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Retrato de Alexis de Tocqueville, por Théodore Chassériau.
Retrato de Alexis de Tocqueville, por Théodore Chassériau.| Foto: Wikimedia Commons

Após mais de trinta anos da redemocratização brasileira, percebemos que o regime democrático não é algo estático e que sua instituição não diz tudo a respeito da prática de atitudes democráticas. A democracia parte de um processo de construção das relações entre o arcabouço legal do Estado de Direito e de suas práticas individuais no cotidiano. Verbi gratia, quando falamos em uma democracia, referimo-nos ao desenvolvimento gradual da igualdade de condições, que pode aparentar pressuposto, mas que é nada mais do que uma tendência democrática que pode não se comportar em práticas igualitárias. Em vista disso, o filósofo francês Alexis de Tocqueville era convencido de que o verdadeiro desafio do democrata era instruir e regular o sistema democrático para a promoção de atitudes democráticas duradouras.

Em vez de se embasar na lei ou na soberania do legislador, Tocqueville via a construção de um ideal democrático na mudança de hábitos. Seu projeto resgatava o desenvolvimento de uma mentalidade democrática, requerendo a internalização e a cristalização de hábitos e atitudes que originam comportamentos democráticos no longo prazo. Estaria aí a importância da educação indireta, que tem como objetivo encorajar padrões de comportamentos democráticos e internalizá-los como atitudes políticas. Tocqueville dizia que a educação direta, que funciona através de leis educacionais e incentiva a prática de hábitos a partir de sua regulação, pode cristalizar valores e princípios de cima para baixo; mas também pode, por outro lado, se traduzir em um processo legislativo capaz de ser mudado de um dia para outro. Os órgãos públicos responsáveis pela política educacional têm o poder de incentivar a transmissão de certos currículos cívicos, por exemplo, mas amanhã, em outro mandato, poderia haver a instauração de um modelo diferente.

Por isso, Tocqueville colocava o processo educacional indireto como imprescindível, a acompanhar o primeiro: acreditava que a educação de baixo para cima promove a prática positiva e duradoura de hábitos cívicos que são compreendidos como benéficos ao florescimento individual – independentemente de normativas institucionalmente fixadas, aspecto da educação direta.

Pode-se trabalhar com a educação indireta de várias formas. O Programa Cidade Modelo, pioneiro em Curitiba, traz esse aspecto: visa à formação de cidadãos críticos, engajados e empoderados, com enraizamento de valores democráticos (i.e., a igualdade social, de gênero, racial e o respeito ao próximo) a partir do incentivo ao desenvolvimento de atitudes, habilidades e conhecimento das quais os cidadãos precisam para participar de suas comunidades, governo e política. Foi através de oficinas que lideranças de diferentes setores de Curitiba se reuniram e demonstraram interesse pelo incentivo à educação indireta. Elas propuseram políticas e programas associados ao cultivo da cidadania e a processos educacionais que desenvolvem competências e habilidades cívicas. Assim, começamos a falar em processos educacionais que se preocupam com a formação integral de cidadãos, focando em seu desenvolvimento no longo prazo em prol do fortalecimento da democracia.

Natasha Alvarez é consultora de Projetos no Instituto Sivis, é graduada em Government and Legal Studies, com foco em Political Theory, pela Bowdoin College (EUA).

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