Nos próximos dias, o prefeito de Curitiba enviará à Câmara Municipal uma revisão do projeto de Lei de Zoneamento e Uso do Solo de nossa cidade, tendo como base, entre outras análises, um estudo feito por dez entidades representativas da sociedade civil organizada do Paraná, que avaliou os impactos dos 669 artigos desta lei, considerada uma das mais importantes da cidade, pois afeta não apenas a prosperidade dos negócios como também o bem-estar da população.
O estudo técnico, elaborado por arquitetos, urbanistas, engenheiros, economistas e advogados representantes das entidades AsBEA/PR, Fecomércio, Fiep, Secovi, ACP, IEP, Crea, Ademi, Sinduscon e CVI, objetivou, em seu cerne, influenciar na proposição de uma lei de zoneamento e uso do solo mais enxuta e moderna, que estimule e não puna, que libere e não restrinja, que induza a geração de empregos e renda, criando receitas para o município e garantindo a simplificação de inúmeros processos burocráticos atualmente impeditivos ao setor produtivo.
Do ponto de vista prático, qualquer lei de zoneamento e uso do solo de uma cidade deve respeitar um processo continuamente dinâmico. É o que se entende por uma visão contemporânea de cidades sustentáveis – justas econômica, social e culturalmente – e cujas atividades, construções e intervenções urbanas estão em alinhamento, respeito e contínua adaptação aos limites ambientais e infraestruturais disponíveis.
Uma lei de zoneamento deve ditar regras, mas também dar liberdade aos cidadãos para que o futuro aconteça
Uma cidade sustentável conta com um ambiente urbano socialmente dinâmico, economicamente efervescente, com os usos e portes comerciais, residenciais e institucionais convivendo lado a lado. A população tem a seu dispor tudo de que precisa ao alcance de uma caminhada. Seu microbairro se transforma em sua cidade.
Com base nesta nova visão de gestão, os planos diretores anteriores e suas leis de zoneamento e uso do solo, que vêm de cima para baixo, que segregam usos e portes, confinam grupos sociais e tentam, infrutiferamente, legislar sobre cada mínima ação urbana do cidadão parecem não ajudar muito a dinâmica fractual de nosso tempo, pois a forma de viver se atualiza constantemente.
No caso de Curitiba, cidade que já está consolidada, este crescimento multifuncional acontecerá nos vazios urbanos e as características de complementaridade à realidade urbana atual acontecerão espontaneamente, corrigindo deformações de monofuncionalidade e de portes similares, em grandes trechos da cidade. Ou seja, ninguém melhor do que o tecido social (o morador, o empreendedor e o usuário) para solicitar, oferecer e usufruir das novas construções com seus portes e usos adequados. Pois sabe-se que uma lei de zoneamento deve ditar regras, mas também dar liberdade aos cidadãos para que o futuro aconteça.
Um zoneamento restritivo a alguns tipos de uso impediria, por exemplo, a implantação de escolas e hospitais em regiões onde naturalmente isso poderia existir. Corre-se o risco, também, de perdermos regiões vivas (com pessoas) de uso misto, que durante o dia oferecem comércio e serviços e à noite servem de residências. Os planejamentos urbanos mais atuais buscam exatamente isso: oferecer maior segurança nestes locais, minimizar os deslocamentos, especialmente para trabalho, educação e lazer – lembrando, entretanto, que a cidade não é somente um entorno funcional, mas também um entorno de experiência humana e comunitária.
Cada espaço urbano passa por um momento de ascensão e muitos de queda, deixando marcas que serão sentidas na era seguinte, e que podem ser melhor equacionadas com inovações tecnológicas, estímulos econômicos e engenharia de tráfego, entre tantos outros recursos intrinsecamente relacionados ao planejamento do espaço público.
Leia também: Densificação responsável e verticalização urbana (artigo de Valter Fanini, publicado em 12 de setembro de 2014)
Leia também: Vende-se uma cidade (artigo de José Ricardo Vargas de Faria, publicado em 4 de dezembro de 2015)
Sendo assim, cabe ao Plano Diretor e à Lei de Zoneamento e Uso do Solo (utilizando-se de todos os recursos de inteligência dos técnicos do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba, fazendo uso do domínio das ciências urbanas atuais) oferecer ao cidadão um detalhado levantamento da capacidade ambiental e infraestrutural da cidade, um diagnóstico de problemas e potencialidades, e de sugestões de oportunidades, estimulando as mais urgentes, por meio de instrumentos e políticas urbanas criativas, tendo sempre como foco a avaliação da qualidade urbana.
Este movimento de avaliação técnica, que culminou na revisão deste projeto de lei pela prefeitura e pelo IPPUC, é uma prova da importância e do compromisso de gestores públicos em planejar com o olhar no coletivo e nos diversos atores que podem oferecer suporte experimental ao planejamento urbano da cidade, evitando impactos negativos, como um Centro de Curitiba com menos moradores e menos comércio; a redução do número de vagas de garagem nos imóveis novos e a diminuição da oferta de estacionamentos na região central; o encarecimento do valor dos imóveis, afetando o bolso das famílias que buscam o sonho da casa própria; a concentração no comércio dos bairros, aumentando a dependência do consumidor pelo uso do carro para fazer suas compras; e a implantação de um modelo de Habitação de Interesse Social altamente burocrático e que não incentivará a produção de novas habitações para esta finalidade.
Pela seriedade do tema, as dez entidades representativas da sociedade civil se uniram para contribuir propositivamente com a administração municipal nesta fase de revisão da Lei de Zoneamento e Uso do Solo, instrumento de política urbana que deve, acima de tudo, ser multifacetado, isento, de simples entendimento e com diretrizes quantificáveis, focado no desenvolvimento da cidade e na qualidade de vida de seus moradores.
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