A morfologia social dos parlamentares tem se alterado. Essa mudança não significa, contudo, que estamos diante de um processo de popularização da classe política brasileira
Há muitos desacordos entre os especialistas sobre qual é o perfil de senadores e deputados federais e como esse perfil tem se transformado ao longo do tempo. Possivelmente, a existência dessas discrepâncias é um sintoma tanto da ausência de interesse público sobre o assunto, quanto do pouco desenvolvimento desse tipo de pesquisas entre nós. Afinal, quem são os parlamentares brasileiros?
Nos estudos de Ciência Política, podemos contar pelo menos quatro visões sobre a questão.
A primeira sustenta que se a taxa de renovação na Câmara é alta, hoje em torno de 50%, é porque a Casa aceita com muita frequência indivíduos estranhos ao campo político.
Se em 1946, 30% daqueles que chegavam à Câmara Federal tinham atrás de si uma longa trajetória na vida pública, em 1994 menos de 10% dos deputados federais tinham esse perfil. Uma década após o fim da ditadura militar, nada menos de 50% dos deputados haviam conquistado sua cadeira com menos de quatro anos de dedicação exclusiva à política. Por esses dados, predominaria no Brasil um sistema que franquearia espaço a indivíduos sem grandes vínculos com partidos tradicionais e com pouca experiência na vida pública. Nosso Legislativo seria povoado de self-made men, que se fizeram à margem do mundo político oficial. Isso abriria espaço para o declínio das oligarquias tradicionais.
Outra interpretação argumentou que o elevado índice de revezamento nas cadeiras legislativas deve-se a uma razão completamente diferente. Ela não diz respeito à estrutura de oportunidades do mercado político, mas ao cálculo que candidatos sempre fazem entre o custo de permanecer numa instituição altamente competitiva, mas com pouco poder. Daí que os legisladores mais experientes e/ou com melhor currículo seriam também aqueles que deixariam mais rapidamente o Legislativo em busca de uma posição no Executivo.
Paralelamente a essa divergência sobre as carreiras, surgiu uma terceira interpretação. Centrada no perfil social dos legisladores, ela constatou um fato novo: a "popularização" da classe política brasileira.
A vitória de Lula em 2002 e seu reflexo no aumento da bancada de deputados do PT foi responsável por uma mudança no perfil da Câmara dos Deputados. Houve uma queda no porcentual de indivíduos com perfil mais tradicional e elitista (os mais ricos, e dentre esses sobretudo os empresários) e um aumento no número de indivíduos de profissões típicas de classe média.
Percebe-se por quaisquer indicadores que se olhe que a morfologia social dos parlamentares tem se alterado. Essa mudança não significa, contudo, que estamos diante de um processo de popularização da classe política brasileira, nem de democratização do campo político nacional. De toda forma, esses achados descartam a visão convencional de que políticos são todos iguais, de que a política nacional é o reino dos mesmos homens de sempre e todas aquelas acusações correlatas dos que se julgam "críticos".
Estudos mais recentes, conduzidos na UFPR, têm descoberto que, ao contrário do que se imaginava, ser político profissional é de longe a variável mais importante para determinar o sucesso eleitoral de um candidato a deputado federal no Brasil. Nas eleições de 2006, 47% dos vitoriosos já eram membros do poder legislativo (leia o artigo em http://bit.ly/nzIzJM). Isso significa que se encontra em andamento uma dimensão importante do processo de institucionalização da Câmara dos Deputados: a profissionalização dos seus membros. E que os partidos tendem a levar muito em conta, na seleção dos candidatos, aqueles que já têm grande experiência prévia na política.
Por outro lado, que relação há (ou deve haver) entre a profissionalização política dos nossos políticos e a qualidade da representação? Políticos mais profissionais significa políticos melhores ou o contrário?
Adriano Codato é professor na Universidade Federal do Paraná. Luiz Domingos Costa é professor dos cursos de Ciência Política, Relações Internacionais, Direito, Administração e Comunicação Social na Faculdade Internacional de Curitiba.
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