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O erro fascista dos antifascistas

Imagem ilustrativa. (Foto: AFP)

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O centro nevrálgico do erro progressista, com certeza, está em sua teoria do conhecimento. Mais do que uma estratégia filosófica e política da Escola de Frankfurt a fim de reinventar o marxismo, devemos ir além do rastreio histórico do problema e localizar também o erro filosófico central que sustenta o cosmo das ideologias modernas ― mais especificamente, aqui tratado, do identitarismo. O atual caos epistêmico começa no retumbante fracasso intelectual que visa, a todo custo, aliar as novas concepções filosóficas e políticas da academia à lógica mais óbvia e elementar do raciocínio humano. Em suma, o relativismo cultural e a ética setorial, esta baseada nos anseios grupais, e não mais em uma ordem natural, são uma verdade inconteste para o progressismo. O problema é: se a verdade não é objetiva e não tendente ao absoluto, então simplesmente não há motivo algum para que alguém acredite nas próprias verdades progressistas.

Na realidade, nunca encontrei afirmação mais ontologicamente absurda e surreal do que: a verdade é relativa à cultura onde ela se expressa. É como chegar em um australiano e dizer que, do meu ponto de vista, ele é um ser humano, mas que sob a perspectiva epistemológica de um boliviano ele pode ser um ornitorrinco pansexual. O “pós-modernismo”, contraditoriamente, jura que tal epistemologia relativista é a mais absoluta verdade das verdades absolutas que não existem.

Sinceramente não consigo sequer pensar como alguém em sã consciência pode ponderar algo desse tipo sem ter náuseas intelectuais. Entretanto, o pior mesmo é saber que as universidades religiosamente ensinam isso, e até produzem teses de doutorado com esse fundo completamente ilógico. Muitos acadêmicos relativistas poderão se levantar para afirmar que não o são: “ora, mas isso é um disparate; jamais cremos que existe um relativismo absoluto”. Todavia, o relativismo absoluto é o ponto de sustentação da teoria identitária. Se o relativismo não se afirmar, e se a verdade não for diluída até se gastar por completo na infinidade de identidades que hoje nos circundam, metade das filosofias contemporâneas acabam mortas num inerte pântano de palavrórios de uma novilíngua bizarra. O progressismo respira desesperadamente o relativismo científico e ético!

E como a consequência imediata do relativismo é a própria intolerância dogmática ― já, já explico o porquê ―, eles não tardam em defender a indulgente concepção de que devemos crer nas teses deles de maneira fideísta, caso não queiramos ser prontamente caçados e escrachados do montante dos respeitáveis. No fundo, o pós-modernismo criou a epígrafe mais tirânica de todos os tempos: “ou você endossa as nossas teses, ou é um fascista”.

Ora, seguindo essa linha de raciocínio, o que resta aos independentes e sensatos se não “ser um fascista” segundo o progressismo?

Uma recente empreitada dos sacerdotes do relativismo identitário tenta diminuir o conhecimento objetivo e científico ao patamar do “é apenas mais um discurso”. Como se o relato biográfico de um vereador de São Bento do Sapucaí tivesse o mesmo grau de cientificidade de um relatório arquitetônico de um satélite da NASA; ou os textos da Tiburi tivessem a mesma certeza objetiva de uma análise química dos laboratórios da Bayer. O progressismo acadêmico é a maior ameaça que já existiu ao pensamento científico.

Mas como não há nada debaixo do céu que não possa piorar sob a administração dos macacos pensantes, a pós-modernidade agora fala de uma “nova epistemologia”, ou, como denunciou o equilibrado socialista brasileiro Antonio Risério, “epistemologias”. Não se trata, como alguns fogosos progressistas podem pensar, de algo relacionado a novos prismas de análise ― o que já é completamente contemplado pela velha e boa episteme científica ―, trata-se, antes, de uma epistemologia focada na linguagem desconstrutiva e não mais na análise dos fatos.

Deixem-me explicar melhor: a epistemologia, isto é, a busca do conhecimento real daquilo que está fora e se oferta à minha análise racional, deixa de ser uma investigação sobre a realidade mesma, passando a ser apenas um discurso com o pressuposto fincado na percepção neossocialista de inclusão, tolerância e demais desígnios panfletários progressistas. Nesse contexto, a verdade não é mais o conhecimento correto e objetivo sobre algo, mas apenas o que se diz sobre algo em determinado grupo, sob determinada condição, espaço, tempo, pressão, calor, gênero, sexo, raça, cultura etc., a fim de agradar a cartilha da patota à qual se serve. Em uma análise filosófica mais detida, perceberíamos que a base dessa concepção epistemológica identitária não passa de uma atualização rasa da concepção de poder foucaultiana e de ética habermasiana: em última análise, não existe a Verdade ou mesmo verdades, mas sim apenas as interações entre poderes e discursos, onde o mais dominante imporá a sua realidade particular aos menos dominantes.

