Empresas e instituições de ensino têm um objetivo em comum: ambas sabem que precisam preparar pessoas para trabalhos muito diferentes no futuro. Abordagens preditivas e ágeis para identificação de habilidades, alterações de currículos e modelos de ensino baseados em soluções digitais serão essenciais. Mas será que elas já estão preparadas para isso?
Estudo recente realizado com empresas e instituições de ensino superior identificou que muitas empresas globais têm sido lentas para adaptar seus programas e abordagens de ensino, e muitas delas ainda estão em estágio inicial de identificação das habilidades mais relevantes no futuro.
Enquanto acima de 70% das empresas e instituições de ensino concordam que é extremamente importante a preparação de colaboradores e estudantes para atuar com as tecnologias digitais emergentes, elas estimam que apenas 25% dessas pessoas estejam preparadas atualmente.
A previsão é de que esse porcentual mais que dobre, subindo de 25% para cerca de 60%. Isso significa que um grande investimento em capacitação será necessário para preparação das pessoas para os empregos do futuro. Atualmente, grande parte do investimento das instituições de ensino superior é focada em infraestrutura e formas digitais de entrega de conteúdo. Embora isso seja importante, essas empresas também indicam que precisam focar urgentemente no ensino das habilidades que serão mais importantes no futuro, identificando gaps existentes e adequando seus programas.
As organizações estão percebendo a importância de tornar as pessoas mais responsáveis por seu desenvolvimento, para que continuem relevantes
Um ponto comum entre as empresas e as instituições de ensino é a preocupação com as habilidades de seus líderes e educadores para que possam preparar os profissionais do futuro. Para endereçar esses pontos, as companhias precisam eleger a capacitação de seus colaboradores como prioridade estratégica, assegurando que os objetivos do negócio estejam alinhados com a estratégia da força de trabalho. Já no caso das instituições de ensino, os educadores devem mudar sua forma de atuação, deixando de ser controladores dos sistemas de ensino e passando a atuar como facilitadores de educação. O foco não deverá mais ser em definir o que estudantes devem aprender, mas sim oferecer liberdade para que eles decidam o que querem aprender, guiando-os nessa jornada.
Com relação às habilidades e aos conhecimentos que deveriam ser priorizados, existe senso comum de que áreas como robótica, inteligência artificial (IA), ética e habilidades técnicas, como desenvolvimento de apps e design de interfaces com usuários serão essenciais. Mas quando o assunto é o conjunto de habilidades humanas que nos diferenciam das máquinas – comunicação, flexibilidade, capacidade de resolução de problemas –, existe uma grande discrepância entre o que pensam as empresas, as quais 80% consideram importante esse tipo de habilidade, e as instituições de ensino, as quais somente 46% acham que isso deveria ser prioridade.
Outro grande desafio é como criar currículos de ensino dinâmicos. Atualmente, cerca de 70% das instituições de ensino superior atualizam seus currículos apenas a cada dois ou até seis anos. Nesse ponto, as empresas estão mais adiantadas, e cerca de 43% delas atualizam os currículos a cada um ou até dois anos, e 75% pretendem atualizar seus currículos com frequência muito maior, algumas até planejando modelos de atualização contínua. Uma forma de acelerar a atualização dos currículos é mover de um modelo de criação de conteúdos para outro de curadoria de conteúdos disponíveis.
O futuro da educação passa não somente pelo conteúdo, mas como ele é entregue às pessoas. Tanto as empresas como as instituições de ensino superior entendem que tecnologias como realidade virtual (VR) e realidade aumentada (AR) serão essenciais no futuro. Também existe certo consenso de que o uso de inteligência artificial para criação de treinamentos totalmente personalizados e a identificação em tempo real da performance de colaboradores e estudantes são uma tendência. No entanto, quando se trata da importância de aulas e treinamentos presenciais no futuro da educação, mais de 70% das instituições de ensino acreditam que elas continuarão sendo relevantes, enquanto somente 44% apostam nessa abordagem.
Uma consequência de todos os desafios que foram descritos é que as organizações estão percebendo a importância de tornar as pessoas mais responsáveis por seu desenvolvimento, para que continuem relevantes. Para isso, é necessário que seja criada uma cultura de aprendizado, em que os indivíduos se sintam motivados a aprender cada vez mais.
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Resumindo, são três as principais áreas de foco para que as organizações se preparem para o futuro da educação:
- Velocidade para monetização dos dados: como a coleta e análise de informações são utilizadas para criação e curadoria de conteúdo, além de alimentarem sistemas para criação de currículos personalizados.
- Simplificação da infraestrutura tecnológica: soluções baseadas em inteligência artificial, AR/VR e outras terão de se integrar com os sistemas atuais. Caso sistemas antigos sejam uma barreira para essa integração, talvez seja o momento para modernizá-los.
- Inovação: muito em breve, os tempos dos ciclos atuais para desenvolvimento de cursos e treinamentos não serão mais aceitáveis, e é nesse ponto que entra a possibilidade de se juntar a ecossistemas externos, por meio de plataformas ou parcerias.
Mas de quem seria a responsabilidade da preparação da força de trabalho atual e futura? A maioria das empresas e instituições de ensino superior acredita que a outra parte é quem deveria ter a responsabilidade maior no desenvolvimento de um amplo conjunto de habilidades humanas. Além disso, ambos se preocupam com a capacidade da outra parte na preparação das pessoas para os empregos do futuro. O lado positivo é que tanto empresas como instituições de ensino já enxergaram que a colaboração entre elas será fundamental na preparação das pessoas para o futuro.
André Gatti é diretor de Telecomunicações, Media & Tecnologia da Cognizant no Brasil.