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Dólar americano.
Dólar americano.| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Embora existentes os indícios de pressão inflacionária, o presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell, veio a público no dia 17 de março comunicar que não pretende aumentar os juros no curto prazo. Isso dificilmente não ocorrerá se considerarmos a tamanha liquidez no mercado, somada à reinserção plena do consumidor nas ruas nos próximos meses e que deve provocar geração de empregos, reaquecimento da economia e a confiança do próprio mercado.

Uma eventual elevação nos effective federal funds rate (EFFR, equivalente à nossa Selic), ainda que em 0,25%, também poderia produzir espaço para migrações importantes de capital (leia-se também mais inflação) em busca de melhor retorno, ou até busca de sofisticadas operações de arbitragem, estruturas de financiamento, ou apenas de renda fixa do Tesouro. Tudo isso dada a falta de atratividade nas taxas de rendimento (alguns países com taxa negativa), que foram reduzidas a partir da crise de 2008, e que impactou as principais economias desenvolvidas.

Este fluxo de capital em direção à economia americana, de outro modo, promoveria uma desvalorização das moedas de seus países de origem, apreciando o câmbio, e tornando o dólar mais forte. Por ora, o que vemos como uma das evidências materiais desta espantosa liquidez no mercado americano é uma “revolucionária” política dos bancos privados em solicitar aos clientes que não façam depósitos em espécie nas agências.

Pasmem: no início de fevereiro o Bank of America e o JP Morgan, dois dos maiores bancos dos EUA, enviaram comunicados a seus clientes pedindo a eles que levassem seu dinheiro para outro lugar! Tudo isso em razão da descompensação que se criou no sistema financeiro e na base do M1 (moeda em poder do público e depósitos à vista nos bancos comerciais que não rendem juros e são de liquidez imediata). Esta descompensação na base monetária foi criada a partir de medidas pelas quais o governo já havia injetado US$ 7 trilhões na economia desde a crise do subprime e, agora, mais US$ 2 trilhões em um pacote recém-aprovado pelo Congresso americano.

Toda esta dinheirama, da qual boa parte termina nos bancos, não necessariamente é revertida em empréstimo, o objeto existencial destas instituições, que não têm para quem emprestar, seja por excesso de liquidez dos tomadores, seja por falta de capacidade destes de tomar emprestado, e que resulta, no fim das contas, em um acúmulo de moeda nunca visto antes nos cofres físicos destas instituições financeiras. É uma crise de liquidez ao contrário.

Sabe-se que a curva inflacionária de longo prazo nos EUA está sob pressão, mas o que não se sabe é o que acontecerá quando o mercado americano estiver a pleno consumo, haja vista que, neste momento, 44% dos 328 milhões de americanos já foram vacinados.

Instrumentos de política monetária como aumento das taxas de juros no curto prazo são políticas largamente praticadas pelos bancos centrais em todo mundo hoje em dia, bem como a diminuição de expansionismo fiscal (quantitative easing, crowding out etc.) no longo são as mais cotidianas práticas, mas o que seria dos países emergentes como o Brasil com uma eventual abrupta subida de juros do Fed, considerando que nunca se viu tanto dinheiro injetado no mercado americano?

Não muito tempo atrás, em 2008, o mundo ficou horrorizado quando Barack Obama aprovou um pacote de US$ 700 bilhões para salvar os bancos e as montadoras americanas. Doze anos depois, os EUA já aprovaram mais de US$ 11 trilhões em dívida pública para salvar a economia e financiar guerras; portanto, tudo é uma questão de perspectiva. É preciso olhar o passado.

A história para os latino-americanos não deve, por exemplo, apagar o fato de que em 1980, durante a crise do petróleo, no governo de Jimmy Carter, o então presidente do Fed, Paul Volcker, elevou drasticamente os juros americanos após o segundo choque do petróleo, em 1979. O efeito levou países latino-americanos, como Brasil e México, a uma crise econômica e à consequente moratória. Dificilmente tais eventos poderiam se reproduzir, dado todo o instrumental de políticas de gestão monetária defensivas e a sincronicidade dos mercados disponíveis atualmente, mas é a velha história: eles espirram lá, e nós ficamos resfriados aqui.

É também verdade que, diferentemente de hoje, em que a taxa de empréstimo interbancária americana está em 0,25% desde março de 2020, naqueles anos a média de juros nos EUA era de 10,94% quando Paul Volcker chegou a elevar os juros a 19,01% em junho de 1981, no que ficou conhecido como a “noite especial de sábado”.

Por fim, o aumento dos juros americanos interrompeu a trajetória de alta dos preços no país e alcançou seu objetivo, apesar de lançar a economia em uma recessão – e, de quebra, despedaçou a América Latina. A dívida dos países da região cresceu, levando as nações a decretar moratória, no que ficou conhecido como a “década perdida”, marcada por baixo crescimento, déficit fiscal e hiperinflação.

E é nessas horas que uma das mais incríveis frases do velho e bom Warren Buffet vem à tona. Never bet against America. Será?

Alexandre Nigri, economista e administrador de empresas com especialização em Real Estate, é professor convidado do curso de Real Estate e Finanças do IBMEC e CEO do Grupo Maxinvest e da MCP Realty.

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