Vida e liberdade, bem como respeito ao próximo, precisam andar juntos| Foto: Pixabay
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O que dizer depois de um ano como o de 2021? O que esperar do futuro para o nosso país, seja ele pós- ou endêmico com Covid? E a pergunta mais difícil de ser respondida: como será a ética no Brasil em 2022?

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O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, ao afirmar que “é melhor perder a vida do que perder a liberdade”, entra em um dos conflitos mais importantes da ética, e que envolve também uma das linhas-mestras da chamada “ética utilitarista”. Esta última é a ética do bem maior para a maioria, um clássico e que tem grandes defensores. Ela, aliás, está presente em muitas decisões tomadas em política, inclusive na saúde pública.

Contudo, com todo o respeito, talvez o ministro tenha esquecido que ao Estado cabe garantir a vida e a liberdade, sendo a vida em primeiro lugar.

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Tanto é assim que estivemos obrigados até agora a usar máscaras e a evitar aglomerações. Ou seja, medidas que restringem liberdades individuais em nome de um bem maior que é a vida.

Aliás, o Brasil é o país do utilitarismo às avessas. Vemos aqui alianças entre políticos que pareciam inconciliáveis (não preciso aqui descrever de quem); vivenciaremos uma disputa eleitoral entre candidatos que estavam frente a frente em um tribunal de primeira instância e que irão agora ao tribunal das urnas; também temos uma suposta polarização entre direita e esquerda que, na realidade, é uma fragmentação de valores em uma colcha de retalhos. O utilitarismo às avessas é a busca do bem maior para a minoria, em detrimento do interesse coletivo.

Para o padre Joseph De Finance, a ética é uma ciência categoricamente normativa que estuda os atos humanos à luz da razão. Ela tem muitas linhas de pensamento, e a ética utilitarista é apenas uma delas. A do utilitarismo às avessas não existe oficialmente, apenas aqui no contexto off-label. Assim, qual, então, será a linha ética que irá preponderar em 2022?

O fato é que vivemos um mundo interdependente, cada vez mais integrado e com fronteiras cada vez mais tênues e vulneráveis. Mas, infelizmente, cada vez mais fragmentado e dividido em seus valores e muito desigual. Isto exige mais responsabilidades individuais. Exige mais humanidade, ética (como ciência e como comportamento) e sensibilidade de todos nós. É a vida, na realidade, tão frágil e rápida, quem exige que as virtudes floresçam no deserto de nossas imperfeições morais.

As diferenças de opinião e o respeito a elas fazem parte da vivência em sociedade. Aliás, é por meio delas que se descortina a verdade, e só com isso se poderá construir um país melhor. O interesse comum, contra os interesses do utilitarismo às avessas.

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Vida e liberdade, bem como respeito ao próximo, precisam andar juntos na ética em 2022.

Reduzir as diferenças entre ricos e pobres não é atributo da esquerda, assim como meritocracia não é atributo da direita. Ambas são meios para reduzirmos a desigualdade social que é tão grande no nosso país. Ambas são meios para buscarmos a felicidade. São preocupações e objetivos que vão além de posicionamentos políticos, pois são deveres morais que devem estar no nosso horizonte de responsabilidades, independente de partidos.

Tolerância e resiliência, que palavras maravilhosas e quanta falta nos fazem! Como será possível chegarmos a elas em 2022? O grande elemento transformador é o respeito ao próximo, elemento basilar de todas as linhas de pensamento da ética (menos a do utilitarismo às avessas!) que pode mudar o mundo e unir mais as pessoas.

Bons pensamentos se transformando em boas palavras, boas palavras se materializando em boas atitudes e boas atitudes nos tornando pessoas virtuosas. Um Brasil de pessoas virtuosas se tornando uma grande nação, não mais do futuro, mas do presente. Valorizando a vida, a liberdade e respeitando as pessoas, independentemente de suas posições. É a utopia; mas, sem as utopias e os sonhos, ficamos sem esperança.

Não é o tribunal de justiça e nem o das urnas aquele que é o mais severo e efetivo. Ambos podem cometer falhas, pois são instituições humanas e, tais como nós, são imperfeitos. O verdadeiro tribunal é o da nossa consciência individual. Aquele que está presente no ambiente silencioso e solitário do nosso travesseiro, à noite. As escolhas que fazemos, mesmo aquelas menores, no nosso cotidiano, refletem o que somos e o que queremos ser. O fim do utilitarismo às avessas não será de cima para baixo, eliminando a corrupção na política, mas de baixo para cima, eliminando a corrupção das pequenas coisas. A partir das nossas atitudes, que começam com bons pensamentos e palavras.

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Ao fim, como será a ética no Brasil em 2022? Façam suas apostas, mas, mais do que isto, repensem se aquilo que estamos fazendo individualmente não está ajudando a alimentar o utilitarismo às avessas ou cultivando os valores inestimáveis para a vida e para a liberdade. Um futuro melhor para o nosso país depende das nossas escolhas individuais. Não apenas nas urnas, mas sobretudo no nosso cotidiano.

Cicero Urban é médico mastologista, professor de Bioética, pós-graduado em Liderança em Cirurgia na Universidade Harvard e vice-presidente do Instituto Ciência e Fé em Curitiba.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]