O transporte coletivo no Brasil está prestes a conhecer o seu destino. E o sentimento é uma mistura de alívio e preocupação. De um lado, é um alívio que não haja mais espaço para a combinação de discurso bonito e pouca ação que marcou, nos últimos anos, o tema da mobilidade urbana no país. De outro, preocupa a dúvida que insiste em questionar se a sociedade está ciente do tamanho do desafio à frente.
O problema é o seguinte: com o atual número de passageiros, a conta do sistema de transporte coletivo não fecha se a tarifa continuar sendo a única forma de financiamento do serviço. Em Curitiba, praticamente com todas as atividades abertas, o total de usuários gira em torno de 50% do que era antes da pandemia. No entanto, o sistema (custo) segue quase do mesmo tamanho.
Por enquanto, o Regime Emergencial do Transporte mantém os ônibus em operação. O destino do transporte coletivo será conhecido com o fim dessa medida. Está claro que a conta não vai poder ser repassada ao passageiro, pois o valor da tarifa inviabilizaria o uso do sistema; nem será possível depender eternamente e cada vez mais de repasses do orçamento municipal, também combalido como consequência da Covid-19 e com novas prioridades e desafios no pós-pandemia.
Outro ponto claro é a importância do transporte coletivo para a cidade. Para se ter ideia, mais de 60% dos profissionais da saúde, responsáveis por combater a Covid, utilizam os ônibus para chegar ao trabalho. Esse meio de locomoção também produz muitas externalidades positivas: diminui congestionamentos, melhora a qualidade do ar, reduz acidentes e dá opção de deslocamento a quem não conseguiria de outra forma.
A situação que se apresenta em Curitiba se repete em maior ou menor grau em todo o país. O prejuízo nacional do setor desde março de 2020 já ultrapassa R$ 14 bilhões, de acordo com a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU). De lá para cá, 13 operadoras e um consórcio suspenderam as atividades; duas operadoras, um consórcio operacional e um sistema BRT (do Rio de Janeiro) sofreram intervenção na operação; cinco operadoras encerraram as atividades; e quatro tiveram seus contratos suspensos. Mais de 75 mil colaboradores perderam o emprego.
Diante desse cenário, a NTU, como representante nacional das empresas de ônibus urbanos, vai levar ao Congresso, na volta do recesso, em agosto, uma proposta de marco legal do setor. A ideia é apoiada em três pilares: 1. qualidade e produtividade; 2. financiamento; e 3. regulação e contratos. Em resumo, a proposta aponta caminhos como a necessidade de receitas extratarifárias para o custeio do transporte coletivo e garantia de tarifa módica aos passageiros; a criação de políticas públicas de prioridade do transporte coletivo; e o estabelecimento de parâmetros de transparência, qualidade e eficiência e respeito aos contratos.
É uma aposta em uma solução definitiva para a sustentabilidade do transporte coletivo. Cabe à sociedade decidir como vai querer se deslocar nas cidades brasileiras.
Mauricio Gulin é presidente do Sindicato das Empresas de Ônibus de Curitiba e Região Metropolitana (Setransp).
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