Terra à vista! Esta é a frase que os capitães, em tempos remotos, exclamavam ao se deparar com a sonhada terra conquistada! Atualmente, em terra brasilis, o grito é outro. Promulgada pelo vice-presidente da República em 10 de julho de 2015, a Medida Provisória 681 altera a Lei 10.820/2003: a partir de agora, o trabalhador brasileiro poderá usar 35% de seu salário para tomar crédito consignado, “sendo cinco por cento destinados exclusivamente para a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito”.

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A MP veio como tentativa de desafogar tanto o trabalhador que não encontra mais crédito como nos tempos de Lula quanto o mercado que tem visto diariamente o barco ir a pique. Pensando na sobrevivência dos tripulantes, o governo Dilma privilegiou novamente o consumo como forma de aquecer os motores da economia e, quem sabe, colocar o navio em rota novamente. Mas será que nosso capitão esta de fato tomando as medidas corretas?

O consumo, sem sombra de dúvida, é um dos pilares de qualquer economia. É a partir dele que o mercado interage em seus mais diversos ramos e dá possibilidade ao cidadão de adquirir bens, de que natureza forem. Entretanto, hastear a bandeira do consumo como fonte primária de soluções para uma nação é o mesmo que correr atrás do vento.

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Aumentar o crédito consignado dos trabalhadores é como abrir mais um buraco no convés da nau capitânia

Em recente entrevista ao jornal Valor Econômico, Frei Betto, um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores, afirmou que “o PT não criou cidadania, criou consumismo”. E vai além: “E, agora, tiraram o sorvete da boca da criança e ela está se queixando”. Pois é. Chorou tanto que a MP 681 veio fazer um agrado às crianças queixosas. Lembrando que, na semana anterior, outra MP estampou os noticiários: a 680/2015, que criou o Programa de Proteção ao Emprego, estabelecendo, entre outras normativas, a possibilidade de as empresas reduzirem temporariamente em até 30% a jornada de trabalho dos empregados, com redução proporcional do salário.

Não quero parecer pessimista, mas aumentar em cinco pontos porcentuais o crédito consignado dos trabalhadores é como abrir mais um buraco no convés da nau capitânia. Os números são consistentes e absolutos: índices assustadores de inflação, aumento da taxa de juros, valores exorbitantes desviados por manobras estatais. É possível que a embarcação se perca em meio ao oceano de decisões equivocadas e mal construídas. Nem mesmo o diretor de fiscalização do Banco Central, Anthero Meirelles, comemorou a edição da MP, entendendo ser prudente aguardar uma avaliação mais precisa.

Certamente os míticos dirão que os ventos são desfavoráveis; os pessimistas, que é hora de abandonar o barco; os possibilistas, como eu, dirão que o país precisa das palavras e atitudes do Velho, personagem de Ernest Hemingway: “O dentuso é feroz, hábil, forte e inteligente. Mas eu fui mais inteligente do que ele. Talvez não. Talvez só estivesse mais bem armado”.

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Renata Cerci Ruschel Tannhauser é advogada.