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Carbono zero

Naufrágio de narrativa: por que Bill Gates recuou em seu catastrofismo ambiental

Bill Gates com Ursula von der Leyen, na COP26, em Glasgow (Foto: Dati Bendo/Wikimedia)

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Depois de passar anos promovendo o alarmismo climático, o que incluiu o livro Como evitar um desastre climático (publicado no Brasil pela Companhia das Letras), o dublê de megafilantropo e engenheiro social Bill Gates protagonizou um autêntico cavalo de pau na sua narrativa catastrofista. Em um debate público em Nova York, em 21 de setembro, ele admitiu que o discurso alarmista sobre o clima enfrenta dificuldades cada vez maiores de aceitação.

“Se você tentar tratar o clima com força bruta, você vai ver pessoas dizendo, ‘eu gosto do clima, mas não quero pagar esse custo e reduzir o meu padrão de vida’”, disse ele.

Ao contrário do que afirmou no seu manifesto alarmista de 2021, desta feita, o cofundador da Microsoft soou mais “pé no chão”, enfatizando que “nenhum país temperado irá ficar inabitável”.

Para ser mais preciso, deveria ter dito que nenhum país em qualquer faixa de latitudes ficará inabitável por conta das mudanças climáticas, como mostra o registro paleoclimático dos últimos 12 mil anos, a época geológica chamada Holoceno, que já presenciou períodos mais quentes, com níveis do mar superiores aos atuais e o Ártico livre de gelo nos verões – tudo isto com pouco mais que metade das atuais concentrações de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera.

A rigor, esta mera contradição seria suficiente para derrubar todo o edifício do catastrofismo climático e a pseudosolução da “descarbonização” da economia mundial, mero pretexto para grandes negócios com os chamados créditos de carbono e a limitação do crescimento populacional e da industrialização de todas as nações – estes últimos, os objetivos reais dos mentores da criação do movimento ambientalista internacional, nas décadas de 1960-70.

As elites globalistas já perceberam que o “Titanic verde” bateu no iceberg da realidade das limitações tecnológicas e econômicas e nos altos custos da chamada “transição energética” e estão abandonando o navio

Voltando a Bill Gates, de qualquer maneira, ele manteve a nova coerência, desmentindo que plantar árvores irá salvar o planeta: “Nós somos as pessoas da ciência ou somos idiotas? O que queremos ser?”

Mas ninguém deve se surpreender com essa mudança de atitude de um dos mais visíveis propagandistas do globalismo entre os altos círculos do poder econômico internacional. Na verdade, as elites globalistas já perceberam que o “Titanic verde” bateu no iceberg da realidade das limitações tecnológicas e econômicas e nos altos custos da chamada “transição energética” e, consequentemente, estão abandonando o navio.

O alarme foi dado em junho de 2022, com uma reportagem especial da revista The Economist sobre o tema “ESG: três letras que não irão salvar o mundo”.

Este ano, “majors” petrolíferas como a Shell, BP, Chevron e outras, anunciaram discretamente o abandono das respectivas agendas de redução acelerada das suas “pegadas de carbono”. A Chevron recebeu do “ecológico” governo de Joe Biden uma concessão para explorar por 30 anos a Reserva Estatal de Petróleo do Alasca, estado que foi palco de um dos maiores desastres da indústria petrolífera em todos os tempos, em 1989. Outro governo com grandes preocupações ambientais, a Noruega, anunciou a intenção de expandir a exploração de hidrocarbonetos no Ártico, cujos ecossistemas são ainda mais delicados que os da Amazônia, para cuja “proteção” Oslo tem sido a principal financiadora do Fundo Amazônia (enquanto a norueguesa Hydro explora alumínio em Barcarena-PA).

