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Nada indica mais a pobreza da política brasileira do que a proposta de pacto para mudar algumas regras no sistema eleitoral, quando precisamos de união para uma mudança de rumo. Quando mais precisamos aprender com o papa (Francisco) e substituir as pompas e privilégios pela simplicidade que, afinal, não diminui o poder. Quando precisamos aprender com outros países.

Anos atrás, fui à Irlanda investigar por que um dos países mais atrasados em educação havia se transformado em exemplo mundial nessa área. Quis visitar a cidade de Cork, onde, nos anos 70, as lideranças políticas do país haviam decidido uma união para priorizar a educação nos anos seguintes. O embaixador do Brasil, Stelio Amarante, disse que não havia tempo porque as estradas eram ruins. Perguntei como um país tão bom em educação tinha suas estradas ruins. Ele respondeu: "Por isso mesmo! Gastaram o dinheiro em educação e não em estradas. Agora o país vai modernizá-las".

Os líderes irlandeses olharam o futuro e fizeram as contas para definir prioridades. Nós estamos acostumados a olhar para o imediato e a não fazer as contas. Essa é uma das razões da insatisfação que leva às manifestações do povo, especialmente da juventude que está querendo reorientar os recursos para mudar o rumo do país.

Há seis anos o Brasil se dedica à construção de estádios para a Copa do Mundo de 2014, sem olhar a educação e o ano 2030. O Distrito Federal não tem times que atraiam torcedores, mas fez estádio para 72 mil espectadores ao custo de R$ 1,6 bilhão, num momento em que a capital do país mais precisava de creches, educação integral e do retorno de programas como Saúde em Casa, Temporadas Populares, Paz no Trânsito e Projeto Saber.

Uma conta mostra que apenas com os recursos desse estádio seria possível financiar a formação de pelo menos 6,8 mil engenheiros de excelência, desde a 1.ª série do ensino fundamental, em superescolas com padrão internacional até a formatura em cursos similares ao do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), um número maior que a soma de todos os engenheiros formados no Instituto em seus 64 anos.

Se considerarmos que cada um desses profissionais vai contribuir para o desenvolvimento do país e gerar uma renda igual ao salário deles, algo em torno de R$ 20 mil por mês, ao longo de 35 anos de trabalho o montante resultaria em cerca de R$ 63,6 bilhões, valor equivalente a 40 estádios similares ao novo Mané Garrincha.

Se considerarmos o custo dos 12 estádios da Copa, deixaremos de formar pelo menos cerca de 30,4 mil cientistas e tecnólogos da mais alta qualidade. Esses profissionais serviriam de base para o desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil, desde que os líderes brasileiros olhassem para o futuro e fizessem as contas.

Nesse caso, talvez no futuro, alguém pergunte: "Como é possível que um país com a excelente qualidade na educação, uma das melhores do mundo, não tenha na sua capital um estádio para 72 mil pessoas?" E alguém diria: "Por isso mesmo, preferiram formar 6,8 mil engenheiros de máxima qualidade. Agora vão fazer o estádio".

O Brasil tem muitos problemas. Um dos mais graves é não fazer contas, nem olhar o futuro. Felizmente, o povo, e especialmente os jovens, começaram a fazer as contas e ir às ruas usando a guerrilha cibernética para forçar uma unidade brasileira pela mudança de rumo nas nossas prioridades.

Cristovam Buarque, professor da UnB, é senador pelo PDT-DF.

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