Aprimorar a administração pública não é tarefa fácil. Não se faz apenas com boa vontade, novas leis ou criação de novas estruturas
Recentemente a Prefeitura de Curitiba divulgou que adotará o contrato de gestão e administração de resultados. O contrato de gestão e a preocupação com a eficiência e cumprimento de metas e objetivos não são necessariamente novos. Eles fazem parte de um modelo de administração pública, o modelo gerencial, oriundo dos países especialmente anglo-saxões como o Reino Unido, Nova Zelândia e Estados Unidos. Mesmo no município de Curitiba existem, já há alguns anos, contratos de gestão estabelecidos entre a prefeitura e serviços sociais autônomos como o Instituto Curitiba de Saúde (ICS) e organizações sociais, como o Instituto Curitiba de Informática (ICI) e Instituto Curitiba de Arte e Cidadania (Icac).
No Brasil, o principal teórico deste modelo é o professor da FGV/SP e ex-ministro Bresser Pereira no período Fernando Henrique Cardoso. Nesta época, Bresser implementou uma grande mudança na legislação da administração pública, conseguindo aprovar leis ordinárias e, inclusive, alterar a Constituição brasileira, no final dos anos 90, inserindo explicitamente o princípio da eficiência e a preocupação com o desempenho e a autonomia gerencial .
A preocupação com maior eficiência, agilidade e flexibilidade na administração pública é salutar e necessária. O modelo burocrático não confundir com o sentido pejorativo de burocracia (papelada, carimbos etc.) proposto por Max Weber: racionalidade, mérito, imparcialidade, sujeição a regras e plano de carreira é necessário, trouxe e traz uma grande contribuição para o aprimoramento da administração pública, em especial para superar o patrimonialismo e a confusão entre o que é público e o privado; entretanto apresenta alguns sinais de esgotamento.
Uma maior flexibilidade, agilidade e uma preocupação com eficiência e resultados são muito bem-vindos na administração pública. A questão é como efetivamente fazer isso com metas, indicadores e prazos avaliáveis pela população, e, em especial, mantendo o controle sobre o administrador público, a fim de evitar desvios e, eventualmente, corrupção.
É importante recordar o que aconteceu recentemente com algumas fundações de apoio a universidades públicas, notadamente a UnB e na Unifesp. São exemplos de como essa busca por maior flexibilidade e agilidade, se mal realizada, traz efeitos deletérios. Na Espanha essa busca por entes privados para evitar o direito público e sua legislação é motivo de grande polêmica e tem inclusive designação própria "la huida del derecho administrativo". O professor Jaime Rodriguez-Arana, catedrático da Universidad da Coruña, lembra que alguns gestores públicos ousam ir mais além, tentando fugir de todo ordenamento jurídico.
As fundações de apoio às universidades não são necessariamente boas ou ruins, o que depende da maneira que elas forem utilizadas. A questão é se isso aconteceu em duas prestigiosas universidades, as quais apresentam uma comunidade mobilizada e informada; o que pode acontecer em diferentes rincões de nosso país? Não precisamos ir longe, basta lembrar o que ocorreu anos atrás em prefeituras de dois importantes municípios no Paraná.
A administração pública pode buscar novos modelos de gestão e parcerias, inclusive fundações de apoio, organizações sociais, modelo bastante usado em São Paulo na área da saúde, e fundações estatais, proposta do governo Lula para hospitais universitários. Entretanto se seus recursos forem, na sua maior parte, públicos; necessariamente devem ser controlados com sendo públicos, submetendo-se a regras do Direito: concurso ou teste seletivo para seleção de pessoal, licitações e prestações de contas. E claro, o mais importante, efetivo controle do cidadão, do seu usuário. Assim procura-se evitar o clientelismo e a confusão, nem sempre bem intencionada, entre o que é público e o que é privado.
Aprimorar a administração pública não é tarefa fácil. Não se faz apenas com boa vontade, novas leis ou criação de novas estruturas. Ela ocorrerá efetivamente se desenvolver uma nova cultura na organização pública na qual estejam valores como: transparência, controle e participação por parte do cidadão, e informação acessível e de qualidade para a população. A busca por resultados, com metas e prazos claros e mensuráveis, também é importante desde que efetivamente tenham impacto positivo para a sociedade .
Christian Mendez Alcantara é professor da UFPR, mestre em Administração e doutor em Direito. Realiza estudos de pós-doutorado na Universidad da Coruña (Espanha) com bolsa de estudos da Fundação Carolina e governo de Galícia.
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