Não é exagero afirmar que o ensino técnico no Brasil tem mais de 500 anos, pois desde a chegada dos portugueses ao país há registros de aprendizes de ofícios. Já nos anos 1800 começaram os programas de aprendizagem voltados, especialmente, a crianças e jovens em situação de vulnerabilidade, que, junto com a formação primária, eram ensinados em tipografia, alfaiataria e carpintaria, entre tantos outros ofícios.
Em 1808, dom João VI criou o Colégio das Fábricas, precursor do ensino técnico, que só seria regulamentado no Brasil em 1906 por Nilo Peçanha, pelo Decreto 787 – este, sim, consolidando o ensino técnico-industrial no país. Em 1909, foram criadas as Escolas de Aprendizes Artífices, destinadas ao ensino profissional, primário e gratuito. A Constituição de 1937 foi a primeira a abordar o ensino técnico, profissional e industrial, estabelecendo como dever do Estado “o ensino pré-vocacional e profissional destinado às classes menos favorecidas”. Embora a intenção de incluir produtivamente as classes menos favorecidas tenha sido louvável, a Constituição de 1937 fez ecoar junto à sociedade o sentimento de que o ensino técnico seria destinado a um público específico.
Em 1941, a Reforma Capanema fez o ensino profissional alçar o nível médio, e o ingresso nas escolas industriais passou a contar com exames de admissão. Durante o governo de Juscelino Kubitschek, a indústria automobilística desponta como protagonista no desenvolvimento do país, o que fez com que o governo federal aportasse pela primeira vez recursos significativos para a educação profissional. Em 1971, a Lei 5.692 tornou o currículo de segundo grau obrigatoriamente técnico-profissional, para formar profissionais técnicos que atendessem às demandas impostas pela consolidação da indústria nacional.
O ensino profissionalizante fez a história do Brasil e está intimamente relacionado ao desenvolvimento da indústria, do comércio e dos serviços nacionais. Cada vez mais o profissional técnico ganha espaço e importância no mercado de trabalho – e os níveis de empregabilidade não poderiam ser melhores.
Já em meados da década de 90, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), instituída pela Lei 9.394/1996, discorreu sobre a educação profissional de forma exclusiva e, numa tentativa de minimizar o preconceito estabelecido acerca do ensino técnico reverberado pelas primeiras legislações, tentou dirimir o enfoque assistencialista e apresentou a modalidade como uma forma de inclusão social e produtiva.
Em 2007, foi criado o Catálogo Nacional dos Cursos Técnicos, mediante consulta pública, que se tornaria o instrumento de regulação que ditaria os parâmetros da educação técnica no país. Pela sua importância ao desenvolvimento socioeconômico do país, o ensino técnico foi ganhando corpo e um conjunto robusto de legislações específicas para sua oferta e regulamentação.
O ensino profissionalizante fez a história do Brasil e está intimamente relacionado ao desenvolvimento da indústria, do comércio e dos serviços nacionais. Cada vez mais o profissional técnico ganha espaço e importância no mercado de trabalho – e os níveis de empregabilidade não poderiam ser melhores.
Hoje, pelo menos 60% das empresas têm algum tipo de dificuldade em preencher seu quadro de profissionais técnicos. Na área hospitalar, por exemplo, 80% do quadro de enfermagem é constituído por auxiliares e técnicos, segundo dados do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). No segmento de informática, as empresas vivem um verdadeiro apagão de mão de obra técnica, oferecendo salários cada vez mais atrativos na esperança de captar profissionais qualificados.
Ainda há, contudo, muito espaço para a formação técnica no Brasil. Na contramão de países desenvolvidos, onde em média 50% dos egressos do ensino médio buscam formação técnica, o Brasil amarga apenas 8% de procura pela modalidade, o que tem refletido diretamente na dificuldade do setor produtivo em preencher seu quadro técnico.
O desenvolvimento de políticas públicas que favoreçam o ensino técnico e profissionalizante é absolutamente fundamental para a retomada do crescimento no cenário pós-pandemia. Os altos índices de desemprego, aliados a uma inflação crescente, resultaram em perda significativa de renda das famílias, que tem configurado um cenário social bastante preocupante. Neste contexto, a formação técnica surge como uma opção viável e eficaz para a inclusão produtiva, com formações mais rápidas, menos onerosas, focadas na prática, com baixos pré-requisitos de escolaridade e que garantem, via de regra, inserção imediata no mercado de trabalho.
Os profissionais técnicos fizeram história e, literalmente, construíram o nosso país. Fica a eles minha homenagem e desejo de que o seu protagonismo no mercado de trabalho seja cada vez mais reconhecido.
Solan Arantes Valente é mestre em Ciência, Gestão e Tecnologia da Informação e coordenador educacional do Tecpuc.
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