Há sete anos, quando a Assembleia Legislativa de São Paulo colocou em pauta e aprovou a lei que proíbe o uso de telefones celulares pelos alunos em salas de aula, a psicóloga Rosely Sayão escreveu um artigo que, naquele ano, tornou-se tema de uma das redações do vestibular da UFPR. Em 2014, quando entra em vigor a lei com o mesmo teor no Paraná, vários são os alunos que elogiam o posicionamento de algumas escolas por exercer sem autoritarismo o cumprimento da norma e, mais ainda, convidar os estudantes a discutir esse tema. Mas como chegamos à necessidade de ter uma lei como essa?
Para responder a essa e outras questões, é preciso recordar a famigerada máxima de que as leis devem adaptar-se à sociedade por elas pretensamente regida. Se a discussão sobre o uso de telefones celulares em sala de aula transformou-se em lei, é porque a escola, as famílias e os próprios alunos, em alguma medida, perceberam a impossibilidade de lidar com esses eletrônicos sem descaracterizar o ambiente de concentração, imprescindível ao aprendizado de qualidade. Vamos a um exemplo bem específico: a partir do momento em que um professor precisa entrar em uma sala de aula e solicitar aos alunos que guardem seus telefones, é porque o princípio do respeito ao espaço coletivo foi quebrado.
Talvez, para compreender melhor a relação que costumamos nutrir com o espaço coletivo, seja preciso refletir sobre como os adultos se comportam diante das regras. Ao passo que o Estado regula o uso de equipamentos eletrônicos como o celular nas escolas, no mundo adulto, em relação ao trânsito, por exemplo, não parece tão fácil manter a civilidade, mesmo com regras bastante claras e consolidadas. Uma analogia como essa pode mostrar que o caminho ainda é longo devido à relação bem distante entre a existência de uma lei e a sua aceitação por parte dos cidadãos. É quase como se vivêssemos uma dupla identidade: queremos desfrutar do espaço de todos, mas pouco nos responsabilizamos pela interferência individual que nele temos, independentemente de normas.
Nessa esteira de reflexões, parece oportuno lembrar que tecnologias podem e devem ser empregadas como recurso didático. A respeito dessa finalidade, um número divulgado pelo Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro é bastante expressivo: 82% dos jovens estudantes com idades entre 16 e 24 anos afirmam utilizar o celular para aprofundar conteúdos escolares. Então, o que há de errado? O problema, ironicamente, está na liberdade. É seu nome que invocamos ao exigir nossos direitos, mas é também ela que desrespeitamos quando ignoramos a barreira invisível entre visitar um site de buscas e acessar uma rede social para outras finalidades, como o entretenimento, durante uma aula.
Para fugir ao monstro do senso comum, das reflexões sobre leis cumpridas ou transgredidas, sigo o raciocínio do jornalista Fernando Rodrigues. Por ocasião da aprovação da Lei da Ficha Limpa, que exige idoneidade dos candidatos a cargos eletivos, ele escreveu um texto afirmando que as leis são imperfeitas, que as perfeitas não existem. Quero parafraseá-lo em relação à Lei 18.118: sozinha, certamente não fará milagres, mas pode ser um passo educativo importante na mudança de perspectiva sobre o celular na escola, desde que seu cumprimento venha acompanhado de uma boa reflexão com os estudantes a ela submetidos.
Cleuza Cecato é professora de Redação do Colégio Bom Jesus, em Curitiba.
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