Diariamente nos defrontamos com a violação de direitos fundamentais dos cidadãos prostituição infanto-juvenil, crianças esmolando, trabalhando precocemente, perambulando, subnutridas, exploração de todas as ordens. Com facilidade, percebemos que isso se deve, em muito, à omissão do Estado quanto às políticas públicas que conduzam à concretização dos direitos fundamentais sobretudo à educação. Em particular, no que se refere à educação infantil, ou seja, direcionada a crianças de 0 a 5 anos de idade. Muita gente não sabe, mas trata-se de um direito, assegurado pela Constituição Federal educação de qualidade a todos os brasileiros, desde a primeira infância.
A propósito do atendimento a essa faixa da população, de 0 a 5 anos, somam-se os argumentos da comunidade científica de âmbito multidisciplinar que investiga o processo de desenvolvimento da criança. Assegura-se que a inteligência se forma a partir do nascimento e menciona-se o que chamam de "janelas de oportunidade" na infância, o que ocorre quando determinado estímulo ou experiência exerce maior influência sobre a inteligência do que em qualquer outra época da vida. Assim sendo, descuidar-se desse período a infância significa desperdiçar um imenso potencial humano. Mais que isso: significa comprometer os alicerces individuais e, por conseguinte, as bases do convívio social.
Nesta especial fase de desenvolvimento, a prioridade absoluta justifica-se na medida em que, superado o momento adequado, os investimentos posteriores não produzirão os mesmos resultados que poderiam ser obtidos naqueles períodos cruciais à estimulação. Ou seja se o poder público deixa de investir nessa faixa etária, já terá comprometido investimentos futuros.
No Brasil, a educação infantil somente passou a ser concebida como educação, propriamente, com o advento da Constituição Federal de 1988. Até então, a primeira fase da educação infantil, destinada a crianças de até 3 anos de idade, era ministrada em creches, cuja preocupação precípua, até então, repousava nos cuidados físicos, saúde e alimentação, descurando-se da vertente educacional.
Assim, é preciso democratizar o acesso à educação infantil, para que todas as crianças possam usufruir plenamente esse direito em igualdade efetiva de condições. Os argumentos sejam legais, sociais ou científicos implicam uma educação infantil universalizada. Vale dizer, dirigida às crianças de todas as classes sociais e em qualquer situação de peculiaridade pessoal e ministrada com satisfatório grau de especialidade.
Os direitos fundamentais e nesse caso, a educação erigidos constitucionalmente a esse patamar, impõem ao administrador público, do presidente da República a governadores e prefeitos, o dever de promovê-los, dando-lhes efetividade. As políticas públicas constituem-se, nesse contexto, no instrumento para a efetivação desses direitos.
Dessa forma, se o estabelecimento de prioridades, privilegiando-se recursos para certos segmentos, em detrimento de outros, é uma constante nas políticas públicas em geral, o mesmo não pode ocorrer no espaço da educação infantil. Nessa seara o tratamento deve ser sempre prioritário. O Ministério Público defende que a criança deve ser prioridade absoluta nas políticas públicas e nos orçamentos públicos. E a educação infantil deve ser interpretada pelos gestores como a prioridade da prioridade. É um direito.
Hirmínia Dorigan de Matos Diniz, mestre em Direito Econômico e Social, é promotora de Justiça com atribuições junto ao Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Proteção à Educação do Ministério Público do estado do Paraná