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A acentuada queda da demanda global, decorrente do ajuste recessivo requerido para a superação da crise financeira, que surgiu com o colapso do mercado hipotecário periférico dos Estados Unidos (EUA) e atingiu os segmentos de crédito e as finanças corporativas, vem sendo acompanhada por diminuição dos preços das commodities, especialmente das agrícolas.

É interessante assinalar que uma parcela não desprezível da adequação para baixo nas cotações por ser atribuída menos aos fundamentos de mercado e mais ao desmonte das operações especulativas em posições futuras, que compreendiam mais de dez vezes o volume de produção, estimuladas pelo aquecimento da procura e da menor atratividade das aplicações financeiras – depois da perspectiva de queda de juros nos EUA desde o mês agosto de 2007.

Mesmo que ocorra a estabilização de preços em patamares superiores às médias históricas, parece correta a avaliação de que o ciclo ascendente registrado entre 2003 e 2007 estaria esgotado. Naquele período, o desempenho dos produtos básicos e semielaborados foi fortemente beneficiado pela fase mais vigorosa do comércio internacional depois da Segunda Guerra Mundial, reforçada pela ampliação dos mercados de consumo de países emergentes do porte da China e da Índia.

Agora, as perspectivas de que se mantenha o empate técnico entre oferta e demanda, em um contexto de reduzidos estoques, esbarram na magnitude da contração econômica dos EUA e seus impactos sobre as exportações das exportações e da renda das nações emergentes, com desdobramentos sobre a massa de rendimentos (emprego e salários) e o consumo das famílias.

Não bastasse a influência negativa exercida pelo delineamento de um ambiente de preços menores, o que representaria o canal de transmissão real da crise externa, é perceptível a contaminação pelo lado financeiro, reflexo da escassez de crédito atestada pela redução das linhas de financiamento das tradings – companhias multinacionais responsáveis pela maior parte da comercialização dos produtos primários e agroindustriais.

Emergem ainda dificuldades para a renovação de financiamentos contratados por segmentos que realizaram investimentos calcados em cenários otimistas, como o sucroalcooleiro, e para o levantamento de recursos pela modalidade de Adiantamento de Contrato de Câmbio (ACC), que propiciava inclusive, ao exportador, a ampliação da renda variável, com a aplicação das somas adiantadas no mercado financeiro e o acúmulo de ganhos com o diferencial de juros e a valorização cambial.

Em igual sentido, o declínio dos depósitos à vista nos bancos comerciais também funciona como elemento de compressão do crédito para custeio e investimento, com a queda das cifras alocadas nas chamadas exigibilidades (25,0% do total).

Os meios especializados sugerem que a desvalorização do real, provocada pela corrida para o levantamento de moeda estrangeira, visando à cobertura de prejuízos incorridos com as operações financeiras e/ou a simples obtenção de liquidez, poderia compensar, ainda que parcialmente, o decréscimo de rentabilidade acoplado ao encolhimento do mercado.

Porém, em persistindo a situação adversa e na falta de abrangentes mecanismos de políticas públicas de proteção à renda articulada ao setor rural, tal como praticado pelas nações avançadas e em desenvolvimento, não seria absurdo trabalhar com reprogramações nas decisões de plantio dos produtores e/ou a utilização de menor conteúdo tecnológico nas lavouras.

A esse respeito, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) já projeta redução de 4,5% nas estimativas de produção para o próximo ano agrícola, por conta da conexão entre compressão dos preços e escassez de crédito para a compra de fertilizantes e defensivos, o que deve diminuir o emprego de tecnologia nas principais lavouras. Em um cenário mais desfavorável, as restrições de escoamento, tributos, seguros e preços mínimos ficarão mais evidentes.

Gilmar Mendes Lourenço é economista, coordenador do Curso de Ciências Econômicas e editor da Revista Vitrine da Conjuntura da FAE Business School.

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