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Distante dos limitados embates eleitorais, a conservação do patrimônio nacional continua a representar uma agenda despretensiosa para os governos e para o setor privado. Nas campanhas recentes, vemos apenas acusações mútuas, que procuram imputar responsáveis pela crise hídrica de boa parte da Região Sudeste brasileira. Definitivamente, nossas prioridades são outras.

Seguimos apostando que choverá o suficiente para que esse "acaso" da natureza passe logo. E, para os que não têm torneiras ainda secas, o problema, convenientemente, é mais para lá. Na toada da inconse­quência, o Brasil aposta na boa vontade de São Pedro e na sorte, tão somente, para reverter o fenômeno que já ultrapassou todos os recordes históricos quanto à geração de prejuízos econômicos e sociais. Desconsideramos o déficit de áreas naturais em territórios maltratados ao longo de décadas. E, a partir disso, colecionamos uma extensa lista de consequências: a crise da água é apenas uma das muitas limitações que nos ameaçam de maneira concreta.

Em janeiro próximo, o país e os estados iniciam suas novas gestões. Uma incógnita estimar em que situação estaremos daqui a dois meses no que se refere às limitações de geração de energia hidrelétrica e no abastecimento de água. Seja como for, poucas expectativas existem de que nossos governos mudem sua tendência recorrente de ignorar a importância da conservação de áreas naturais.

Em uma parcela significativa do Paraná, a seca se faz muito presente, hostilizando comunidades e impedindo o pleno desempenho de atividades econômicas. É evidente que nossa fronteira política com São Paulo não nos protege de nada. Nem somos diferentes de lá, no trato ambiental – pelo contrário. Nos últimos quatro anos, nenhuma das promessas de uma agenda inovadora e qualificada nesse campo foi cumprida em nosso estado. Em vez disso, uma política de libertinagem foi instaurada, o que permitiu o aumento da destruição de áreas naturais.

Torna-se até tedioso reclamar atenção em relação à obviedade que relaciona a degradação de áreas naturais com a indisponibilidade de serviços ambientais. A sociedade, passiva, insiste em permanecer distante de uma realidade que já bate à porta, como se o problema não dissesse respeito a todos.

Se continuarmos a representar esta minoria inexpressiva de resistência perniciosamente identificada como radical e contrária ao desenvolvimento, não existirão quaisquer expectativas de mudanças de cenário. Manteremos nossa condição de dependência de milagres. Este tipo de comportamento reflete nossa incapacidade de gestão do interesse coletivo e exterioriza a ignorância e falta de respeito pelos limites impostos pela natureza.

Os governos, todos eles, precisam encarar suas responsabilidades no âmbito da conservação. Nas últimas décadas, pela prática do engodo, foram mantidos processos convencionais e viciados de uso do território, sem garantir qualquer tipo de consistência de qualidade de vida para longo prazo.

Os políticos e o Executivo, presos a interesses setoriais, são os principais responsáveis pelo risco de derrocada econômica de nossa sociedade causada pelo crônico e vergonhoso desrespeito à natureza. É realmente admissível para o cidadão ou para o empresário este crescente estado de insegurança?

Clóvis Borges é diretor-executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS).

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