Se por um lado a Petrobras tem como slogan "o desafio é a nossa energia", por outro o setor sucroalcooleiro parece ter como propaganda a frase "o desafio é a nossa sobrevivência". A inovação ou criação de novas tecnologias de um "novo mundo" voltado apenas para o chamado etanol não deve acontecer, salvo se houver uma mudança positiva dos agentes públicos, econômicos e privados, que detêm sua participação na gestão do setor dessa economia. A forma e os modelos que estão sendo geridos pelo poder público e privado estão ultrapassados e não respaldam o suficiente para aquilo que foi pensado há décadas, quando foi desenhado um único negócio para aquela época, como sendo uma situação acessória e integrante no cenário sucroalcooleiro.
Pela representatividade que o etanol ainda possui, é premente um ajuste na política energética por razões estratégicas, ou seja, uma revisão na formulação de um novo modelo, a fim de que o processo possa seguir seu rito de expansão. E não só em relação ao etanol. Já dissemos e vamos reiterar que o setor tem um imenso potencial ainda pouco explorado, que é a cogeração de energia elétrica derivada da queima do bagaço da cana-de-açúcar: mais uma fonte de energia, dentre outras primárias, que compõem a nossa matriz energética brasileira.
Havia, no passado, segundo estudos feitos por especialistas, a ideia de que novos investimentos seriam realizados na matriz energética, até 2030, na ordem de US$ 804 bilhões, dos quais 4% caberiam ao setor sucroalcooleiro. Porém, aparentemente, o cenário atual nos direciona para outra realidade, com números bem aquém se é que chegarão perto disso. Sem falar que, se considerarmos a intensa busca por fontes renováveis, em decorrência de problemas atrelados à questão climática, seria para sermos e termos uma extraordinária potencialidade na produção de biomassa. Ou seja, pensando bem, os números dados anteriormente ainda são moderados.
O modelo atual é marcado por decisões ainda tímidas, no curto e médio prazos, sem qualquer planejamento de expansão, ou garantia de financiamentos adequados e de preços compatíveis com o da gasolina (por exemplo). Isso nos remete à ausência total de um sistema organizado que tenha pensado na proteção para a prevenção de crises sazonais que o setor atravessa constantemente.
Voltando à questão da matriz energética, é preciso haver uma coordenação inteligente, capaz de atrair novos investimentos e que ofereça aos investidores uma rentabilidade e baixo custo e risco econômico. Somente assim será possível despertar um maior interesse das empresas do agronegócio para a expansão dessa atividade. O que não se pode conceber é que empresas dessa importância possam deixar de investir na atividade de cogeração, sabendo que ela sempre possuiu longa tradição em seu portfólio na integração de seus três principais produtos: o açúcar, o etanol e a cogeração de energia.
Deverá haver uma conversa aberta entre os setores interessados, em pré-condições, e tendo como finalidade a construção de um novo futuro. A ação principal de articulação de todo o setor está nas mãos dos entes que a representam. Necessitam redesenhar suas agendas e retornar a sua liderança no processo de novas mudanças. Isso significa rejuvenescer sua performance em relação à de um mero fabricante de açúcar e etanol. Há de se assumir um novo papel na história do país e transformar o segmento do agronegócio em um grande investidor de energia.
No setor privado, percebe-se um comportamento empresarial convencional, conveniente (?), de isolamento e competição, o que não é natural e salutar para um empreendedor que transformou o setor como sendo um dos principais polos de trabalho. Em vez disso, deveria, sim, dar lugar a um comportamento mais agressivo e cooperativo, valorizando uma conquista de décadas e que poderia e precisa se expandir ainda mais. Avançar na produção de etanol, outras matrizes energéticas, a fim de consentir à crescente demanda e avalizar margens remuneratórias para todos os elos da cadeia produtiva, sendo uma delas um incremento maior em cogeração.
Por isso, há de se ter um novo padrão de produção, além da exploração mais acentuada de uma nova atividade, que é a utilização da biomassa, principalmente com o uso da cana-de-açúcar. Para isso, é fundamental o envolvimento de novas diretrizes e decisões dos agentes públicos e privados que assegurem a implementação de metas e a ininterrupção de seu crescimento sem risco de crises periódicas.
Para o setor público, a meta deve ser abraçar um novo modelo de tratar a questão da energia da biomassa. Quando analisamos a capacidade formal para tratar esse assunto, constata-se a existência de uma enorme disseminação de administradores incumbidos do mesmo projeto, porém, sem a acepção de ideias articuladas para o cumprimento de metas de médio e longo prazo.
É preciso reduzir a dispersão do segmento. Para isso, é preciso que a cogeração de energia, em parceira com os setores público e privado, estabeleça uma agenda organizada, oferecendo as principais estratégias a ser adotadas para que haja uma evolução eficaz. Buscar um plano definido de como transformar a forma de geração elétrica em produto de alta relevância para o mercado mundial pode ser uma solução.
Outra fonte renovável pouco explorada que poderia fazer parte da agenda dos envolvidos é o carvão vegetal, feito a partir de florestas plantadas. No entanto, esse tema tem sido deixado ao relento pelos responsáveis, pois está sob o abrigo do Ministério do Meio Ambiente, que, infelizmente, não tem o condão para tratar de assuntos advindos da biomassa.
Hoje, presenciamos uma situação em que não há, de fato, uma representatividade desses planos na agenda dos governos. Essa postura conservadora na análise das questões energéticas, por razões estratégicas, deveria fazer parte de todo um contexto regulatório, buscando superar tradições passadas e iniciar um novo processo de convencimento de mutação para uma nova realidade, que é a difusão da nossa matriz energética como fonte renovável.
O Brasil, por seu conhecimento e experiência no assunto, já deveria havia muito tempo ser líder mundial na transformação de todo o processo, já que detém uma patente reconhecida mundialmente por meio do nosso etanol. Não obstante, precisamos difundir um novo paradigma, ou seja, um moderno programa de energia renovável, inclusive com a participação de outros países interessados em investir no fomento de novos negócios como uma alternativa de energia limpa e acessível como um todo.
José Osvaldo Bozzo, consultor tributarista e sócio da MJC Consultores, foi professor de Planejamento Tributário na USP-MBA de Ribeirão Preto (SP).
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