Sumarizando o que estou dizendo: a filosofia epistemológica identitária, progressista, não ESTÁ errada, ela É errada; não se trata de falhas condicionais ou acidentais, mas sim de uma concepção ontologicamente equivocada, de uma essência conceitual vigorosamente falsa.

Assim sendo, a verdade se torna extremamente relativa e, na prática: inconceituável. Por exemplo, a realidade óbvia, científica e objetiva nos mostra que há tão somente dois gêneros atrelados à biologia do ser humano: o masculino e o feminino; isso nada tem a ver com opções, gostos, percepções, intolerâncias, eurocentrismo, patriarcalismo, cristianismo, sociologias arcaicas ou matemáticas conservadoras, trata-se tão somente da inferência real das coisas sob a percepção sã da realidade. Todavia, conclamam os acadêmicos progressistas: pode ser que, para o grupo dos gordos negros e mancos de Sorocaba, isso não seja necessariamente real; assim como, para a união feminista das ruivas peludas e albinas do Alasca, o sexo masculino não passa de uma invenção capitalista para vender camisinhas ― não duvido que haja alguma “pós-verdade” que declare isso, você duvida?

A tão adorada “outra episteme” dos progressistas nada mais é do que o nada existencial, o emudecimento cimentado por um discurso de tolerância extremamente intolerante e banal. A teoria pós-moderna, ao buscar a tolerância na aceitação relativista transcultural, acaba encerrando o debate num silêncio sepulcral, onde o medo de ferir o dogma de uma das milhares de minoria alheias que nos cercam apenas nos oferece a possibilidade aterradora da mudez. Aliás, consequência essa que é extremamente paradoxal, afinal, não há turba mais barulhenta e chata do que os progressistas.

Sempre considerei a verdade absoluta uma realidade que está para além da nossa razão, restando-nos apenas a humildade de reconhecer nossas incapacidades, ao mesmo tempo que mantemos heroicamente a esperança de continuar avançando científica e filosoficamente sobre os montes da realidade que, até ontem, pareciam impossíveis de transpor. Newton descobriu, conceituou e explicou a força que puxava a maçã para baixo, ainda que não conjecturasse cientificamente a respeito de onde veio a força que criou as regras universais e os átomos que, finamente interligados e moldados, findariam em uma macieira.

Mas já estou me alongando demais na crítica, encerremos este ensaio com um julgamento de valor progressofóbico: o pós-modernismo é um porre e um dos maiores embustes criados desde o arianismo hitlerista; espero de toda minh'alma que o quanto antes se encerre esse delírio acadêmico coletivo, essa ilusão infrutífera e verdadeiramente idiota imposta por um progressismo acéfalo.

Fato é que não se fazem foguetes, celulares, papéis higiênicos, fraldas e álcool em gel com teorias relativistas. Os satélites não dependem da aprovação cultural e racial dos Black Lives Matter; a biologia reprodutiva “caga” para as considerações “pós-científicas” de Judith Butler e Jean Wyllys; e, por incrível que pareça a alguns, as regiões atingidas pelas queimadas na Amazônia voltarão a ter florestas independentemente do ativismo de Greta, o ecossistema não se importa com ela, nem com seu ativismo.

Romper com a histeria política e social pós-moderna é condição de sanidade, é o primeiro passo de volta à seriedade. Esse rompimento consiste em um ativismo tanto em prol do equilíbrio, quanto em favor da prudência civilizacional, ativismo muito além do que qualquer endosso a pautas conservadoras ― ainda que os conservadores tenham tido o mérito de sair na frente contra esta loucura grupal. Assim como a civilização recusou os cátaros e os nazistas após suas ideias difundirem o caos genocida na sociedade, espero que não inauguremos mais uma era de irracionalidades existenciais, afinal, são as irracionalidades éticas e políticas que costumam abrir valas comuns e encher câmaras de gás.

Por fim, se alguém lhe diz que a verdade é relativa, está simultaneamente declamando a falsidade de suas ideias, e, se assim espontaneamente o faz, por que deveríamos acreditar num mentiroso? Não acredite!

Pedro Henrique Alves é filósofo e colunista do Instituto Liberal.

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