| Foto: Alfonso Medeiros/Pexels
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A Revolução Industrial transformou a energia no recurso mais estratégico da humanidade, tornando seu acesso a baixo custo, condição primordial para o progresso das civilizações. De quatro ou cinco décadas para cá, no entanto, outra preocupação veio sendo concatenada: a neutralidade de carbono antropogênico. Como resultado, surge a necessidade de uma “transição energética”, o que rompe a lógica da busca por energia barata.

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A Alemanha, que junto aos EUA, foi a principal responsável pelo estabelecimento desta nova preocupação, é um excelente exemplo dessa experiência. Em 2010, quando seu governo lançou o programa Energiewende (Transição Energética), os combustíveis fósseis representavam 80% das fontes da matriz energética do país; a energia nuclear, 10%; e as energias renováveis, outros 10%. Desde então, o uso de energias renováveis aumentou para 25%, substituindo por completo a barata e carbono neutra energia nuclear e um sexto do consumo de carvão.

Apesar dos esforços para aumentar o uso de energias renováveis, a realidade é que os combustíveis fósseis, como petróleo, carvão e gás natural, representam apenas 75% da demanda energética mundial.

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Ainda que as emissões de gases de efeito estufa tenham sido reduzidas, quanto custou esse empenho?

Em janeiro de 2022, a Alemanha importava 40% de seus combustíveis fósseis da Rússia. Com a Guerra da Ucrânia, e consequente embargo imposto à Rússia, as importações daquele país chegaram virtualmente a zero. Para tanto, os custos de energia na Alemanha, como do gás natural, do carvão e da energia elétrica, atingiram picos de 300% a 400% de aumento ao longo daquele ano.

Passada a fase de “desmame” da Rússia, a eletricidade custa hoje o dobro do que custava no período pré-COVID. Assim, a Alemanha tem um dos custos de energia mais altos do mundo, muito superiores aos dos Estados Unidos (+ de 100%) e China (+ de 200%), ou mesmo aos da França (40%) e Japão (25%). 

Conclusão: o país, cuja economia é fortemente baseada na indústria automobilística, de bens de capital e química - altamente dependentes de energia - viu sua produção industrial despencar 14%, 10% e 12%, respectivamente, em comparação ao período que antecedeu à pandemia.

A Alemanha flerta com a recessão e com a corrosão de suas vantagens competitivas. Não são incomuns menções a “desindustrialização”, seja nos meios de comunicação, seja nos relatórios de negócios. Quanto isso afetará a percepção do cidadão alemão em relação à dicotomia custo de energia versus transição energética? E quanto influenciará suas escolhas políticas e, consequentemente, as políticas públicas do país?

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Em novembro desse ano teremos um dos eventos políticos mais significativos das últimas décadas: as eleições para presidente dos Estados Unidos

Caso Donald Trump vença, e assuma, é certo que irá priorizar o baixo custo de energia e a independência energética americana, em detrimento à transição energética

Em sua política interna, deverá promover o shale gas e o shale oil, revertendo a política restritiva atual. O fracking, a tecnologia de extração em questão, transformou os EUA de importador a exportador líquido de energia em menos de 10 anos, quando o país se tornou o maior produtor mundial de petróleo e segundo de gás, em meados da década passada. O fato de Trump ter retirado os EUA do Acordo de Paris, em seu primeiro mandato, é um bom indicativo dos caminhos que deverá trilhar no multilateralismo climático.

Caso seja o Partido Democrata o vencedor, o imperativo de custo de energia deverá ser imposto aos sustos e solavancos, como bem testemunharam os alemães, já que o atual cenário de acentuadas tensões geopolíticas deve ser mantido.

Política à parte, analisemos o Net Zero 2050, que é o objetivo material do Acordo de Paris para a primeira metade do século. Seu principal instrumento são os compromissos de redução de emissões de gases de efeito estufa dos países signatários para 2030 e o de neutralidade de carbono, mirando 2050. Alguns, como a própria Alemanha, estabeleceram sua meta de neutralidade para antes, em 2045; outros, como a China, para depois, em 2060.

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Supondo que esses compromissos sejam teoricamente adequados para se atingir o auspicioso objetivo de 2050, seria sua execução factível? Vejamos! Como “meios de implementação”, os Estados Unidos se comprometeram a acabar com a queima de combustíveis fósseis para a produção de energia elétrica até 2035. Já a Alemanha, prometeu suspender a produção de veículos a combustão interna até o mesmo ano. E por aí vai.

Enquanto isso, os chineses incluíram um elemento no mínimo curioso no detalhamento de seus compromissos: estabeleceram o ano de 2030 como o de pico de suas emissões de gases de efeito estufa. Ou seja, o país só se comprometeu a começar a reduzi-las a partir de então, podendo continuar elevando-as até lá. O que diria a respeito do Energiewende, o alemão que perdeu seu emprego para a China se ele soubesse que o país que é responsável por 1/3 das emissões globais opera de tal maneira?

É razoável imaginarmos um cenário importante de mudança no pêndulo, com maior proeminência da clássica preocupação com oferta abundante, baixo custo e segurança energética, em desfavor à preocupação quase hegemônica com a transição energética.

Sendo assim, combustíveis alternativos ou instrumentos financeiros climáticos só deverão se concretizar enquanto houver dinheiro público ou vontade e condição política de se impor pesados sacrifícios aos cidadãos nacionais. Ou, alternativamente, caso esses combustíveis sejam não apenas renováveis, mas economicamente viáveis, como o bom e velho etanol brasileiro.

Eduardo Lunardelli Novaes é formado em Administração de Empresas pela FGV com MBA por INSEAD (França), é empreendedor e produtor rural. Foi Secretário de Clima e Relações Internacionais do Ministério do Meio Ambiente durante a gestão Jair Bolsonaro.

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