Ninguém pensou no impensável, não se cogitou do improvável, nem se aventaram hipóteses inconcebíveis. A sonhada normalidade institucional tão arduamente conquistada parecia perene, capaz de enfrentar trepidações e turbulências.

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Para alguns, a intensidade e frequência da vituperação eleitoral pressagiava desfechos dramáticos. No mínimo preocupantes. Desde 1945 jamais houve um confronto eleitoral tão virulento. Os que se deram ao trabalho de acompanhar estas observações sabáticas podem comprovar que delas escapava uma vaga percepção de colisões.

Tragédia é, na realidade, um choque, confronto de vontades cegas, pulsões opostas, inconscientes, incontroláveis. Nos dois últimos meses, em rápidos lances consolidou-se a impressão de que o objeto da disputa eleitoral situava-se além da conquista do poder político durante quatro anos. O ressentimento que se exibia sem pudor insinuava que a disputa situava-se em torno de algo mais decisivo do que uma breve reversão do pêndulo das preferências.

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Num crescendo assustador, alfinetadas tornaram-se estocadas; estas viraram trancos; e trancos, ofensas explícitas. A extensão da temporada eleitoral, o número exagerado de debates, a naturalidade com que se legitimou a "desconstrução" de candidatos – para gáudio da hidra de sete cabeças chamada redes sociais – transformaram a hora estelar do processo democrático num espetáculo desolador.

E, para culminar: ontem, dois dias antes do segundo turno, a espalhafatosa denúncia do semanário Veja tentando caracterizar a presidente-candidata Dilma Rousseff e o seu mentor, o ex-presidente Lula, como omissos e complacentes com os desmandos que rolavam nos desvãos da Petrobras.

O petardo – apresentado sem qualquer comprovação como parte da delação do doleiro Alberto Youssef – certamente interferirá no pleito deste domingo. Seus efeitos mais danosos serão sentidos inexoravelmente a partir da próxima segunda.

Apertem os cintos: materializou-se aquilo que mais se temia – o pavoroso espectro de um "terceiro turno". Não para contestar os resultados das urnas, mas para definir e enquadrar os réus das próximas e extenuantes batalhas judiciais.

O país será novamente enfiado num tribunal para julgar e condenar ou os responsáveis pela publicação de uma suposta infâmia – com o seu imenso rol de desdobramentos – ou as autoridades supostamente coniventes com as malfeitorias na estatal-modelo. Com consequências ainda mais aterradoras.

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Não merecemos qualquer um desses desenlaces.

Alberto Dines é jornalista.

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