Ilustração: Felipe Lima| Foto:

No dia 11 de abril, o governo requentou a questão da autonomia do Banco Central (BC). O discurso da autonomia (às vezes também chamada de independência) vem, invariavelmente, associado com a motivação de isolá-lo de influências políticas para garantir a estabilidade de preços. Mais concretamente, diz-se pretender evitar que o BC financie os gastos do Tesouro, pois os gastos públicos seriam inflacionários.

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Embora sem evidências robustas – nos últimos três anos, estamos em meio a déficits orçamentários recordes e nem a inflação nem os juros dão sinais de fugir ao controle –, a crença é de que o financiamento dos déficits públicos pelo BC levaria ou à inflação ou a taxas de juros elevadas. Contudo, enquanto o BC operar a política monetária por meio da fixação da taxa de juros básica da economia (no Brasil a Selic), a autonomia do BC em relação ao Tesouro não terá condição de existência. O Tesouro invariavelmente consegue colocar seus títulos à taxa de juros decidida pelo Banco Central.

A autonomia do Banco Central torna mais uma agência pública distante da luz do controle público

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Em sentido estrito o Banco Central já é independente do Congresso e da influência política. A escolha da meta de inflação e dos meios que serão utilizados para atingi-la é livremente exercida pelo BC. Os bancos centrais tiveram bastante liberdade para salvar bancos privados da quebradeira na crise financeira – provocada por estes mesmos bancos, diga-se – que se espalhou dos EUA para todo o sistema financeiro mundial em 2008. O próprio governo reconhece que a medida vem apenas “consagrar em lei a situação de fato hoje existente”. Assim, o problema não está em que a autonomia traria algo novo, mas consolidaria um arranjo ruim.

Em relação à autonomia política do Banco Central, conquanto a ideia seja identificada atualmente com posições liberais e pró soluções de mercado, não é disso que realmente se trata. O conhecido monetarista Milton Friedman era contrário à autonomia do Banco Central porque “dinheiro é coisa importante demais para ser deixado aos banqueiros centrais”. Embora o neoliberal e Nobel Robert Lucas não acreditasse em risco de contaminação do mercado financeiro pelas perdas no segmento subprime na emergência da grande crise financeira de 2008, ele passou a defender políticas intervencionistas do presidente do Banco Central Americano Ben Bernank que, assim que o Lehman faliu, “imediatamente mudou de marcha, começou a injetar dinheiro no sistema bancário e convenceu o Tesouro a fazer o mesmo”.

Leia também: Banco Central: menos interferência, mais estabilidade (artigo de Giovanna Miranda Mendes, doutora em Economia Aplicada e professora do curso de Economia da Universidade Positivo)

A ideia de um banco central autônomo é, portanto, um mito. O Banco Central não se tornará independente de suas necessárias relações com o Tesouro. Assim como, na próxima crise financeira, o BC será novamente chamado a salvar os bancos de seus empréstimos duvidosos. Portanto, o BC autônomo não passa de um mecanismo fantasioso com o intuito de obscurecer a aplicação dos recursos públicos. O risco real – até mesmo denunciado por um neoliberal como Friedman – é tornar o BC um agente isolado das influências salutares do debate público e opaco ao monitoramento público quando nova crise financeira emergir. Em suma, a autonomia do Banco Central torna mais uma agência pública distante da luz do controle público e mais próximo dos interesses dos rentistas.

Fabiano Abranches Silva Dalto é professor associado do Departamento de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do Paraná.

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