As últimas, penúltimas, antepenúltimas... notícias sobre o comportamento reprovável de autoridades públicas (e privadas) seja na ação ou omissão, no baixo calão da gravação, ou na debochada corrupção, deixa-nos todos com um misto de raiva, tristeza e decepção. Na reação, encontramos além dos revoltados, os resignados que acham que o problema está no DNA, na linha do le Brésil n’est pas sérieux. Há ainda os que personalizam o problema: defendem que a solução está na troca dos políticos A, B e C por X, Y e Z. Por fim, há os otimistas que vêem no momento um cenário profilático. Independentemente de nossas crenças ou certezas pessoais, percebe-se, como background dos petulantes e aparentemente infindáveis escândalos, um círculo vicioso com duas vertentes que se retroalimentam: a ocasião faz o ladrão e o ladrão faz a ocasião.
O Brasil é um país (como diz a música) abençoado por Deus e bonito por natureza. Mas, com vocação de estar (como diz o hino) deitado eternamente em berço esplêndido. No nascer do século XXI, passamos a crer que estávamos levantando do berço esplêndido e passaríamos a colher os frutos da riqueza do solo gentil. Razões tínhamos para isso. Eis algumas:
Primeiro foi a pujança econômica decorrente de um contexto internacional extremamente favorável, sobretudo com a demanda da China. Em segundo, veio a inebriante descoberta do pré-sal com sua eufórica soberba estatizante e juvenil propaganda: o Brasil transformar-se-ia em uma Arábia tropical banhada do “ouro negro”. Em terceiro, recebemos o grau de confiança das agências de risco que catapultou investimentos e energizou a atividade econômica interna com encantadores reflexos sociais.
E para colocar a cereja no bolo, o país foi coroado com os dois galáticos eventos esportivos. Este clima positivo não tinha precedentes: o capitão da nau brasilis passou a ser recebido por reis, rainhas e sultões. Chegou a ser “o cara” e sua até então desconhecida sucessora agraciada com o título da terceira mulher mais influente do mundo. Por que implodiu tudo em tão pouco tempo?
Além do caráter (ou sua falta) das pessoas que deveriam cuidar da res publica, o sistema político-partidário existente tem sido um adubo gerador de dominó de escândalos. É certo que as reformas trabalhista, previdenciária e, na sequência, tributária precisam avançar e ser aprovadas. Não há escolha apesar das dores para alguns. Não se trata de política de governo, mas de Estado, de nação. Porém, tão importante quanto as mudanças mencionadas é a reforma política.
O sistema político-partidário brasileiro é anacrônico e auto-prostituível. Ao contrário do voto distrital misto, o voto proporcional hoje existente encarece as campanhas e afasta o eleito do eleitor. Aquele não tem o mínimo compromisso com este. A maneira como são feitas as contribuições de campanha incentivam o feudalismo eleitoral: suserania e vassalagem onipresentes às custas do erário público.
A ausência de cláusula de barreira para a constituição de novos partidos e a existência do tal fundo partidário servem tão somente como maternidades de gremlins ou berçários de legendas de aluguel. O povo vota em políticos filiados a tantos partidos com “P”, mas acaba na PQP. Os “amigos da chapa” vencedora são aquinhoados com a sorte grande. De partidos tradicionais ou nanicos saem os representantes laureados com as chamadas diretorias estratégicas. Conhecimento técnico, compromisso com o dinheiro público ou reputação ilibada são dispensáveis.
O importante é beneficiar-se da benesse e obedecer a cartilha, sobretudo quanto ao pagamento de dízimos ao grupo governante. Portanto, de nada adianta mudar de político. Parafraseando J. J. Rousseau “o político nasce bom, o sistema o corrompe”. A julgar pelo que temos acompanhado, ainda que outro partido - ou grupo - estivesse no poder nos últimos 13 anos, muito provavelmente, os desvios e abusos seriam cometidos, em menor ou maior escala. Raposas, as de sempre ou convertidas, iriam sim cuidar do galinheiro que, por sua vez, é esculpido ao sabor das raposas. É um círculo.
Apesar da tristeza de ver o Brasil nu, é preferível vê-lo assim a não saber, não ver ou ignorar suas terríveis man-made mazelas. Se há um bode enxofrado na sala, não adianta burrifá-la com perfume de Grasse. O bode, bem alimentado pelo sistema político-partidário perverso, continuará lá. Apesar do intoxicante odor, o mastro das instituições do Estado de Direito tem se mostrado (até agora) firme e erguido. Oxalá continue.
Acredito que a operação lava-jato tem tudo para ser a semente de um futuro melhor. Mas, se, diante da divisão harmônica e independente dos Poderes, a Casa de leis e o Executivo desempenham papel crucial, os políticos não mais podem ser bajulados pelo poder que detêm, mas sim cobrados pelo dever que têm. Já o Judiciário, sobretudo os integrantes do último degrau da pirâmide eleitoral, precisam julgar tecnicamente e, à reboque, ensinar coerência. A população, por sua vez, precisa mudar o comportamento de arquibancada; i.e, xingar, resignar-se ou falar algo e fazer diferente. Ingenuidade? Síndrome de Cândido? Pode ser. Mas, é melhor assim: trabalhar, fazer nossa parte e acreditar sempre. Tem melhor opção?
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