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Alcunhado de “coisa ruim”, o vingativo vilão prometeu e conseguiu infernizar a vida da brava heroína. Prestes a capitular, sem aliados à vista, exceto o fiel e enigmático mordomo, ela imagina que o pistoleiro a galope seja cúmplice. Surpresa: é amigo, traz no rosto o sorriso dos salvadores e na mão o milagroso papelucho que deixará todos felizes.

Desnecessárias as apresentações e o quem-é-quem: fácil adivinhar as identidades do vilão mascarado, do mocinho salvador e do mordomo de fala mansa. Falta explicar que o bangue-bangue não é efeito especial e que aquela enorme mancha vermelha ao lado dos 19 corpos caídos nas calçadas da maior cidade do país não é massa de tomate, é sangue mesmo.

A chacina ocorreu na noite de quinta-feira e madrugada desta sexta-feira em Osasco, Barueri e Itapevi, na Grande São Paulo. Os xerifes encontraram cartuchos de armas de uso exclusivo das Forças Armadas e admitem a hipótese de retaliação pela morte de dois policiais na última semana.

As rupturas do andar de cima projetam-se irremediavelmente até o rés-do-chão

Indispensável entender que o tiroteio dos últimos meses na Praça dos Três Poderes é virtual, metafórico, mas o vazio de poder é assustadoramente real: a superposição da tremenda crise política com a forte recessão econômica e as contínuas revelações da Operação Lava Jato está produzindo o mais forte abalo institucional desde a redemocratização do país.

Embora negada em seguida, a ameaça de pegar em armas vociferada pelo líder da CUT na cerimônia de apoio dos movimentos sociais à presidente Dilma traz de volta um clima de ferocidade até então vagamente pressentido, porém agora subitamente materializado. As rupturas do andar de cima projetam-se irremediavelmente até o rés-do-chão. Neste nível é que as coisas ficam mais complicadas.

Neste exato momento temos turbulências na Justiça Eleitoral e no Tribunal de Contas; confrontos abertos entre as presidências das duas casas legislativas federais; ondas de desafios à Procuradoria-Geral da República e ao Supremo Tribunal Federal; um Executivo absolutamente atarantado, catatônico; e uma oposição sem alma e sem voz, apostando todas as fichas nos protestos de domingo.

Enquanto isso, roda-se em sigilo um longa-metragem de suspense, do qual temos breves notícias, sempre arrepiantes. A Operação Lava Jato é o único organismo vivo, ativo, efetivo, funcional e impecável num panorama bagunçado, atônito e, justamente por isso, altamente preocupante: transformou Eduardo Cunha num poderoso chefão e a Renan Calheiros ofereceu o papel de mocinho idealista e bem intencionado.

Quanto tempo aguentarão as injunções do script se ambos estão enredados em malfeitorias relacionadas com a Petrobras? Será possível imaginar que a milagrosa Agenda Brasil concebida por Renan com cerca de 27 controvérsias cruciais terá condições de ser passada a limpo e implementada a tempo de pacificar os espíritos e preparar o país para as eleições de 2018?

Uma coisa é certa, indiscutível: este filme é inédito, jamais visto.

Alberto Dines é jornalista.
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