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Crônica de uma morte anunciada. É assim que podemos chamar o atual "calote técnico" que a Argentina deu e que já vinha havia meses sendo delineado. Em resumo, a Argentina está incapacitada judicialmente de pagar sua conta com detentores de sua dívida, mesmo possuindo os recursos para tal. Respeitadas as devidas proporções, o Botafogo, clube carioca de futebol, passa por situação semelhante: uma penhora judicial impossibilita o pagamento dos débitos correntes do clube carioca.

A origem desses dois casos é uma só, a irresponsabilidade fiscal: gastar mais do que se arrecada. Cedo ou tarde a bomba explode. Mas, diferentemente do episódio de 2001 – quando o calote argentino foi muito maior e por falta de recursos –, dessa vez a situação é "menos pior", mas sinaliza a todos a importância do superávit primário como termômetro do compromisso (ou da falta de) da administração pública com seus credores.

As partes seguem tentando, mas, em cenário no qual ninguém está disposto a ceder, tecnicamente não dá para dizer que há negociação, e sim um jogo de empurra onde todos levam a pior. Logo, fica difícil imaginar que o juiz Griesa, que está à frente do caso na cidade de Nova York, aponte para o mercado com boas novas. O mais provável é que os atuais detentores de parte da dívida, que desde 2005 não aceitam a renegociação imposta pelo governo argentino, chamados de holdouts pelo mercado e de "abutres" pelo governo argentino, acabem vendendo esses títulos para outros investidores a um preço inferior ao que desejam, mas superior ao oferecido na atual renegociação. Caso isso aconteça, a Argentina ganha mais dois ou três anos de alívio antes que todo o imbróglio de renegociação reinicie mais uma vez.

Para os eleitores brasileiros, fica explícito por que devemos cobrar veementemente o cumprimento das metas de superávit primário. O atual caso de nossa vizinha exemplifica de maneira real as consequências que constantes déficits em conta corrente causam na economia de qualquer país. E com o Brasil também não será diferente, no caso de continuarmos nessa vertente interminável de déficits que nos levam a um único destino: a falta de dinheiro para pagamento da dívida.

Resta ao próximo presidente da República o compromisso invariável com o superávit primário, a fim de evitar que passemos por aperto compulsório semelhante ao que derrubou com força o mercado argentino e colocou nossa vizinha em estado de calote pela oitava vez na história.

Rafael Borim, bacharel em Relações Internacionais, é especialista do Instituto Millenium.

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