportagem do site The Intercept. Acreditar que pela manipulação dos conteúdos é possível dirigir as consciências dos cidadãos é uma ilusão. Ninguém gosta de ser enganado. A esquerda começa a entender, pelo jeito mais duro, que não consegue mais a imposição de seu discurso totalitário como antes, graças às mídias sociais, que abriram caminho para a expressão da direita. Essas guerras de narrativas desencadeadas em todo o Brasil estão gerando somente perdedores, tanto no que diz respeito à identidade nacional quanto em relação à vida democrática. É preciso formar indivíduos autônomos e levá-los a desenvolver suas capacidades intelectuais e críticas, fazendo com que tenham acesso a conteúdos variados. É preciso construir um caminho em que todos respeitem as regras mais básicas do jogo democrático, sem ameaçar a integridade do sistema legal e representativo. É preciso deixar a militância discursiva de que tudo que atinge o PT seja mentira armada por fascistas homofóbicos de extrema-direita, brasileiros que se manifestam aos domingos porque trabalham o dia inteiro de segunda a sábado.

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Carlos Arouck é policial federal, formado em Direito e Administração de Empresas, instrutor de cursos na área de proteção, defesa e vigilância, consultor de cenários políticos e de segurança pública, e membro ativo de grupos ligados aos movimentos de rua.