Mais recentemente, os megafundos de gestão de ativos BlackRock e Vanguard, que até há pouco trombeteavam as maravilhas da agenda ESG (sigla em inglês para ambiental, social e governança), anunciaram um recuo nos investimentos “sustentáveis”. Em seguida, foi a vez de Lynn Forester de Rothschild, cuja família de megabanqueiros tem sido uma das maiores patrocinadoras do ambientalismo político, decretar que a sigla ESG terá que ser jogada no lixo. Logo depois, o primeiro-ministro Rishi Sunak anunciou o adiamento da agenda de “carbono zero” do Reino Unido, para não prejudicar a economia e as famílias britânicas (por ironia, enquanto o rei Charles III estava em Paris, fazendo um discurso sobre o combate às mudanças climáticas).

Dias depois, em uma demonstração de que o ambientalismo britânico não passa de um produto de exportação, o governo de Sunak anunciou o sinal verde para um dos maiores projetos de petróleo e gás natural no Mar do Norte, o campo de Rosebank, que será explorado pela Equinor. O argumento é simples e pragmático: a prioridade é a segurança energética.

Na Alemanha, a locomotiva econômica da União Europeia, a desastrosa implementação da “transição energética”, baseada em uma grande expansão da geração elétrica com fontes eólicas e solares, foi ressaltada em um recente relatório do Tribunal Federal de Auditores: “O Tribunal Federal de Auditores vê o perigo de que a transição energética em sua presente forma coloque em risco a Alemanha como um local para negócios e sobrecarregue a capacidade financeira das empresas e dos lares privados que consomem eletricidade... Em última análise, isso pode ameaçar a aceitação social do conjunto da transição energética (Die Welt31/08/2023).”

Aparentemente alheio a tudo isso, o Brasil parece obcecado em seguir apostando no cassino do “Titanic verde”. Enquanto a “transição energética” vem sendo cada vez mais questionada, o Brasil mergulha nela mais com base em critérios ideológicos e financeiros de curto prazo, do que em um planejamento de longo prazo embasado em dados técnicos e econômicos sólidos, surpreendentemente, com o aplauso de setores empresariais que poderão ser os mais prejudicados.

Um exemplo é o estudo recém-divulgado estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI) sobre o potencial de utilização de usinas eólicas “offshore” para ampliar em até 3,6 vezes a atual capacidade de geração elétrica nacional. Ora, a experiência de países como a Alemanha, Dinamarca, Reino Unido e outros mostra que, para cada gigawatt de fontes eólicas/solares intermitentes, é preciso dispor de uma quantidade quase igual de geração firme ou “despachável” (termelétricas, hidrelétricas e nucleares), para quando não houver vento suficiente ou luz solar. Tradução: para se dispor de energias ditas “limpas”, é preciso ter de reserva unidades geradoras de fontes convencionais que entraram na lista negra dos ambientalistas e outros desinformados sobre os fundamentos da geração elétrica.

Escusado dizer que os custos de tal esquema não são baixos e são incorridos por toda a sociedade. Ou seja, fora os lucros de curto prazo permitidos pelas usinas eólicas e solares (cerca de dois anos de construção e poucos problemas com as autoridades ambientais), onde estão as vantagens comparativas alardeadas pelos seus defensores?

Além disso, a criação de um mercado de créditos de carbono compulsório, como o que está em estudos no Congresso (PL 412/2022), tende a criar mais impostos e burocracia para setores industriais como a siderurgia, química, cimento, alumínio, petroquímica e petróleo. Quer dizer, aumento de custos para eles e para os consumidores dos seus produtos, que são quase todos os demais.

Em essência, trata-se de uma aposta de alto risco – principalmente, porque o iceberg da realidade já rasgou o casco do “Titanic verde”.

Lorenzo Carrasco é jornalista, presidente do Movimento de Solidariedade Ibero-americana (MSIa) e da Capax Dei Editora. Entre seus livros estão "Conselho Indigenista Missionário: Filho da Mentira" (2016) e "Máfia Verde: o ambientalismo a serviço do Governo Mundial" (2001).

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