O Brasil tem uma característica no seu ambiente tributário que não agrada grande parte da população: a alta tributação sobre o consumo. E tais tributos incidem porcentualmente sobre o preço da mercadoria ou serviço. Deste modo, toda vez que há aumento de preços, este é acompanhado de maior arrecadação para os cofres da União, estados e municípios.
Um dos produtos mais consumidos pelos brasileiros, direta ou indiretamente, é o combustível. Seja no próprio deslocamento de pessoas no dia a dia, seja na cadeia de transporte de mercadorias. E devido às sucessivas altas, principalmente por conta do aumento do barril de petróleo, uma iniciativa do Poder Legislativo federal trouxe uma grande polêmica: mudar a forma de cálculo do ICMS sobre o combustível.
A proposta é utilizar a média de preços dos últimos 24 meses como base de cálculo do combustível. Como o patamar de preços de 2019 e 2020 estava bem abaixo do parâmetro atual, o ICMS, que compõe o preço, ficaria menor; consequentemente, os preços atuais seriam reduzidos. O ICMS na gasolina varia de estado para estado. São Paulo tem a menor alíquota (25%) e o Rio de Janeiro tem a maior (34%). De acordo com a Agência Nacional do Petróleo (ANP), os preços médios da gasolina em setembro deste ano estavam em torno de R$ 6,078. Pela proposta da Câmara dos Deputados, a nova base de cálculo de ICMS utilizaria o preço médio de janeiro de 2019 a dezembro de 2020, que variava de R$ 4,268 a R$ 4,483. Com essa mudança, a Câmara espera que o preço da gasolina comum tenha uma redução de 8%, em média. O etanol hidratado teria 7% de redução, enquanto o diesel ficaria 3,7% mais barato.
Mas será que essa mudança proposta pela Câmara é a mais adequada? Entendo que não, pelo menos no formato atual. O ponto crítico principal é que esse fator seria temporal, reduzindo o preço atual, mas com retorno agressivo nos próximos anos.
Alterações isoladas de temas tributários é o mesmo que enxugar gelo. É cada vez mais unânime que necessitamos de uma reforma tributária ampla e urgente.
Para exemplificar a minha preocupação, utilizamos o estado do Paraná como referência. A última média de preços divulgada pela ANP em nosso estado foi de R$ 5,947 para gasolina comum em 26 de setembro deste ano. Se a proposta da Câmara evoluir, esse preço seria reduzido para R$ 5,411, ou seja, redução de 9%. Isso porque a média dos preços da gasolina entre 2019 e 2020 foi de R$ 4,098. Se não houver aumento de preços daqui em diante (o que seria pouco provável), só por conta da mudança de base de cálculo, o aumento de combustível seria de 3,3% em 2022 e 4,84% para 2023. Esses efeitos somente ocorreram por conta da retomada da base de cálculo. Considerando que haverá oscilações nos custos, é muito provável que os preços retornem ao patamar atual em pouco tempo.
A proposta atual poderia melhorar? Na minha opinião, sim. Minha sugestão é fazer alterações em duas etapas. Na primeira, mudaria a base de cálculo reduzindo a mesma em torno de 31% (o que equivale à média de preços de combustíveis no Paraná em 2019 e 2020). Em uma segunda etapa (que seria permanente), haveria ajustes anuais nesta base de cálculo considerando índices de inflação, como o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPC), por exemplo. Nesse formato, considerando as estimativas da inflação para 2022 e 2023, teríamos uma certa estabilidade no preço do combustível, pois o peso do ICMS representaria aumento de 0,9% e 0,7% para 2022 e 2023, respectivamente.
Alterações isoladas de temas tributários é o mesmo que enxugar gelo. É cada vez mais unânime que necessitamos de uma reforma tributária ampla e urgente. Existem projetos de lei e propostas de emendas constitucionais neste sentido, mas tudo a passos lentos. Os cidadãos e o ambiente empresarial exigem mais velocidade na tentativa de termos mais transparência, simplicidade, objetividade e justiça em nosso sistema.
Marco Aurélio Pitta é gerente de controladoria do Grupo Positivo e coordenador de programas de MBA nas áreas Tributária, Contábil e de Controladoria da Universidade Positivo.
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