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Pode haver frustração maior para o cidadão comum do que comprar sua tevê de plasma e se defrontar com um blecaute no horário da final da Copa do Mundo? Pois esse é um risco concreto

Os dados do PIB brasileiro do primeiro trimestre colocam o Brasil, mais uma vez, no centro da cena econômica mundial. Na comparação com o período imediatamente anterior, a atividade econômica avançou 2,7%. Se fizermos como os americanos, que divulgam taxas anualizadas, chegamos a impressionantes 11%. Dois dígitos de crescimento do PIB é algo impressionante, um ritmo de crescimento que não se via por aqui há décadas.

Mas, além de exuberantes, esses números também são muito preocupantes. A economia brasileira hoje pode ser comparada a um carro que desce uma estrada de serra e, aproveitando o declive, passa a desenvolver alta velocidade. Mas acontece que lá adiante se desenha uma curva sinuosa. Ou freamos com cuidado ou a capotagem será inevitável.

É bom que se diga que reduzir a velocidade não significa parar e, muito menos, retroceder. Frear significa apenas trazer o ritmo de avanço para um patamar seguro. Em outras palavras, se existe algo que o país não precisa hoje é de uma recessão. A necessidade de reduzir a velocidade da expansão é fruto de uma lógica simples: ainda não inventaram, em ne­­nhum lugar do mundo, uma economia que consiga crescer de forma contínua e sustentada sem uma in­­fraestrutura de qualidade e sem uma oferta adequada de mão de obra qualificada. E essas são duas carências gritantes no Brasil de hoje. Ou se dá tempo à oferta de alcançar a demanda, ou sofreremos apagões variados: na geração energia, na logística de transporte, no mercado de trabalho.

Mas por que razões o país sofre de tantas restrições ao crescimento? Por que temos de viver sempre esse anticlímax?

Uma das regras básicas, seja na relação entre as empresas e seus clientes, seja nas relações sentimentais, é que não devemos gerar expectativas que sabemos não poder satisfazer. Portanto, nosso dra­­­ma atual é ter gerado um clima quase triunfalista diante da crise global quando deveríamos ter nos limitado ao fato, já bastante im­­pressionante, de termos sido um dos últimos países a entrar em recessão e um dos primeiros a sair dela. Em lugar disso, voltamos a nos comportar como uma ilha de prosperidade na qual as ondas agitadas chegavam na forma de simples marolinhas.

Hoje, diante da necessidade de frear a demanda, arrumar a casa e estimular a ampliação do investimento produtivo, podemos dizer com clareza: o governo brasileiro foi tão eficiente no combate à crise quanto incapaz de pensar no pós-crise. Um único exemplo basta para demonstrar essa tese, tamanho é o alcance de suas consequências. Se­­gundo dados da própria Aneel, a Agência Nacional de Energia Elétrica, o cronograma de expansão da capacidade geradora do ano de 2009 encerrou o ano com atrasos consideráveis. E a razão não foram os impactos da crise, mas a simples falta de capacidade gerencial dos agentes públicos envolvidos. Pode haver ameaça maior ao crescimento sustentado do que a falta de energia? Pode haver frustração maior para o cidadão comum do que comprar sua tevê de plasma e se defrontar com um blecaute no horário da final da Copa do Mundo? Pois esse é um risco concreto!

E qual o remédio nesse cenário? A resposta é quase óbvia: o au­­mento progressivo dos juros. O consumo é uma atividade das mais prazerosas, especialmente para os milhões de brasileiros que só recentemente ingressaram no mercado de trabalho com a dignida­­de da carteira assinada. Para convencer esse contingente imenso de potenciais compradores a adiar a delícia do consumo, à espera de que o investimento produtivo amplie a capacidade de oferta da eco­­nomia, só mesmo mexendo com sua parte mais sensível, isto é, o bolso. Para alguns, juros altos representam oportunidades de ga­­nho no mercado financeiro. Para outros, simplesmente fazem com que o valor das parcelas já não caiba no salário do mês.

O ciclo de alta de juros que já começou em abril deverá durar, pelo menos, até o fim do ano. In­­fe­­lizmente, o descompasso que se criou entre oferta e demanda não pode ser revertido a curto prazo. Afi­­nal, a decisão de comprar é instantânea.

É claro que sempre haverá muitas críticas à alta de juros. Mas, se olharmos para trás, veremos que o Banco Central brasileiro tem sido bastante hábil na condução da política monetária. Entre os anos de 2004 e 2005, assistimos a uma história semelhante: alta de juros, contenção de demanda, chiadeira geral. E o que se viu não foi recessão, mais uma casa arrumada ao final de alguns meses. O grande risco que corremos hoje é o uso eleitoral da política monetária. Va­­mos torcer para que o Bacen continue pautando sua atuação por critérios técnicos. Passada a curva, aí sim, teremos um feliz 2012!

Robson Gonçalves é professor de Economia do Isae/FGV.

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