Um amigo me disse: “Estou decepcionado, os políticos nunca cumprem as promessas de campanha”. Respondi-lhe: “Isso é ótimo! Se eles fossem cumprir tudo o que prometem, nem que tomassem 100% de toda a renda da população haveria dinheiro suficiente para pagar a conta”. Se resolvessem executar tudo o que prometem, deveríamos começar a perder o sono. Só fico tranquilo porque tenho certeza de que as promessas são para ganhar a eleição, não para serem cumpridas.
Campanha eleitoral é uma disputa para pescar votos e as promessas são uma boa isca. O político tem o privilégio de praticar o delicioso esporte de gastar o dinheiro dos outros, privilégio esse negado aos cidadãos. Se você resolver fazer o bem, tem de ser com seu próprio dinheiro. Outra coisa que me incomoda é a reforma tributária. Em todas as reformas feitas até hoje, rigorosamente todas, a carga tributária aumentou.
Em 1985, quando Sarney assumiu a presidência da República, a carga tributária era 21% do Produto Interno Bruto (PIB). Sarney dizia que, se a carga fosse de 25% do PIB como era em 1974, seria possível erradicar a pobreza por meio de programas sociais. Pois a Constituição de 1988 elevou a carga para 26% do PIB, e Sarney entregou o governo a Fernando Collor, em 1990, tão pobre quanto era antes.
Se os políticos fossem cumprir tudo o que prometem, nem que tomassem 100% de toda a renda da população haveria dinheiro suficiente para pagar a conta
Uma das explicações para a continuação da pobreza nacional está em um trecho do Plano de Ação de Governo (PAG) de 1987, feito pelo ministro do Planejamento, Anibal Teixeira, em que ele fala sobre o programa de distribuição de leite. Lá diz: “Para dar um litro de leite para os pobres, o governo gasta quatro litros na burocracia administrativa”. Se de cada R$100,00 arrecadados somente R$20,00 chegam ao público-alvo, algo está muito errado. José Serra, quando ministro do Planejamento, falava a mesma coisa.
O filósofo inglês Thomas Carlyle (1795-1881), ao estudar a situação econômica, ficou deprimido e disse que a economia é uma “ciência melancólica”. Ele descobriu que o único que fazia o milagre da multiplicação dos pães foi posto na cruz há 2.000 anos. De lá para cá, a multiplicação dos pães só é possível pelo prévio investimento em padarias. Fiquei decepcionado quando, ainda menino, ouvi um padre dizer que Jesus simplesmente fatiava os pães para dividir com todos. Ou seja, nem ele conseguia produzir pão a partir do nada.
Talvez seja enfadonho dizer ao povo que, para dar-lhe qualquer coisa, primeiro é preciso tomar dele mesmo o dinheiro para cobrir o custo da bondade. A mais chata lição da economia é: o governo somente dá às pessoas aquilo que delas já tenha tomado. Fico pensando qual seria a reação da população se o governo dissesse: “Vamos tomar dinheiro de todos em tributos e vamos devolver apenas um quinto disso em forma de benefícios aos pobres”.
Na tentativa de entender por que os governos gastam mal o dinheiro público, o economista Milton Friedman listou quatro formas de gastar nosso dinheiro, e uma delas é: os outros usam meu dinheiro para comprar coisas para mim. Nesse caso, a transação é ineficiente, sobretudo quando é o outro que decide quanto de meu dinheiro ele vai gastar. É o que acontece com o governo: ele toma nosso dinheiro para comprar coisas para nós: justiça, segurança, saúde, educação, estradas etc.
Se o governo, os políticos e os burocratas é que tomam a decisão de quanto dinheiro vão tomar de nós, que tipo de produtos vão nos oferecer e como vão fazer as compras, abre-se uma imensa porta para a ineficiência, a corrupção e a concentração de renda a favor dos membros do próprio poder estatal. Por isso, quatro providências são necessárias: limitar os poderes do governo, fiscalizar os atos dos governantes, punir rigorosamente os corruptos e modernizar a máquina estatal para que ela incorpore as tecnologias modernas de gestão e se torne menos cara e menos perdulária.
Reforma tributária que mexe apenas numa perna do orçamento público (a forma e os meios de arrecadação de tributos) não tem a menor chance de reduzir a carga sobre os cidadãos e as empresas, podendo até mesmo aumentar o porcentual de tributos sobre a renda nacional.
José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.
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