Lemos nos jornais, atônitos, que uma política alemã foi esfaqueada dias atrás por motivos aparentemente “racistas”, vinculados à política de recepção de refugiados. A extrema-direita na Europa ganha adeptos, eleva a voz e parece esquecer que seus antepassados, até há bem pouco tempo, também se refugiaram. A estatística da Bundeskriminalamt (BKA, agência federal de investigações, uma espécie de FBI alemão) revela que em 2014 foram praticados 162 atos de violência contra centros de acolhimento a refugiados. Alguns centros foram parcialmente incendiados e símbolos nazistas foram grafitados nos muros.
Também na Alemanha, incontáveis pessoas se manifestam abertamente contra tendências xenófobas, artistas fazem campanha na tevê, usando camisetas com o neologismo Tolerismus – por uma cultura de tolerância –, cidadãos vão aos terminais ferroviários receber os refugiados com música, balões, alimentos, brinquedos e roupas. Algumas pessoas chegam mesmo a acolher refugiados em suas próprias casas. Há uma memória coletiva que se reacendeu, disse-me uma conhecida.
Um pequeno e simples impulso reverbera mais e mais em todas as possíveis direções. O resultado é imprevisto
Sou brasileira e moro na Alemanha. Aqui do lado de casa há uma escola cujo centro poliesportivo foi colocado à disposição para abrigar 450 refugiados. Na noite de 8 para 9 de setembro, bombas de fedor foram arremessadas contra a escola, veio a polícia, foi um corre-corre. Atualmente atos de suporte e de repulsa aos refugiados têm acontecido em várias cidades por toda a Europa. Todos temos acompanhado esta odisseia, o que nos faz pensar e agir.
Também participei de uma “comitiva de recepção”. Além das cenas já esperadas, a dos cartazes com corações bem grandes, welcome!, vi um que me deu o estalo: um jovem segurava um cartaz com a foto de um indiozinho yanomami, em que estava escrito: “somos todos yanomamis”. Não, não era brasileiro. Era nativo de Dortmund, cidade onde um grupo de quase 1,5 mil refugiados acabava de chegar. Ele me explicou que yanomami quer dizer “ser humano”. Que vergonha, eu não sabia!
O que se faz aqui reverbera ali. E rápido. É o “efeito borboleta”. Assim ficou conhecida a expressão da física moderna utilizada na Teoria do Caos. A ideia é plástica: um pequeno e simples impulso reverbera mais e mais em todas as possíveis direções. O resultado é imprevisto. Foi utilizada principalmente para o estudo do deslocamento de massas de ar. As ciências humanas tomaram essa ideia emprestada para ajudar a pensar movimentos sociais na atualidade. O “efeito borboleta” nas sociedades interconectadas – o poder de difusão de pequenos atos isolados, mas virtualmente conectados – é uma realidade que não se pode mais negar, nem frear. O jovem em Dortmund nunca viu um indígena na vida, mas acompanha seus problemas on-line e se engaja por eles, como se fossem seus vizinhos. Ele faz adeptos em seu círculo social.
Somos todos borboletas sapiens. Tudo passa por uma reflexão crítica sobre o significado de nossa presença nesta terra. Criticar, por sua vez, vem de Krinein, verbo grego que pressupõe uma ação dupla: julgar e decidir. Portanto, trata-se sempre de um julgamento e de uma decisão a partir do que aprendemos a ser. E isso reverbera eternamente!
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