Quem ainda acredita que o futuro acontece em decorrência linear do tempo pode estar ultrapassado. Vivemos a era das tecnologias exponenciais que se multiplicam, repetidamente e de forma constante. Notícia alarmante ou não, o fato é que fomos treinados e acostumados a pensar linearmente, a esperar o ritmo constante da mudança e o passar dos anos. Nossas gerações se habituaram a pensar com base em experiências passadas e a usar estas experiências para prever ou antever o futuro.
Intrigada com estas questões exponenciais, decidi não ser alguém de pensamento linear. Mergulhei no entendimento destas mudanças aceleradas para reverter a minha visão intuitiva de futuro. É uma questão de disrupção do modelo mental. Um treino a se fazer diariamente.
O pensamento exponencial é balizado pelos "seis D's" que representam a jornada da tecnologia digital exponencial, e que podem nos auxiliar a identificar e antecipar tendências disruptivas. São eles: digitalização, que significa que as informações são gerenciáveis via computador e estão disponíveis para acesso; deceptivo, que é o estágio inicial de uma tecnologia exponencial, ainda complexa e pouco utilizada; disruptivo, quando o avanço tecnológico atinge um ponto crítico que supera drasticamente o paradigma anterior; desmaterializado, pois itens que eram grandes e materiais agora cabem na nuvem ou no bolso; desmonetizado, pois o custo de se produzir a tecnologia é tão menor em comparação com a posse da versão física que as economias de escala associadas ao uso de sensores permitem que eles se tornem totalmente acessíveis; e democratização, o fim de nossa reação em cadeia exponencial, que acontece quando objetos físicos são transformados em bits e inseridos em uma plataforma digital em volumes tão altos que o custo se aproxima de zero.
Culturalmente, o agronegócio tem de evoluir em investimentos em infraestrutura e tecnologia
Junto tudo isso, olho o cenário do agronegócio, em que atuo há 14 anos, e começo a questionar os discursos atuais sobre o agronegócio 4.0, as tecnologias exponenciais e a disrupção.
Na biotecnologia, avançamos com uma velocidade absurda nos últimos anos. Temos plantas geneticamente modificadas que já são mais resistentes às pragas ou mesmo à escassez de água. Agora fala-se da biologia digital e as novas possibilidades da inserção de circuitos no DNA das células e bactérias, transformando-as em biossensores capazes de transformar qualquer tipo de água em água potável. Ou, ainda, o uso de micróbios eletricamente ativos como fonte de energia e calor. Agora começamos a falar também da carne de laboratório, possível por meio das células-tronco de animais e da manipulação da engenharia genética. E estes são apenas pequenos exemplos do que se tem investido em pesquisa e desenvolvimento na área. Também já testamos e podemos imaginar uma reprogramação de DNA, que estará presente em um futuro próximo para a humanidade; além da presença dos robôs na sociedade, mudando a forma como fazemos as coisas e pensamos sobre elas.
Tudo isso nos impactará exponencialmente como humanidade, rompendo os "seis D's" exponenciais. A premissa é a de que todo ser humano passe a ter acesso aos benefícios destas tecnologias disruptivas com o menor custo possível.
Hoje desenvolvemos sistemas que permitem o controle de processos e sua gestão em tempo real. Trocamos informações entre máquina e homem em tempo real. Mas isso não seria apenas o básico quando pensamos em gestão de negócios? Será que usamos a capacidade total que estes dados nos trazem?
Ainda viveremos uma curva de adoção das tecnologias. Culturalmente, o agronegócio tem de evoluir em investimentos em infraestrutura e tecnologia. Ainda no básico, na base da pirâmide. E aqui falamos da infraestrutura de conectividade, dos softwares e de sua integração, mas também do próprio modelo mental dos empreendedores do setor.
Conectar e gerir dados para a tomada de decisão é, sem sombra de dúvida, uma das mais importantes decisões. E não apenas pela concorrência preparada vinda de países estrangeiros para atuar no agronegócio do nosso país, mas, principalmente, por tantos entraves logísticos, financeiros e tributários constantes em nosso cenário brasileiro. Precisamos ser eficientes em gestão para melhorarmos a produtividade e a rentabilidade das lavouras e negócios agrícolas. Mas este é apenas o começo para uma mudança muito maior. O início de um caminho que ainda não sabemos ao certo aonde nos levará, com todas as mudanças exponenciais. Mas é um caminho certo.
VEJA TAMBÉM:
- Tecnologia para o agronegócio vencer os desafios (artigo de Cintia Leitão de Souza, publicado em 7 de agosto de 2019)
- Tecnologia no agronegócio: riscos e oportunidades (artigo de Cristiano Kruk, publicado em 20 de maio de 2019)
- O devido cuidado com nosso agronegócio (artigo de Marcos Pena Júnior, publicado em 21 de julho de 2019)
Como evoluiremos disruptivamente trocando experiências entre agricultores do mundo todo ou promovendo globalmente boas práticas e a troca de experiências? Como produziremos mais alimentos sem que a escassez de recursos naturais seja um risco para a humanidade? Seremos capazes de levar ou produzir alimentos para pessoas à margem da miséria no mundo todo? Como digitalizaremos as informações do agro e as democratizaremos? Seríamos capazes de trocar informações e aprendizado com o mundo todo on-line? Tudo isto será, sim, viável e crescerá de forma exponencial. Afinal, estas tecnologias batem à nossa porta para transformar o mundo e resolver problemas da humanidade de forma integrada e colaborativa. Estamos diante de um cenário a que o mundo nunca assistiu. Um cenário que gera uma nova era rompendo barreiras e impulsionando as pessoas à ação.
Começo a acreditar que o agronegócio 4.0 ainda é a parte básica da transformação digital. A parte inicial da mudança do modelo mental linear. A tecnologia exponencial da gestão no agronegócio ainda está por vir.
Cintia Leitão é diretora de Agronegócio da Senior Sistemas.