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Tropas israelenses combatem o terrorismo na Faixa de Gaza
Tropas israelenses combatem o terrorismo na Faixa de Gaza| Foto: EFE/ Atef Safadi

Em 17 de abril de 2019, os dois autores deste texto estavam perto de testemunhar o nascimento de seu filho Theo, que chegaria em junho daquele mesmo ano. Mesmo com a gravidez avançada da Lílian, fomos até a Congregação Israelita Paulista (CIP) para um evento no qual o então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, bateria um papo com a comunidade sobre “Justiça e Julgamento nos dias de hoje e no judaísmo”.

Tínhamos, naquele momento, uma série de reservas sobre a atuação do STF, assim como muitos da plateia. A fala do ministro Toffoli, porém, foi tranquila, pontuada com exemplos da atuação do STF contra o antissemitismo, como o famoso caso “Siegfried Ellwanger”, que envolveu a condenação de um editor de livros antissemitas do estado do Rio Grande do Sul. Era, basicamente, o único caso sobre o tema tratado pelo STF.

A sensação que dava é que se falava de algo muito distante do Brasil, um país que convive muito bem com sua população judaica, a ponto de até a sua mais alta corte de Justiça ter poucos exemplos para trazer à CIP. Antissemitismo nestas terras era realmente coisa episódica e de gente realmente marginal, no sentido de estar fora dos meios de comunicação e de poder, como o caso de Ellwanger.

Podemos afirmar que a comunidade judaica brasileira buscará a responsabilização de todos os antissemitas e apologistas do terror que ousaram expor em público a sua indecência.

Pouco mais de quatro anos se passaram. Nesse meio tempo, nasceram nossos dois filhos, e eu e a Lílian escrevemos um artigo sobre uma onda de ataques do Hamas ocorrida naquele ano, no qual expusemos falas de alguns políticos brasileiros que beiravam a apologia ao terrorismo. Mas nada nos preparava para o que iríamos ver e testemunhar neste Brasil e mundo de 2023.

Além de os ataques terroristas de 7 de outubro de 2023 terem afetado Israel e o mundo e das milhares de famílias destruídas e enlutadas, os judeus ao redor do globo se sentiram novamente desamparados e sozinhos. Claro que muita gente de bem deu seu apoio às vítimas, condenou o terrorismo e se solidarizou com o povo israelense, fazendo com que toda essa comunidade se sentisse acolhida e consignasse sua eterna gratidão. Ao mesmo tempo, porém, o antissemitismo mostrou que não era mais uma doutrina marginal, e ganhou amplo espaço nas redes sociais, na mídia, nas universidades e no meio acadêmico.

Não era apenas desinformação sobre Israel e sobre o conflito palestino. Havia toda uma justificação para o terror, uma relativização do direito à vida, uma apologia à violência e à brutalidade como formas de vencer. Era uma glorificação do retorno ao tempo das cavernas, onde cada um impunha a lei com o seu tacape. As conjunções adversativas “mas”, “contudo” e “entretanto” eram usadas mais ou menos assim: primeiro se dizia “condeno o terrorismo mas...”, e depois se completava com um motivo para odiar Israel ou os judeus, como “Israel é um Estado colonialista e imperialista”; “Israel mantém Gaza como uma prisão a céu aberto”; “Israel mantém um apartheid e comete genocídio contra os palestinos”, entre outros.

Muitas destas afirmações foram devidamente desmentidas por Alan Dershowitz em sua seminal obra The Case for Israel (WILEY, 2003). Mas não há livro ou conhecimento que baste para quem já formou opinião sobre Israel e rebaixa tudo à luta política ou à dicotomia direita x esquerda, balindo, como as ovelhas de George Orwell em Revolução dos Bichos: “Palestina Quatro Patas Bom, Israel Duas Patas Mau”. E se Israel fosse tudo aquilo que dizem dele (e não é), presume-se, então, que a degola de bebês seria justificada, o uso de estupro como arma de guerra seria válido, e a matança indiscriminada de seres humanos apenas uma forma de “resistência”.

