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Está na hora, antes que seja tarde, de o presidente Lula consultar os especialistas da sua crença ou apelar para as sábias crendices populares, para um descarrego em regra da fase azarada que o vem perseguindo no encruado segundo mandato.

A cada dia, um tropeço nos tapetes fofos do poder. Nada engrena, dá certo, fornece os dados que alimentem a sua oratória de exuberante otimismo. A vida oferece as suas surpresas, mas é conveniente ajudar o exausto anjo da guarda, indo, por exemplo, aos capuchinhos para as orações e os respingos de água-benta.

Não ficaria bem sugerir os apelos aos orixás e o cumprimento das obrigações dos despachos nas encruzilhadas ou nas cachoeiras.

Mas como o presidente passa a impressão do católico com atalhos para as alternativas pouco ortodoxas, abre-se uma infinidade de alternativas para espantar o caiporismo.

Para derrubar as resistências dos intransigentes, creio que basta um ligeiro passar de olhos pelos jornais ou acompanhar os noticiários das TVs para desconfiar, com um pé atrás, que a sucessão de trompaços vai além da simples coincidência.

Para começar pelo mais simples: o presidente montou, ao preço da generosa distribuição de ministérios, secretarias e as cobiçadas fatias do segundo escalão, uma folgada maioria nas duas Casas do Congresso. Consumiu meses do segundo mandato nos alinhavos sem fim. Quando soltou o suspiro de alívio da obra concluída, desaba sobre a sua cabeça a decisão previsível do Supremo Tribunal Federal (STF), de acolher o mandado de segurança apresentado pela oposição e determinar a instalação da CPI do Apagão na Câmara, com a derrubada da decisão do plenário que arquivara o pedido da oposição. A decisão do STF é de uma limpidez inquestionável. Mas o governo apostou na carta errada e saiu com as clássicas escoriações generalizadas do jargão policial.

Reconheça-se que duas CPIs, uma na Câmara e outra no Senado, com a mesma pauta, é um exagero que criará embaraços à oposição. Nem tanto, se a turma se entender e dividir as tarefas de senadores e deputados. Alguns sinais claros antecipam que a oposição pretende abrir a caixa-preta das obras de restauração dos aeroportos, muitos de um exagero suspeito, enquanto a área vital do controle do vôo foi largada às traças. E reabrir as investigações sobre as causas do acidente com o Boeing da Gol, em setembro, e sobre a crise do sistema de controle aéreo.

Tudo que de ruim sair daí, cai em cima do governo. A CPI do Senado, para não chover no molhado, terá de buscar outros ângulos de abordagem da bagunça que, durante meses, infernizou a vida de milhares de usuários do transporte aéreo, em vigília nos aeroportos, que vararam noites e entraram pelas madrugadas.

Um tumor que lateja há meses, anos, passando de um mandato para outro, arrebentou agora com a partilha do Ministério do Meio Ambiente e respingos na ministra Marina Silva, que já foi usada como a prova viva do interesse de Lula pela defesa da Amazônia – que encolhe a cada ano com o desmatamento selvagem das motosserras, a invasão das plantações de soja e dos rebanhos de gado.

Lula angustia-se com a demora marota do Ibama em aprovar as licenças para a construção de cinco usinas hidrelétricas na bacia amazônica, além da usina Angra 3.

A ministra Marina Silva deu a volta meio de lado, criando a Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Sustentável para controlar a expansão da lavoura do etanol, uma ameaça ao meio ambiente.

Para fechar o giro do caiporismo com a chave torta, o novo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) grita a denúncia humilhante dos dados estatísticos do ensino público no mundo: dos mais de 5.500 municípios brasileiros, apenas em dez os alunos atingiram a média 6, que é o padrão internacional dos países desenvolvidos.

O esguicho de água de esgoto, molha a enfática afirmação presidencial de que no seu segundo governo a educação do Brasil estará em de igualdade com qualquer país do mundo desenvolvido.

Afinal, que fim levou o primeiro mandato de Lula? Parece que foi apagado da memória da gabolice. Villas-Bôas Corrêa é analista político.

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