Agora não é mais um obscuro editor gaúcho sendo antissemita. São professores universitários que dão aulas para os nossos filhos. São deputados. São ministros de Estado. São donos de sites abrigados no guarda-chuva do grupos de mídia bilionários. E, assim como os terroristas do Hamas usaram as redes sociais para mostrar seu trabalho macabro como algo a se orgulhar, os antissemitas brasileiros saíram do armário e vieram à público transformar o antissemitismo em algo “mainstream”, em algo aceitável na política e no debate público. O recado é que os fins justificam os meios. Quaisquer meios.

Vários exemplos disso foram mostrados na reportagem da Gazeta do Povo “16 declarações da esquerda brasileira relativizando o terrorismo do Hamas”, publicado em 15 de outubro deste ano. A matéria lista inúmeros exemplos, mas as manifestações de relativização do terrorismo são infinitas. Não nos iludamos com o comportamento humano. O “nunca mais” ou “eu teria escondido judeus no meu porão” são, muitas vezes, de fato, afirmações vazias. Mas daí a testemunhar apoio ao terror pelo terror, a insensibilidade diante da visão de mulheres arrastadas para o inferno de um cativeiro do Hamas, sujeitas a serem estupradas, ou com bebês decapitados, é quase que assassinar as vítimas de novo. É de se lamentar a desumanidade de quem tem essa postura.

Que “Estado” é esse que o Hamas pretende ter? Se com o pouco “Estado” que eles têm os seres humanos (inclusive os que já estão sob seus “cuidados”) já são tratados assim, imaginem o que fariam com o território de Israel (nada mais que seu objetivo final). É o mesmo Estado no qual o dinheiro de vacinas é gasto em foguetes? O mesmo Estado no qual tubulações de esgoto são desmontadas para criar mais foguetes? O mesmo Estado que coloca crianças em alvos militares para gerar cenas de comoção?

Infelizmente, mostrar que se solidariza apenas com os palestinos, ignorando o sofrimento de milhões de israelenses, é compactuar com os métodos de terror do Hamas, os quais ferem os próprios palestinos e suas crianças. Nossa Constituição, em seu art. 4°, elenca como princípios de nossas relações internacionais os princípios da defesa da paz, da solução pacífica dos conflitos e do repúdio ao terrorismo e ao racismo. O Brasil não pode tolerar que o antissemitismo se torne uma doutrina política aceitável. Não podemos premiar o terrorismo com tentativas de apaziguar os criminosos. O antissemitismo deve e merece voltar para o lixo da história, junto com todos os apologistas do terror. Antissemitas e terroristas são marginais e às margens da sociedade voltarão.

Vitor Frankl, sobrevivente do Holocausto, dizia que só existem duas “raças” de homens neste mundo – a “raça” dos decentes e a “raça” dos “indecentes”. Considerando que o racismo e o terrorismo são igualmente repudiados pelo Brasil e pela nossa Constituição, podemos afirmar que a comunidade judaica brasileira buscará, por todos os canais possíveis, a responsabilização de todos os antissemitas e apologistas do terror que ousaram expor em público a sua indecência. Temos todo o tempo do mundo.

Lílian Schreiner Módolo é doutora e mestre em Administração pela USP, professora universitária e de pós-graduação, e empresária. Foi Researcher Fellow na Universidade de Graz, Áustria; Luiz Augusto Módolo de Paula é advogado, bacharel, doutor e mestre em Direito Internacional pela Faculdade de Direito da USP, jornalista e escritor. É autor de “A Saga de Theodore Roosevelt” (Editora Lisbon International Press, 2020), “Genocídio e o Tribunal Penal Internacional para Ruanda” (Appris, 2014) e “Resolução de Conflitos em Direito Internacional Público e a Questão Iugoslava” (Arraes, 2017).

Conteúdo editado por:Jocelaine Santos
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